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Na Síria, Estado organizado e forte rede de apoio sustentam Bashar al-Assad no poder

Fabiana Nanô

Do UOL, em São Paulo

21/01/2012 06h00

Dos países que foram cenário das revoltas que ficaram conhecidas como Primavera Árabe, a Síria continua tendo presença constante nos noticiários por causa da violência. O presidente Bashar al-Assad, no entanto, segue aferrado ao poder, resistindo às pressões para que renuncie.

A situação na Síria é delicada – mais de 5.000 pessoas morreram, segundo a Organização das Nacões Unidas, que denuncia um estado de guerra civil. Depois da queda dos regimes ditatoriais na Tunísia, Egito e Líbia, especialistas ouvidos pelo UOL consideram a Síria a 'bola da vez', mesmo reconhecendo a força de Assad.

“Mais cedo ou mais tarde haverá uma mudança, que seja por meio de uma transição negociada ou com a derrubada do presidente Bashar al Assad”, acredita Danny Zahreddine, chefe do Departamento de Relações Internacionais da PUC (Pontifícia Universidade Católica) Minas.

Segundo ele, um dos motivos pelo qual Assad se mantém no poder reside na “forte rede de apoio em torno dele”. Assad herdou o regime de seu pai, Hafez, que deu um golpe de Estado em 1971 e governou a Síria até a sua morte, em 2000. Quando Bashar assumiu, havia esperança de que ele implementasse reformas. “Mas ele não conseguiu, devido a essa forte rede que sustentava o governo de seu pai e é contrária a avanços”, explica Zahreddine.

O diretor de Relações Internacionais do Instituto de Cultura Árabe (Icarabe), Murched Taha, também ressalta que o Estado na Síria é altamente organizado, com Forças Armadas e uma elite minoritária que controla a maior parte da economia do país. Nesse ponto, a Síria difere das outras nações árabes.

“Na Líbia, por exemplo, [o ex-ditador Muammar] Gaddafi desestruturou o Estado. No Egito, havia um Estado, mas o ex-presidente [Hosni Mubarak] estava desgastado. Assad, ao contrário, é representante de um Estado altamente organizado e dirigido por uma minoria, que se define pelo poder aquisitivo e o domínio das Forças Armadas”, explica o diretor.

Assim, o fato de Assad pertencer à minoria étnico-religiosa alauita não influencia para que se mantenha no poder – os alauitas são 1 milhão em uma população de 22 milhões de habitantes, formada em sua maioria por sunitas. “O núcleo do governo é formado por sunitas, cristãos, drusos. Não é uma questão étnica ou religiosa, mas econômica”, diz Taha.

Essa minoria colocou Bashar no poder, mas não para mudanças. “Se fosse só ele, talvez houvesse algumas reformas. Mas não depende só dele. Ele não tem esse poder”.

Influências externas

Embora exista pressão da comunidade internacional sobre uma intervenção militar na Síria, nenhuma medida foi tomada nesse sentido – o país está há dez meses em ebulição.

As potências ocidentais hesitam em tomar qualquer decisão, em parte devido à localização geográfica da Síria. Zahreddine explica que o país “está geograficamente próximo ao Irã, e esse fato, junto a uma incapacidade de ver claramente que governo entraria no poder em uma eventual queda de Assad, limita a ação da ONU”.

Ou seja, um novo governo pode ou não estar mais próximo do Irã, país cuja maioria da população é xiita e que faz oposição à influência das potências ocidentais no Oriente Médio.

Por outro lado, a Síria divide a fronteira sul com Israel – um território fértil conhecido como Colinas de Golã. Dois terços das Colinas estão ocupados por Israel desde a década de 1960, embora o território seja sírio.

“Para as potências ocidentais não interessa uma mudança na Síria por causa da fronteira norte de Israel”, afirma Taha. Um novo governo pode reivindicar o território. “Não haverá intervenção, a não ser quando essas potências sentirem que o poder está para desmoronar”, acredita.

Zahreddine também lembra que a Síria é um país com grandes recursos hídricos, em uma região onde é grande a disputa pela água. “Passam pela Síria dois rios importantes, o Eufrates e o Orontes. As empresas de água mineral são nacionalizadas, e esses grupos não vão romper com o governo”.

Mesmo com todos os obstáculos apontados, os dois especialistas têm a mesma opinião sobre o futuro da Síria. “Eu acredito que [Assad] vai cair”, diz Zahreddine. Para Taha, ninguém consegue barrar a revolta popular. “É como uma represa cujo dique se rompe. A Primavera Árabe vai atingir todos os ditadores da região.”