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Corpo de ex-morador do Pinheirinho será exumado nesta quinta-feira

Foto do documento de identidade do aposentado e ex-morador do Pinheirinho Ivo Teles dos Santos, 70, morto no último dia 9; a Polícia Civil investiga se a morte tem relação com supostas agressões que ele teria sofrido de PMs durante a reintegração - Divulgação
Foto do documento de identidade do aposentado e ex-morador do Pinheirinho Ivo Teles dos Santos, 70, morto no último dia 9; a Polícia Civil investiga se a morte tem relação com supostas agressões que ele teria sofrido de PMs durante a reintegração Imagem: Divulgação

Guilherme Balza

Do UOL, em São Paulo

14/06/2012 06h00

O corpo de Ivo Teles dos Santos, 70, ex-morador da comunidade do Pinheirinho, em São José dos Campos (97 km de São Paulo), alvo de uma ação de reintegração de posse em janeiro, será exumado a partir das 14h desta quinta-feira (14), em Ilhéus, no sul da Bahia (446 km de Salvador).

Santos, que era aposentado, ficou dois meses hospitalizado após ação no Pinheirinho. Ele morreu em 9 de abril, vítima de falência múltiplas de órgãos. A exumação, autorizada pela 2ª Vara Criminal de Ilhéus, será realizada pelo IML (Instituto Médico Legal) a pedido do defensor público Jairo Salvador, de São José dos Campos, e ajudará a descobrir qual foi a causa da morte do aposentado.

O idoso deu entrada no hospital municipal Dr. José Carvalho de Florence no dia 22 de janeiro, em São José, horas depois do despejo. Lá, ficou internado em coma até 22 de março, quando sua filha Ivanilda Jesus dos Santos, 34, chegou da Bahia para retirá-lo. Até a morte, diz Ivanilda, o aposentado permaneceu em estado vegetativo, sem se movimentar, nem responder a qualquer estímulo.

  • Ivo Teles dos Santos grita com policiais durante ação no Pinheirinho; na ocasião, ele disse ter sido agredido pelos PMs

Morte controversa

Segundo o Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana), testemunhas afirmaram a conselheiros do órgão que Santos foi hospitalizado após ser agredido por policiais militares, com golpes de cassetetes na cabeça.

O defensor público diz que outras testemunhas relataram a mesma versão em depoimento à Polícia Civil. Já segundo a administração do hospital, Santos deu entrada na unidade com “quadro confusional” e “crise hipertensiva” após sofrer um AVC hemorrágico, diagnosticado após a realização de uma tomografia do crânio.

No dia da ação no Pinheirinho, o aposentado foi entrevistado por uma repórter do jornal “O Vale”, de São José dos Campos, e afirmou: “Eles vieram com muita violência para tirar a gente de casa. Eu reagi e eles partiram para cima. Caí no chão e os três policiais continuaram a bater com o cassetete em mim. Olha só como estou agora? Não consigo nem andar.”

Vídeo gravado (veja acima) no dia da desocupação do Pinheirinho, mostra o aposentado gritando contra um grupo de policiais militares. No vídeo, ele diz ter sido agredido na ação.

Santos morava sozinho em uma das áreas mais pobres do Pinheirinho, conhecida como Cracolândia. A única pessoa próxima do aposentado no município era a ex-mulher, Osorina Ferreira de Souza, também moradora da comunidade, com quem Santos viveu por 20 anos.

Depois da reintegração, Osorina saiu à procura do ex-marido. Encontrou-o apenas dias depois. Em 4 de fevereiro, acompanhada de deputados estaduais e conselheiros do Condepe, solicitou ao hospital o Boletim de Atendimento de Urgência (BAU), documento médico que atesta as condições em que o paciente deu entrada no hospital.

A direção da unidade negou o documento, alegando que informações sobre o paciente são sigilosas e só podem ser repassadas a familiares. De acordo com o relatório do Condepe, integrantes do corpo de enfermagem do hospital teriam informado à Osorina que a causa primária de internação de seu ex-marido seriam as agressões que ele teria sofrido, e não o AVC.

A filha do aposentado afirma que, quando o retirou do hospital, ele estava com vários hematomas, cicatrizes e escoriações pelo corpo, além de pontos na cabeça. A ela o hospital entregou a tomografia do crânio de Santos e outros documentos, mas não forneceu o BAU. “Não me entregaram. Esse documento é fundamental”, afirma Ivanilda.

No dia 6 de fevereiro, segundo o Condepe, a versão do hospital e da Secretaria Municipal de Saúde sobre o motivo da entrada do aposentado na unidade foi registrada em boletim de ocorrência lavrado no 5º DP de São José.

A PM nega que tenham ocorrido as agressões. A filha de Santos diz que entregará todos os documentos médicos que recebeu para a defensoria.

O defensor público Jairo Salvador afirmou que, em posse dos documentos, irá pedir um laudo do Instituto de Medicina de São Paulo. A defensoria recebeu 586 ações individuais de moradores que sofreram violência física e psicológicas ou perderam bens na ação. “É incrível a simetria dos relatos. Ou houve uma histeria coletiva ou o que eles dizem realmente aconteceu”, afirma o defensor.

A história de Ivo Teles dos Santos

Após retirar o pai do hospital, Ivanilda ficou por uma semana na casa de uma irmã no Itaim Paulista, no extremo leste da capital paulista. De lá, foram para Ilhéus, no litoral sul baiano, onde ela trabalha como camareira e vive com dois filhos. Ela conta que teve de abandonar o emprego para cuidar do pai.

“Abandonei o trabalho para ficar em casa cuidando dele. Meu pai ficou sem uma peça de roupa sequer, só com o roupão do hospital. Tive que comprar. Ele usava fraldas, medicamentos... E não consegui retirar a aposentadoria dele. Foi tudo com o meu dinheiro.”

Segundo Ivanilda, seu pai deixou Ilhéus no início da década de 80, quando ela tinha apenas sete anos, para procurar emprego em São Paulo. Antes de se aposentar, Santos fez vários bicos, trabalhou em uma empresa que produzia antenas parabólicas e foi carpinteiro. Além de Ivanilda, o aposentado têm outro filho, de 49 anos, que não foi registrado como seu filho e mora no Rio de Janeiro.

A mãe de Santos ainda é viva. Ela tem 87 anos e também mora em Ilhéus. A família tentou esconder dela o estado de saúde do aposentado, mas foi inevitável. “Ela viu a situação que o filho ficou. Foi muito dolorido para ela e para a família toda.”