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Medo de transferência para prisão comum mantêm disciplina em presídio para PMs em SP

Gil Alessi

Do UOL, em São Paulo

06/02/2013 06h00

Os quase 191 policiais militares que cumprem pena ou aguardam julgamento no Presídio Militar Romão Gomes, na zona norte de São Paulo, têm um motivo a mais para manter a disciplina no local: o receio da transferência para uma penitenciária comum.

Veja a localização do Presídio Militar Romão Gomes em São Paulo

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“Sem dúvida isso colabora para manter a ordem no presídio”, diz o tenente-coronel Daniel Augusto Ramos Ignácio, diretor da instituição há dois anos. A primeira-tenente Ana Maria Adriano da Silva, oficial de assuntos civis da PM, concorda. "Aqui todo mundo anda na linha e se respeita, e esse é um dos motivos", afirma.

Cerca de 60% dos internos do Romão Gomes cumprem pena ou aguardam julgamento por homicídio, alguns deles por envolvimento em crimes durante a onda de violência que assolou a cidade no segundo semestre de 2012.  

“De acordo com a legislação, o policial militar infrator deve cumprir pena em uma unidade especial. Caso seja expulso da corporação após processo administrativo ele está sujeito a ser enviado para o sistema prisional regular, especialmente em casos de mau comportamento”, afirma Ignácio. Penas superiores a dois anos também fazem com que o policial seja exonerado da PM.

Geralmente os internos expulsos do presídio militar são mandados para a P2 de Tremembé (133 km da capital), penitenciária especial que abriga presos que sofrem rejeição junto à população carcerária comum em função de seus crimes: são estupradores, pedófilos, assassinos de crianças e ex-policiais.

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Mas, de acordo com o Tribunal de Justiça Militar, "a transferência depende da conveniência, oportunidade e disponibilidade de vaga", e já foram registrados casos de ex-policiais que foram enviados para outras unidades que não a P2.

Os números do Romão Gomes confirmam o efeito dissuasivo que uma possível transferência tem nos policiais detidos. Segundo Ignácio, nunca houve uma rebelião no presídio desde sua criação, em 1949.

As fugas são raras: foram duas na última década, todas cometidas por internos que cumpriam pena em regime semiaberto (no qual o preso tem autorização para trabalhar ou estudar fora durante o dia e deve retornar para o presídio à noite).

Justiça comum julga crimes de PMs contra a vida de civis

Os crimes cometidos por policiais militares contra a vida de civis são julgados pela Justiça comum. Nesses casos, o Tribunal de Justiça Militar do Estado decide sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e praças.

“Também não existem facções criminosas como em outras prisões e não registramos nenhum episódio de violência grave entre os internos”, diz o diretor.

“Mesmo o policial que está aqui por cometer um crime sexual, como estupro ou abuso, não sofre violência por parte dos demais presos nem precisa ficar em uma área isolada como no sistema carcerário comum. Mas é óbvio que ele não é bem visto pela população geral do presídio”.

A segurança do Romão Gomes é feita integralmente por policiais militares, e não por agentes penitenciários como nas demais prisões. Visitas de batalhões da PM ao local são frequentes, e tem efeito "didático".

“Além de mostrar um modelo de penitenciária que está de acordo com a lei achamos importante que os policiais, especialmente aqueles que estão começando na carreira, saibam que a corporação não compactua com irregularidades”, informa Ana Maria.

Solitária

Além de uma possível transferência para presídios comuns, outras punições ajudam a manter a ordem no Romão Gomes. O diretor pode determinar o isolamento do interno por até 30 dias na ‘solitária’, sem contato com outros presos e com direito a sair da cela apenas para se alimentar e tomar um pouco de sol.

O juiz também pode determinar a mudança do regime de cumprimento de pena para RDD (regime disciplinar diferenciado) por até um ano. A lei, que vigora desde 2003, foi criada para limitar a ação dentro dos presídios de facções criminosas como o CV (Comando Vermelho) no Rio de Janeiro e o PCC (Primeiro Comando da Capital) em São Paulo.

Ela prevê que o preso seja mantido em cela individual 22 horas por dia, sem direito a receber jornais, assistir televisão ou ter qualquer contato com o mundo externo.

Hierarquia

O policial de maior patente preso no local é um coronel. Segundo Ignácio, a administração do Romão Gomes trata todos os internos da mesma maneira, independentemente do posto que detivessem quando estavam em atividade.

“Quando chega um oficial para cumprir pena ou aguardar julgamento, converso com ele para explicar que aqui ele não tem mais condições legais de exercer autoridade hierárquica, e deve seguir as regras internas com o mesmo afinco que qualquer outro preso”.

De acordo com o diretor, lá todos são tratados pelo nome e não pela patente.