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Mulheres sofrem mais violência de pessoas conhecidas, diz IBGE

A atriz Ludmila Nascarella, 38, sofreu violência em duas relações e usa essa experiência em suas apresentações teatrais. "Quando você pede ajuda, as pessoas acreditam que você tem de manter a postura da boa mulher, namorada, filha", diz - Arquivo pessoal
A atriz Ludmila Nascarella, 38, sofreu violência em duas relações e usa essa experiência em suas apresentações teatrais. "Quando você pede ajuda, as pessoas acreditam que você tem de manter a postura da boa mulher, namorada, filha", diz Imagem: Arquivo pessoal

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, no Rio

02/06/2015 10h00

As mulheres estão mais suscetíveis do que os homens à violência por parte de pessoas conhecidas, segundo dados do segundo volume da PNS 2013 (Pesquisa Nacional de Saúde), divulgado nesta terça-feira (2) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Nos 12 meses anteriores à realização da entrevista, 3,1% da população feminina com mais de 18 anos (2,5 milhões de mulheres) sofreram agressão física, verbal ou emocional cometida por pessoas que conheciam a vítima (maridos, pais, filhos, amigos etc.). Em relação aos homens adultos, a proporção era de 1,8% (1,2 milhão).

Na análise da média nacional, incluindo homens e mulheres, 2,5% dos brasileiros com mais de 18 anos (3,7 milhões de entrevistados) relataram que foram vítimas de violência de pessoas conhecidas. As maiores proporções foram verificadas nas regiões Norte (3,2%) e Sul (3%).
 
A atriz Ludmila Nascarella, 38, sofreu violência em duas relações e afirma que, muitas vezes, a mulher demora a perceber o que está ocorrendo. Em seu primeiro casamento, no começo dos anos 2000, ela precisou de muito tempo para reconhecer que sofria violência psicológica, além de ser agredida fisicamente. “Demorei um ano para entender o que era violência. Eu 'naturalizava' aquilo. Já havia sofrido abusos quando era mais nova e achava que era algo natural. As pessoas mais próximas reforçavam que eu tinha que ficar quieta”, diz.
 
Em 2010, ela já contava com sete medidas protetivas para que o companheiro, com quem teve uma relação aberta e que não aceitava o rompimento, se mantivesse longe. Ludmila chegou a receber perto de 10 mil e-mails com ameaças de morte, foi agredida verbalmente durante peças, teve a casa invadida e o nome pichado pela cidade.
 
No ano seguinte, juntamente com outras quatro mulheres que também sofreram agressão doméstica, ela organizou a "Marcha das Vadias" em Curitiba (PR), para ajudar a “empoderar” a si e às demais mulheres. “Em pleno século 21, somos criadas para obedecer. Quando você começa a identificar que aquilo [a agressão] não é certo e pede ajuda, as pessoas acreditam que você tem de manter a postura da boa mulher, namorada, filha.” Ludmila acredita que as coisas estão melhorando, principalmente após a criação de redes sociais, que facilitam a troca de experiências. “Com a 'Marcha das Vadias', conseguimos tornar o termo positivo e perceber que mulheres do Canadá, da África do Sul e do Brasil enfrentam os mesmos problemas.”

Vítimas de pessoas conhecidas são 2,5% da população adulta

A faixa etária mais suscetível a sofrer violência ou agressão de pessoa conhecida era a que vai de 18 a 29 anos (3,2%). O nível de instrução mais comum entre os que sofreram algum ato de violência cometido por pessoas que elas conheciam era o ensino fundamental completo e médio incompleto (2,8%).
 
Ainda de acordo com o estudo, feito com dados de 2013, há uma inversão do quadro quando se trata de violência oriunda de pessoas desconhecidas. Nesse caso, a proporção de homens vítimas de violência foi calculada em 3,7% (2,5 milhões) --um ponto percentual a mais em comparação com as mulheres.
 
Já 3,1% dos brasileiros com mais de 18 anos (4,6 milhões de entrevistados) afirmaram que foram agredidos fisicamente, verbalmente ou emocionalmente por pessoas que eles desconheciam --casos como brigas de rua, tentativas de assalto, entre outros exemplos.
 
A maioria também ocorreu com pessoas de 18 a 29 anos (4,5%), mas o nível de instrução mais comum entre as vítimas era o ensino médio completo e superior incompleto (4%). O Norte (5%) aparece com a maior proporção na análise por região.

Desenho próprio

O IBGE explicou que as estatísticas da Pesquisa Nacional de Saúde não são comparáveis com outras publicações do instituto, pois a pesquisa tem um "desenho próprio" (fatores que não haviam sido abordados antes). Dessa forma, não seria possível estabelecer séries históricas cruzando as informações com o suplemento de saúde da Pnad (Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílios).

Os entrevistadores do IBGE estiveram em pouco mais de 80 mil domicílios. O Brasil possui, segundo o IBGE, cerca de 65 milhões de residências.

O primeiro volume da PNS, divulgado em dezembro do ano passado, continha capítulos como a percepção do estado de saúde, as doenças crônicas não transmissíveis e o estilo de vida. Na ocasião, o UOL mostrou que quase metade dos brasileiros é sedentária, 15% fumam e 28% veem muita TVA hipertensão e os problemas na coluna eram as principais doenças dos brasileiros.

Intervalo de confiança

Por ser uma pesquisa por amostra, as variáveis divulgadas pela PNS estão dentro de um intervalo numérico, que é o chamado "erro amostral". Não há uma margem de erro específica para toda a amostra.

Para cada caso, é calculado o intervalo de confiança. "Isso quer dizer que, em 95% das vezes que eu pegar uma amostra e calcular o indicador, ele estará dentro daquele intervalo. (...) Quanto menor o intervalo de confiança, melhor é", explicou Maria Lúcia Vieira, gerente da Coordenação de Trabalho e Rendimento do IBGE.

Diferentemente das pesquisas eleitorais, que têm apenas um indicador em destaque (a intenção de votos de determinado candidato), a PNS tem vários indicadores e o valor de cada um deles oscila dentro do seu intervalo específico.

* colaborou na reportagem Juliana Passos