Reinaldo: Reparar escravidão é necessário; Portugal precisa pensar como

O colunista Reinaldo Azevedo afirmou no Olha Aqui! desta quarta (24) que Portugal tem o dever de reparar as nações colonizadas e escravizadas por ele, mas a maneira como irá fazê-lo ainda é uma incógnita. Ontem, o presidente português, Marcelo Rebelo de Sousa, declarou seu país responsável por crimes cometidos durante o período colonial e escravocrata e sugeriu a necessidade de reparações.

Há que se fazer a reparação máxima possível e nós jamais saberemos o que será esse máximo possível. Esse debate é sempre muito delicado. Você não pode tomar com os olhos do que sabemos hoje, das considerações de hoje o processo de colonização. Você tinha, à época, um aporte moral que era outro, um entendimento sobre o outro que também era outro. O fato de isso ter acontecido dessa maneira, o fato de haver essa diferença de aporte filosófico e de conhecimento científico não elimina a violências acontecidas. Aconteceram e há registros contemporâneos de gente que via a violência acontecer. Você encontra isso no [registro de] Padre Vieira [1608-1697]: a censura moral a determinadas práticas, embora ele fizesse parte de uma cultura colonialista. E como parte disso, a cabeça dele tinha um limite dessa cultura, dessa visão de mundo. Reinaldo Azevedo, colunista do UOL

Reinaldo ressaltou ser favorável à reparação e lembrou como a escravidão constituiu um verdadeiro modelo econômico de Portugal.

Eu estou a favor da reparação, e só estou expondo as dificuldades que existem. Muita gente contestando essa ideia de que é preciso reparar os países diz: 'A escravidão acompanhou a história da humanidade'. É verdade. Só que o escravizado grego, no império romano, não era o escravizado negro no Brasil. Era uma outra coisa. Havia escravizados gregos que eram preceptores, inclusive, de famílias romanas, ricas. É diferente essa escravidão da sujeição em razão da guerra e da conquista do escravismo que houve no Brasil como modelo econômico. Erigiu-se no Brasil, e portanto, Portugal, um jeito de tocar a economia, de tocar o desenvolvimento, de fazer acumulação de capital, de promover a ciência e a cultura. E a fonte geradora daquela riqueza era a escravidão. É claro que essas nações são devedoras desses países pobres, hoje ainda. A questão aí, sempre complicada, é saber quem recebe a reparação e como. Porque nós tivemos países que foram espoliados, culturas que foram espoliadas, grupos humanos que foram espoliados, indivíduos que foram escravizados. Quem recebe essa reparação? Reinaldo Azevedo, colunista do UOL

Nós temos no Brasil, por exemplo, uma política interna e tentativa de correção de desigualdades que é a política de cotas. Então, se reconhece, independentemente de Portugal, na política de cotas que diz respeito à cor da pele, que os negros arcam com um passivo de desigualdades, imposições e violências que chegam até os dias de hoje. E, portanto, a política de cotas é uma resposta, ainda que tímida, a isso. Agora, como é que se faz a reparação de países europeus para países africanos, para países que passaram pelo processo de colonização, no caso de Portugal e o Brasil, por exemplo, da Espanha e toda a América espanhola, que teve uma colonização brutalmente mais violenta que aquela havida aqui no Brasil? Como é que você faz isso? Precisa? Precisa. Como é que se faz é um mistério. Diz o presidente português: 'Nós não podemos ficar na simples retórica'. Tem de ir além. É no ir além que ninguém sabe onde vai, ninguém sabe exatamente o que fazer. Reinaldo Azevedo, colunista do UOL

O Olha Aqui! vai ao ar às segundas, quartas e quintas, às 13h.

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Veja abaixo o programa na íntegra:

Opinião

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