Topo

Reinaldo Azevedo

China reage a ataque boçal de Eduardo e acena até com retaliação comercial

Yang Wanming, embaixador da China no Brasil. Elevou-se a temperatura da reação à estupidez e à burrice de Eduardo Bolsonaro - Adriano Machado/Reuters
Yang Wanming, embaixador da China no Brasil. Elevou-se a temperatura da reação à estupidez e à burrice de Eduardo Bolsonaro Imagem: Adriano Machado/Reuters

Colunista do UOL

25/11/2020 07h36

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) se comporta como um arruaceiro qualquer. Mas, infelizmente, ele não o é. Trata-se de um arruaceiro a um só tempo qualificado — em razão do cargo que ocupa e dos vínculos familiares que possui — e desqualificado, dada a mistura de irresponsabilidade e vulgaridade das coisas que costuma espalhar por aí.

Além de presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, o parlamentar é filho do presidente da República e, ainda que possa parecer estranho falar nestes termos, é o candidato a intelectual da família. E, como se sabe, aquele que ocupa o Palácio do Planalto não costuma divergir de suas crias. Percebe-se que Jair é o tipo de pai tóxico: autoritário com os outros, mas permissivo com os filhos desde que estes se mostrem truculentos e arrogantes.

A Embaixada da China em Brasília — e isso quer dizer a China ela mesma — teve nesta terça a mais dura reação aos ataques permanentemente desfechados por bolsonaristas ao país. Não é a primeira manifestação de incômodo. Desta feita, no entanto, o maior parceiro comercial do Brasil acenou explicitamente com retaliação comercial. A questão agora é saber se Jair Bolsonaro está disposto a pagar o preço — que nós pagaríamos, é claro!

Na noite de segunda, Eduardo postou nas redes sociais mensagens em que afirma a adesão do Brasil ao programa "Clean Network", lançado pelo governo Trump, "criando uma aliança global para um 5G seguro, sem espionagem da China". Não parou por aí. Citou um suposto endosso do ministro Paulo Guedes à iniciativa e emendou:
"O programa ao qual o Brasil aderiu pretende proteger seus participantes de invasões e violações às informações particulares de cidadãos e empresas. Isso ocorre com repúdio a entidades classificadas como agressivas e inimigas da liberdade, a exemplo do Partido Comunista da China".

As postagens foram posteriormente apagadas.

A reação da embaixada chinesa veio muitos tons acima de tudo o que se viu até agora. Não só o país formalizou uma queixa ao Itamaraty como tornou publica uma nota em que diz, por exemplo:
"Tais declarações infundadas não são condignas com o cargo de presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados. Prestam-se a seguir os ditames dos EUA no uso abusivo do conceito de segurança nacional para caluniar a China e cercear as atividades de empresas chinesas. Isso é totalmente inaceitável para o lado chinês e manifestamos forte insatisfação e veemente repúdio a esse comportamento. A parte chinesa já fez gestão formal ao lado brasileiro pelos canais diplomáticos".

Observem que, se os chineses julgassem irrelevante o ataque boçal, a resposta se limitaria a conversas ao pé do ouvido entre os diplomatas. A nota, no entanto, eleva a questão a um novo patamar. Pela primeira vez, os chineses lembraram a parceria comercial entre os dois países, de que o Brasil é beneficiário, e não somente para exaltar os laços de amizade entre as duas nações. Afirma o texto:

"Ao longo dos 46 anos de relações diplomáticas, a parceria sino-brasileira conheceu um rápido desenvolvimento graças aos esforços de ambas as partes. A China tem sido o maior parceiro comercial do Brasil há 11 anos consecutivos e é também um dos países com mais investimentos no Brasil. Entre janeiro e outubro, as exportações brasileiras para a China foram de US$ 58,459 bilhões, respondendo por 33,5% do total de exportações do Brasil. As cooperações na telecomunicação e em outros setores foram construídas sobre bases sólidas e alcançaram avanços a passos largos."

Mais adiante, afirma:
"Na contracorrente da opinião pública brasileira, o deputado Eduardo Bolsonaro e algumas personalidades têm produzido uma série de declarações infames que, além de desrespeitarem os fatos da cooperação sino-brasileira e do mútuo benefício que ela propicia, solapam a atmosfera amistosa entre os dois países e prejudicam a imagem do Brasil. Acreditamos que a sociedade brasileira, em geral, não endossa nem aceita esse tipo de postura."

E aí, vem, sim, a ameaça explícita:
"Instamos essas personalidades a deixar de seguir a retórica da extrema direita norte-americana, cessar as desinformações e calúnias sobre a China e a amizade sino-brasileira, e evitar ir longe demais no caminho equivocado, tendo em vista os interesses de ambos os povos e a tendência geral da parceria bilateral. Caso contrário, vão arcar com as consequências negativas e carregar a responsabilidade histórica de perturbar a normalidade da parceria China-Brasil."

O tom da nota transforma a questão num incidente diplomático.