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Reinaldo Azevedo

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Que 2ª Turma vote suspeição de Moro e estenda o efeito para o caso do sítio

Gilmar Mendes, presidente da Segunda Turma: parece-me evidente que habeas corpus que já está em votação tem de ser decidido na Turma - Fellipe Sampaio /SCO/STF
Gilmar Mendes, presidente da Segunda Turma: parece-me evidente que habeas corpus que já está em votação tem de ser decidido na Turma Imagem: Fellipe Sampaio /SCO/STF

Colunista do UOL

09/03/2021 07h22

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Pois é... Será que a Segunda Turma está proibida de votar a suspeição de Sergio Moro, já que há lá um habeas corpus que trata do assunto, cuja votação já começou, contando já com dois votos? Um deles é do próprio Edson Fachin. O outro é de Cármen Lúcia — e ambos são contra a suspeição. É bem verdade que foram dados antes de todos sabermos o que todos sabemos com Vaza Jato e Operação Spoofing.

Todos se perguntam a esta altura: o que deu em Fachin? A hipótese de que ele atuou para tentar livrar Sergio Moro de um vexame parece plausível. Resolveu submeter a sua decisão ao pleno. E, convenham, ali ela pode ser recusada. Se isso viesse a acontecer, tudo voltaria ao status anterior, e a suspeição estaria do mesmo modo na pauta da Segunda Turma. Aliás, todos os outros habeas corpus que Fachin incluiu na decisão estariam ativos, à espera de decisão.

Ocorre que uma questão se coloca: será que os cinco ministros da Segunda Turma estão obrigados a esperar que o pleno vote a decisão do Fachin, ficando proibida de julgar a suspeição de Moro? Será que este HC está mesmo prejudicado? Entendo que a resposta correta é "não".

MUDANÇA DE FORO E DE OBJETO
O próprio ministro Fachin havia afetado a Segunda Turma -- vale dizer: ele mesmo decidira no passado que o HC da suspeição deveria ser ali votado. Não pode agora, entendo eu, como relator de um outro HC, criar um saco de gatos e mudar a seu gosto a decisão. Estabelecida a competência de uma das turmas ou do pleno, estabelecida está. Um relator pode muito, mas não pode tudo.

Fachin incluiu na sua decisão uma batelada de habeas corpus, inclusive o que trata da suspeição. Parece-me arbitrário que o relator decida tornar sem efeito um habeas corpus que já está em curso, mudando seu foro e, o que é mais especioso, o seu objeto.

Uma ação de suspeição é coisa bem mais séria do que a questão da competência do juiz, ainda que, convenham, a decisão de Fachin carregue algo de humilhação para os tribunais que endossaram a sentença daquele que, segundo o relator do petrolão no Supremo, nem juiz era.

O problema da competência é, sim, sério, mas se examina com menos profundidade o papel deletério — ou não — de um então juiz que, entendo, atuou no comando da acusação. A suspeição é algo bem mais grave e requer que se coloquem em primeiro plano direitos fundamentais que um juiz parcial pode agredir.

Mais: a votação da suspeição requer também que se faça um exame vertical do trabalho do juiz da causa. É evidente que considero Moro mais do que suspeito. E antes mesmo que viessem à luz as reportagens da Vaza Jato e o conteúdo da Spoofing.

EFEITO EXTENSIVO
Se a votação acontecer em algum momento antes de o pleno se debruçar sobre a decisão de Fachin e se Moro for considerado suspeito, a questão não poderá se restringir ao caso do Tríplex. A outra ação penal de que ele participou -- a do sítio --, aceitando a denúncia e realizando a instrução, também está comprometida.

Já considerei algumas vezes que não se poderia conceder, de ofício, efeito extensivo ao habeas corpus que trata da questão do triplex, de modo que a decisão valesse também para o caso do sítio. Mas reconsidero.

UM VOTO DE TEORI ZAVASCKI
A jurisprudência no Supremo reconhece a extensão, de ofício, de habeas corpus. Em abril de 2015, Teori Zavascki, então relator do petrolão, concedeu habeas corpus ao empreiteiro Ricardo Pessoa, dono da UTC. O ministro considerou, então, que apenas indícios de existência de crime não poderiam embasar prisão preventiva, como havia decretado Moro.

E, de ofício, Zavascki estendeu o efeito do habeas corpus a outros empresários presos preventivamente: Sérgio Cunha Mendes, vice-presidente da Mendes Júnior; Gerson de Mello Almada, vice-presidente da Engevix; Erton Medeiros Fonseca, diretor da Galvão Engenharia; e João Ricardo Auler, presidente do conselho de administração da Camargo Corrêa.

Assim, acho que não só a Segunda Turma pode votar a suspeição como pode, de acordo com jurisprudência da Casa, estender, de ofício, seus efeitos à ação penal do sítio. Afinal, se Moro era suspeito num caso, por que não seria no outro? As ações penais são distintas, mas o juiz suspeito e o réu vítima dessa suspeição são os mesmos. No caso em que atuou Teori, os efeitos do HC de um preso foram estendidos a outros.

Isso tudo, claro!, na hipótese de que a suspeição no caso do tríplex seja mesmo declarada.

Se isso acontecer, as condenações de Lula estarão anuladas. E o pleno vai examinar a decisão de Fachin sobre os outros habeas corpus.

Vamos ver o que vai decidir a Segunda Turma, composta por Gilmar Mendes (presidente), Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Edson Fachin e Nunes Marques.