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Saeb Erekat: morte de diplomata causa comoção entre palestinos e israelenses

11/11/2020 09h50

O veterano negociador e diplomata palestino Saeb Erekat morreu nesta terça-feira (10), em decorrência de complicações causadas por Covid-19, em um hospital em Jerusalém. Ele foi um dos nomes mais proeminentes das últimas três décadas na política palestina.

Por Daniela Kresch, correspondente da RFI em Tel Aviv

Erekat participou de todas as negociações de paz com Israel desde 1990 e foi um dos arquitetos dos Acordos de Oslo, em 1993, que criaram a Autoridade Palestina e tinham como objetivo o estabelecimento de um Estado palestino, o que nunca aconteceu. Até sua morte, ele defendeu a tradicional posição de criação de dois Estados para dois povos na Terra Santa.

Saeb Erekat tinha 65 anos e contraiu o novo coronavírus no início de outubro. A doença foi fatal para ele, que já apresentava complicações de saúde. Ele havia passado por um transplante de pulmão nos Estados Unidos, em 2017.

A Autoridade Palestina decretou três dias de luto. Durante todo o dia, houve muitas demonstrações de dor e homenagens a Saeb Erekat. O presidente palestino Mahmoud Abbas disse que a morte de quem chamou de irmão e amigo "representa uma grande perda para a Palestina".

Como Erekat era considerado um negociador hábil, educado e paciente, ele conquistou o respeito e a amizade de muitos israelenses com quem interagiu. A ex-ministra das Relações Exteriores de Israel, Tzipi Livni, por exemplo, desejou profundas condolências à família de Erekat e a todos os palestinos. Ela revelou ter recebido uma mensagem de Erekat quando ele já estava hospitalizado, em que ele dizia: "Eu não terminei com o que nasci para fazer".

O embaixador e ex-negociador israelense Alan Baker afirmou que irá ter saudades de Erekat, de quem se tornou amigo.

Mas a internação e falecimento de Erekat no Centro Médico Hadassa, em Jerusalém, um hospital israelense, foi motivo de polêmica. Muitos palestinos receberam mal essa situação, para eles, com forte simbolismo: um líder palestino sendo tratado por médicos israelenses. Alguns grupos de extrema-direita de Israel chegaram a protestar diante do hospital, pregando que Israel não deveria cuidar de um palestino que eles consideravam ser um "terrorista".

Emocionalmente esgotado

Para quem teve contato com o diplomata nos seus últimos meses de vida, ele parecia emocionalmente esgotado, refletindo um sentimento comum entre os palestinos depois de quatro anos de governo do presidente republicano Donald Trump.

Durante seu mandato, Trump tendeu abertamente para o lado israelense, tomando decisões como a transferência da embaixada americana de Tel Aviv para Jerusalém - cidade que os palestinos também querem como sua capital. Americanos e palestinos praticamente cortaram relações à medida que Trump dava passos como retirar todo o apoio financeiro dos Estados Unidos à UNRWA, a agência da ONU de assistência aos refugiados palestinos. O presidente americano ainda fechou o consulado dos Estados Unidos em Jerusalém Oriental e a deu fim à representação da Organização para Libertação da Palestina (OLP) em Washington.

Analistas acreditam que, assim que tomar posse, o presidente eleito Joe Biden irá tentar reparar os estragos causados por Trump no relacionamento com os palestinos. Isso certamente levaria esperanças a Erekat.

Já do lado israelense, a reação à eleição de Biden foi ambígua. Se, por um lado, a maioria dos israelenses entende o quão polêmico Trump foi nos últimos quatro anos, por outro, muitos preferem enxergar apenas o que ele fez por Israel. Para muitos israelenses, Donald Trump foi o presidente americano que mais apoiou Israel desde sua criação, há 72 anos.

Só uma questão de tempo

Além da transferência da embaixada para Jerusalém e o reconhecimento da cidade como capital de Israel, o governo Trump deu apoio incondicional ao país em fóruns internacionais, principalmente na ONU, além de ter mediado os acordos de paz históricos entre Israel e Emirados Árabes Unidos, Bahrein e Sudão.

Amigo pessoal do primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu, Trump também retirou os Estados Unidos do acordo sobre o programa nuclear iraniano, o Plano de Ação Conjunto Global - ou JCPOA na sigla em inglês. O acordo foi firmado em 2015 pelo Irã e os Estados Unidos, com apoio da Alemanha, China, França, Inglaterra, Rússia e União Europeia.

Em Israel, esse acordo é visto como perigoso por unanimidade. Acredita-se que o Irã se aproveitou da ingenuidade de alguns líderes mundiais para firmar um acordo de fachada, enquanto continua a buscar a obtenção de armas nucleares.

Os israelenses, então, temem que Joe Biden cancele tudo o que o Trump fez em prol de Israel nos últimos quatro anos, principalmente voltando a apoiar o acordo com o Irã. Para o diplomata Martin Indyk, que foi duas vezes embaixador dos Estados Unidos em Israel, é só uma questão de tempo para haver um embate entre Netanyahu e Biden nessa questão. "Vai haver tensão por causa disso. Netanyahu quer sanções e pressão contra o Irã e Biden não acredita nisso", declarou Indyk.