Infectologista detalha projeto de vacinação em massa contra a covid-19 em Botucatu (SP)
A cidade de Botucatu, no interior de São Paulo, foi selecionada para um projeto de pesquisa inédito que vai avaliar a efetividade da vacina da AstraZeneca/Oxford contra as novas variantes do coronavírus no Brasil. Para isso, todos os adultos do local - pouco mais de 100 mil pessoas - serão convidados a se vacinar.
Em entrevista à RFI, o infectologista Alexandre Naime Barbosa, chefe de Infectologia da Unesp, em Botucatu (SP), e consultor da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia), explica que o projeto corresponde à uma quarta fase de testes para avaliar a efetividade da vacina, um conceito sobre o qual salienta: "é completamente diferente da eficácia".
"Nós já sabemos que a vacina da AstraZeneca/Oxford é eficaz e funciona, mas queremos avaliar a sua potência, o quanto ela funciona na vida real, na vida de cidadãos nas mais diferentes condições e classes sociais. O objetivo é saber qual é a resposta da vacinação de massa, em termos de evitar internação hospitalar ou em UTI e mortalidade", diz.
Outra característica do projeto é estudar o efeito do fármaco britânico em relação às mutações do coronavírus em circulação no Brasil. "Os estudos de fase três desta vacina contemplaram principalmente a análise do vírus original. Então, vamos ver se ela é eficaz também contra as variantes, como a P1, que circula aqui na nossa região", reitera.
Vacinação em massa
A pesquisa é organizada pela prefeitura municipal de Botucatu, em conjunto com o Ministério da Saúde, a Unesp, o Hospital das Clínicas/Faculdade de Medicina de Botucatu, a Universidade de Oxford e a Fundação Gates. Para realizar o trabalho, que deve durar cerca de oito meses, as autoridades pretendem vacinar todos os cidadãos acima dos 16 anos da cidade.
"Claro, tudo será realizado com base em pessoas voluntárias. Ninguém será obrigado a se vacinar. Nós vamos oferecer a vacinação para 100% das pessoas. Lembrando que esse é um estudo, mas que está dentro do plano nacional de imunização. Não estamos testando uma vacina nova, mas essa é uma vacina que já existe e já está aprovada pela Anvisa", salienta.
Barbosa destaca que Botucatu tem as condições ideais para a realização deste projeto, com a presença de cerca de seis mil médicos para uma população de 140 mil habitantes, além da tradicional Faculdade de Medicina da Unesp.
"Essa é a cidade do Brasil com mais médicos por 100 mil habitantes. Nós temos uma cultura de ciência na cidade, tanto é que o Kit Covid ou o tratamento com cloroquina nunca tiveram espaço aqui, porque é uma cidade que tem uma cultura científica muito antiga", ressalta.
Segurança da vacina da AstraZeneca/Oxford
O infectologista afirma que a polêmica envolvendo o imunizante da AstraZeneca/Oxford na Europa, após raros casos de trombose em pessoas vacinadas, não foi verificada no Brasil. Para ele, questões comerciais e o embate político entre a União Europeia e o Reino Unido prejudicaram a imagem no produto entre os cidadãos europeus, que, além disso, têm outras opções de imunizantes.
"Na Europa, essa rejeição é muito maior e há outras vacinas que nós não temos. O governo brasileiro não comprou a vacina da Pfizer. Então, nós temos a CoronaVac e a AstraZeneca/Oxford. Infelizmente, essa é uma discussão que se faz pautada em questões políticas. E quando se transpõe isso para uma realidade onde não existe outras opções de vacina, isso é mais pérfido ainda", sublinha.
Barbosa lembra que os efeitos colaterais graves relacionados à vacina da AstraZeneca/Oxford são extremamente baixos comparados às milhões de pessoas já imunizadas com o fármaco britânico. Para ele, não há dúvidas que é melhor se proteger contra a covid-19 do que considerar um risco mínimo de reações, calculado em 0,0004% (4 casos por 1 milhão de doses).
"O risco de as pessoas terem covid é, pelo menos, 100 mil vezes maior do que ter um efeito colateral da vacina. O imunizante vai trazer uma relação custo-benefício muito maior para as populações. Muitas agências reguladoras de medicamentos já disseram que a vacina é segura. Os riscos, quando se pensa em saúde pública, são ínfimos", conclui.
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