Filial asiática: Estado Islâmico investe em novo reduto fora do Oriente Médio

As imagens da apresentação dos supostos suspeitos do atentado nos arredores de Moscou, publicadas pelas agências oficiais russas, são extremamente violentas.

Todos os quatro homens têm cicatrizes físicas. Um deles tem hematomas no rosto, o outro ainda tem um saco plástico no pescoço. O terceiro tem a cabeça enfaixada e sangue em sua testa. Esse homem, de acordo com vídeos postados em canais do Telegram com reputação de serem próximos aos serviços de segurança, teve sua orelha cortada após sua prisão.

A organização que reivindicou o atentado em Moscou é parte do Estado Islâmico que o Ocidente atacou no Iraque e na Síria há cinco anos. Segundo David Gaüzère, pesquisador associado ao Centro Francês de pesquisa sobre serviços de inteligência, a organização estaria supostamente em declínio.

Shamsidin Fariduni, Dalerdzhon Mirzoyev, Mukhammadsobir Faizov, Saidakrami Murodali Rachabalizoda, suspeitos do tiroteio na prefeitura de Crocus
Shamsidin Fariduni, Dalerdzhon Mirzoyev, Mukhammadsobir Faizov, Saidakrami Murodali Rachabalizoda, suspeitos do tiroteio na prefeitura de Crocus Imagem: AP/RFI Photo/Alexander Zemlianichenko

"Essa filial é uma das subsidiárias do Estado Islâmico. O grupo é dividido em vilayas, que são unidades geográficas ou funcionais. E ela é a organização do Estado Islâmico Khorassan (EI-K) que muitas vezes é apresentada como sendo uma filial afegã, mas que não é apenas afegã, porque Khorassan é um termo medieval que engloba uma antiga designação geográfica que abrange todo o Afeganistão, a Ásia Central e o nordeste do Irã. Portanto, estamos lidando com uma filial da Ásia Central da organização Estado Islâmico."

Revitalização do Estado Islâmico desde 2020

Nos últimos anos, haveria uma mudança no reduto da organização Estado Islâmico do Iraque e da Síria para a Ásia Central. "Mas não somente", explica Gaüzère.

Desde o início da década de 2020, temos visto uma revitalização geral da organização Estado Islâmico em todos esses vilarejos. Como temos essa organização no Sahel, vimos que, recentemente, ela também tem se expandido para o Sinai e o Iêmen. Lá, estamos lidando com diferentes vilayas. E, é claro, que na Ásia Central tem sido assim desde então.
David Gaüzère

Desde o Afeganistão e a partida dos americanos em 2021, essa filial tem desempenhado um papel importante e determinante no restabelecimento da organização Estado Islâmico na região.

Continua após a publicidade

"Por vários motivos, quando o Talibã assumiu o poder no Afeganistão em 2021, obviamente, eles instalaram chefes talibãs em todo o país", da etnia pachtoune, da qual faz parte a maioria dos talibãs.

Os chefes islâmicos foram rapidamente varridos por um expurgo étnico, para serem substituídos por quadros pachtounes, o que significa que as populações mais religiosas, as mais radicalizadas foram engrossar as fileiras do EI-K. A organização também foi incrementada por populações radicalizadas da Ásia Central ou das terras de migração, ou seja, Moscou, Istambul e as grandes cidades russas.
David Gaüzère

"Também gostaria de deixar claro um ponto. Moscou, embora não reconheça o regime talibã, estabeleceu relações cordiais com esse regime porque ambos combatem um inimigo comum, a Otan", lembra o pesquisador, que também é presidente do Centro de Observação de Sociedades da Ásia Central, especializado em questões relacionadas ao islamismo e ao terrorismo no espaço pós-soviético.

O Tajiquistão teria sido o alvo do ataque em Moscou, porque esse país é o ponto fraco da Ásia Central, segundo o pesquisador francês.

"É o país mais frágil da região. Por um lado, porque esse país é uma ditadura. Você tem um presidente que está no comando, com o apoio da Rússia. Essa ditadura chegou ao poder em 1992, se estabeleceu em 1997, após cinco anos de guerra civil e tem tentado eliminar toda a oposição ao seu redor, a ponto de reduzir sua base de apoio. Até mesmo no clã do presidente, o clã dos russos."

"Por outro lado, os russos, é claro, apoiaram esse regime. Mas eles fizeram isso por meio da presença de uma divisão, a 200ª divisão de rifles motorizados na fronteira afegã, e o conflito ucraniano forçou a Rússia a desativar essa divisão", diz Gaüzère.

Continua após a publicidade

"Essa divisão militar, que era composta por 7.000 homens, enviou entre 1.500 e 2.000 para a guerra na Ucrânia, o que tornou o Tajiquistão ainda mais vulnerável. E, como sabemos, estamos nas rotas do tráfico de drogas, heroína etc. E o enfraquecimento da presença russa, devido à guerra na Ucrânia, abriu espaço para os terroristas desta divisão do grupo Estado Islâmico", finaliza David Gaüzère.

Deixe seu comentário

Só para assinantes