'Bordel da Europa': legalizada há mais de 20 anos, prostituição volta a ser polêmica na Alemanha

A oposição conservadora no Parlamento alemão faz campanha para reformar a lei que legalizou o comércio sexual no país. Em uma moção apresentada ao Bundestag nesta sexta-feira (23), o partido cristão da ex-chanceler Angela Merkel argumentou que a lei de 2002 não alcançou seu objetivo de melhorar a situação dos profissionais do sexo e conter o tráfico de pessoas - muito pelo contrário. Os conservadores querem proibir os bordéis e penalizar as pessoas que compram serviços sexuais. 

O atual chanceler alemão, Olaf Scholz, um social-democrata, também pediu mudanças recentemente, dizendo que era "inaceitável que homens comprassem mulheres" no país.

Birgit, 57 anos, está acostumada a contratar os serviços de um acompanhante dentro de uma estrutura de prostituição autorizada que a faz companhia ao longo dos anos. No entanto, ela teme que isso seja questionado, pois a prostituição está novamente sendo objeto de debate na Alemanha, mais de vinte anos depois de ter sido legalizada. 

O torneio de futebol da Eurocopa que será realizado na Alemanha este ano exige uma vigilância especial contra o tráfico de pessoas, alertou a parlamentar social-democrata, Leni Breymaier, nesta sexta-feira (23). "Porque o mercado criado por esse evento não pode ser preenchido pela 'prostituição voluntária' ".

Kevin, um dos 800 membros da Federação de Serviços Sexuais e Eróticos (BesD), disse que trabalha "como acompanhante voluntário há anos". O homem de 43 anos, que cobra € 500 por duas horas de trabalho sexual para complementar sua renda como técnico de aquecimento, acredita que a proibição do trabalho sexual só aumentaria a violência invisível da profissão.

Consentimento

Em sua opinião, "o proxenetismo e o tráfico de mulheres deveriam ser punidos com mais severidade". Como gerente do portal Callboyz.net, onde outros homens vendem seus serviços, ele explica que todos os profissionais do sexo são registrados junto às autoridades alemãs e pagam impostos.

Birgit, uma das clientes de Kevin, que, assim como ele, não quer revelar seu nome, elogia essa estrutura pela "garantia de não ser violada ou contrair doenças sexuais durante um 'encontro'". "Se todos consentirem, todo adulto é livre para fazer o que quiser com seu corpo", disse ela.

Quase 30 mil prostitutas registradas

A Alemanha tem cerca de 28.280 prostitutas registradas, de acordo com o Departamento Federal de Estatística (Destatis) do país. No entanto, o número de profissionais do sexo não declarados é muito maior. A copresidente do grupo parlamentar conservador de oposição no Congresso alemão, Dorothee Bär, estima que o número verdadeiro seja de cerca de 250.000, a maioria mulheres. Ela descreve seu país como o "bordel da Europa".

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Na França, o número de prostitutas é estimado entre 30.000 e 40.000, um número que não inclui a prostituição ocasional.

A vida cotidiana de Jana, uma búlgara de 48 anos que chegou a Berlim em 1999, não é nada parecida com a de Kevin. Escondida pelo capuz, a voz de Jana fica trêmula quando ela conta como vendeu seus serviços sexuais para pagar a passagem de ônibus (€ 110) ao homem que a ajudou a chegar à Alemanha, em 1999.

Duas décadas depois, ela dorme na rua e diz que tem que aceitar trabalhos sexuais de € 30, em banheiros públicos e sex shops. Para enfrentar a situação, Jana, que prefere não dizer seu nome, tomou metanfetamina (ou metanfetamina cristal) por nove anos, mas diz que parou há três meses.

Bordéis

"Um caso clássico", explica Gerhard Schönborn, diretor da associação Neustart (Novo Começo) de Berlim, que ajuda prostitutas. Ele acredita que a legalização teve efeitos negativos. "A ideia original era tirar a profissão das sombras. Mas isso ajudou a aumentar o número de bordéis na Alemanha". A oposição conservadora alemã se apropria politicamente deste tipo de argumento para ganhar terreno entre o eleitorado de direita e extrema direita no país, cujo crescimento não passa desapercebido pelas pesquisas de opinião, às vésperas das eleições europeias.

É no café de sua associação, localizado na rua Kurfürstenstrasse na capital alemã, que Jana descansa. "Nós as ajudamos a se registrar no centro de empregos, encontrar um médico, acomodação e possivelmente um novo emprego", explica Schönborn.

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O ponto de encontro, que fica aberto várias horas por dia, recebe cerca de 3.500 mulheres por ano. No final de 2022, a Alemanha tinha 2.310 empresas de prostituição registradas - bordéis, mas também serviços que fornecem prostitutas para determinados eventos, de acordo com o escritório nacional de estatísticas Destatis.

Esses estabelecimentos também estão na mira dos defensores de uma reforma da lei, que criticam as condições em que as mulheres trabalham e a inadequação dos controles.

(Com AFP)

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