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Neto nº 114, pianista Ignacio Hurban até tocou em eventos das Avós da Praça de Maio

Gabriela Grosskopf Antunes

Do "Clarín"

06/08/2014 09h47

Durante mais de 36 anos Estela de Carlotto, esteve buscando “Guido Carlotto”, nascido enquanto sua filha Laura estava detida pela ditadura argentina. Carlotto se tornou um símbolo das avós que nunca tiveram a chance de cuidar de seus netos. À frente das “Avós da Praça de Maio”, Estela restituiu a identidade de 113 netos. O neto 114 era Ignacio Hurban, pianista, seu neto.

Um pianista de 36 anos, casado, da cidade de Olavarría, uma cidade na província de Buenos Aires com pouco mais de 100 mil habitantes, Guido Carlotto, viveu sua vida até o dia 5 de agosto como Ignacio Urban.

Músico de jazz e tango, conhecido em sua comunidade, Hurban chegou a tocar em um dos eventos organizados pelas Avós de Maio – dos muitos que organizavam para promover os exames de DNA com o objetivo de encontrar crianças desaparecidas durante a ditadura – sem saber que era o neto extraviado da presidente da instituição.

Deixou Olavarria aos 14 anos em direção a Buenos Aires para seguir sua vocação de músico, segundo informou a agência estatal de notícias Telám.

Chegou a celebrar em sua conta de Twitter a identificação do neto 106 “as melhores coisas da vida não são coisas, neto 106” escreveu dois anos atrás sem saber que ele mesmo seria o número 114, o neto de uma mulher que se tornou emblemática na luta pela restituição de identidade dos filhos e netos desaparecidos durante a ditadura argentina.

Atualmente, Hurban é professor de música, compositor, tem vários discos e prêmios como músico como ele mesmo descreve em seu site.

 
Laura Carlotto estava grávida de pouco mais de três meses quando foi sequestrada por agentes da ditadura em 1977. Segundo companheiras de cela, foi mantida viva até o nascimento de seu filho. Os restos mortais de Laura foram identificados pela família em 1978,  e desde então Estela buscava seu neto.
 
Em uma de suas entrevistas recentes Estela de Carlotto chegou a dizer que um dos seus maiores medos seria falecer sem abraçar seu neto. 
 
Esperança, persistência e determinação

Estella, que já foi a aposta argentina a um Nobel da Paz, se reunia em confeitarias da cidade com outras avós, em plena ditadura. Simulavam ser plácidas velhinhas em um chá da tarde para unir forças na busca por seus netos.

Com o tempo, foram se organizando, conseguindo espaço na imprensa e buscando ajuda internacional. Com o fim da ditadura, esse grito ganhou o mundo.

“Nascemos de uma convocação individual feita por uma ditadura feroz que adotou o sequestro de pessoas como método para calá-las, e arrebatou nossos filhos e os filhos dos nossos filhos”, escreveram as avós em um livro que conta suas historias.

Do desespero da dúvida nasceu também uma das mais interessantes parcerias da história da ciência moderna. A persistência das avós e a precisão da Associação Americana para o Avanço da Ciência em Washington e do Blood Center de Nova York deram à luz o “índice de abuelidad”, que permitia identificar a ascendência dos netos com mais de 99% de eficácia. Esse método antecedeu ao que hoje conhecemos como o procedimento de identificação por DNA.