Polícia acha R$ 95 mil escondidos em guarda-roupa de vigário-geral em Goiás: "não é meu"
O MP-GO (Ministério Público de Goiás) informou que o total de dinheiro apreendido na Operação Caifás, deflagrada nesta segunda-feira (19), foi de R$ 135 mil.
Somente na casa do monsenhor Epitácio Cardozo Pereira, na cidade de Planaltina (GO), havia R$ 95 mil escondidos sob o fundo falso de um guarda-roupa e em outras partes da residência.
Na terça-feira será contabilizado o dinheiro em moeda estrangeira (dólar e euro) que foi coletado durante as buscas.
Preso nesta segunda-feira (19), Pereira é vigário-geral de Formosa (GO), cargo que corresponde ao segundo na hierarquia da diocese. Ele é suspeito de integrar um esquema de desvio de recursos e bens da Igreja Católica que alcançou a marca de R$ 1 milhão por ano, afirma o MP-GO (Ministério Público de Goiás). Considerando os anos de 2016 e 2017, período que deve ter durado o esquema, os desvios podem ter chegado a R$ 2 milhões.
Ao ser confrontado pelos agentes, o vigário-geral negou que o dinheiro pertencesse a ele. "Esse dinheiro não é meu, é da diocese." As notas estavam acondicionadas em plástico. Policiais também encontraram uma caixa aberta com cédulas e moedas. "Esse é o dinheiro da coleta", afirmou o vigário-geral.
Operação Caifás
Além do vigário-geral, também foram presos o bispo de Formosa (GO), José Ronaldo Ribeiro, e os padres Moacyr Santana, Mário Vieira de Brito e Waldson José de Melo.
Parte do dinheiro desviado foi usada, segundo a investigação, na compra de uma fazenda de gado e de uma casa lotérica na cidade de Posse, também no interior de Goiás. As propriedades foram colocadas em nomes de laranjas.
Policiais civis cumpriram 13 mandados de prisão e dez de busca e apreensão nas cidades de Formosa, Posse e Planaltina. Entre os locais de busca encontra-se um mosteiro, além das casas dos suspeitos. Segundo o Evangelho, Caifás --nome dado à operação-- foi o sacerdote que entregou Jesus Cristo a Pôncio Pilatos.
Foram apreendidos também aparelhos eletrônicos, notas promissórias e documentos contábeis da diocese. Contas bancárias dos suspeitos foram bloqueadas, por decisão da Justiça goiana.
Investigação começou com denúncias de fiéis
A investigação foi iniciada em 2015 pelo MP-GO a pedido de 30 "leigos católicos apostólicos" que denunciaram irregularidades e uso indevido de bens da Igreja Católica por parte da direção da Cúria Diocesana de Formosa.
"A região da diocese engloba 33 igrejas em 20 paróquias. Por ano, são arrecadados cerca de R$ 17 milhões por meio de dízimos, doações e faturamento de festas realizadas por fiéis, além de taxas aplicadas para cerimônias de batismo e casamento", informou o promotor de Justiça Douglas Chegury, responsável pela investigação.
"Deste total, cerca de 10% era repassado à Cúria Diocesana, o órgão máximo da diocese. A investigação descobriu que esse dinheiro era desviado pelo bispo e outros padres em benefício próprio", disse o promotor. "O montante desviado chega a R$ 1 milhão por ano", acrescenta o promotor.
A apuração descobriu, por meio quebra de sigilos telefônicos e bancários dos investigados, que somente um padre investigado tinha saldo de R$ 400 mil em sua conta bancária. "Carros da arquidiocese também eram desviados em proveito próprio dos investigados", afirmou Chegury.
Bispo negou irregularidades
"De modo mais incisivo, são inúmeros os diálogos transcritos a partir das interceptações telefônicas que apontam a possibilidade de que os clérigos José Ronaldo, Epitácio, Moacyr, Mário e Waldson estejam a desviar vultuosas quantias que podem ter servido para aquisição de uma propriedade rural no município de Posse com criação de gado e de uma casa lotérica [também em Pose], além de despesas de cunho exclusivamente pessoal diretamente pelo bispo arcadas pela instituição", afirma o juiz da 2º Vara Criminal de Formosa, Fernando Oliveira Samuel, em sua decisão que decreta a prisão temporária dos investigados. De acordo com a legislação, a prisão temporária vale por cinco dias.
Quando veio a público as denúncias dos fiéis, o bispo José Ronaldo Ribeiro negou que tenha cometido irregularidades.
"Não tem nada de impropriedade. Não toco nos repasses financeiros das paróquias que são destinados à manutenção das necessidades da diocese, casa do clero, seminário, estrutura da cúria e funcionários, por exemplo”, disse o bispo.
Funcionários da diocese de Formosa afirmam que esperam a chegada dos advogados para a divulgação de um comunicado oficial sobre o assunto. A reportagem ainda não conseguiu o contato com a defesa dos investigados.
Pressão sobre testemunhas
Quando as denúncias dos fiéis vieram à tona, o bispo Ribeiro convocou um padre de sua confiança, que tinha as funções de juiz eclesiástico, com o objetivo de intimidar testemunhas, afirma o MP-GO.
"Esse juiz eclesiástico pressionou os padres para que nada fosse relevado e eles jurassem fidelidade ao padre. O bispo e o juiz eclesiástico, com a ajuda de um advogado, elaboraram um relatório falso no qual se afirma que as despesas da arquidiocese eram menores do que de fato são", diz o promotor Chegury.
O esquema contava ainda com a ajuda de funcionários da arquidiocese que providenciavam falsa documentação para dar respaldo aos desvios.
"Consta que Darcivan da Conceição, em declarações dele próprio aos promotores de Justiça, seria o contador da Cúria e conhece os problemas ligados à regularidade dessas finanças e, mesmo tendo a plena ciência de incoerências, aprovava essas contas anualmente", afirma o juiz Samuel.
"Nelas [as contas], Darcivan disse por várias vezes que o resultado contábil alcançava saldo positivo --ou seja, os documentos apontavam sobras de recursos na Cúria e em algumas paróquias--, mas que os responsáveis diziam que não tinham esse valor [estaria zerado]. Então, ele providenciava a documentação necessária para dar respaldo nas finanças [por meio de "declaração"], mesmo ciente que formalmente não tinha sido a realidade contábil", acrescenta o magistrado.
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