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Em desenhos escolares, crianças venezuelanas relatam fome e sonham com pizza e lasanha

Carlos Jasso/Reuters
Imagem: Carlos Jasso/Reuters

Do UOL, em São Paulo

27/07/2016 15h03

Professores da escola Padre Jose Maria Velaz, em Caracas, Venezuela, pediram que os alunos desenhassem ou descrevessem suas refeições depois que algumas crianças desmaiaram de fome. As respostas chocaram a instituição de ensino católica, que funciona em um bairro pobre da capital. Alguns dos 478 alunos do jardim de infância e primário não tomam café da manhã, e pulam outras refeições ao longo do dia.

Segundo informações da agência de notícias Reuters, estudantes registraram terem se alimentado apenas de pão, mandioca ou arepa, uma massa feita de farinha de milho, ao longo de todo o dia.

Os desenhos e textos são um sintoma da profunda crise econômica que atinge a Venezuela. O país sul-americano está em recessão desde o início de 2014 devido à queda nos preços globais do petróleo e sofre com a inflação mais alta do mundo.

O resultado é a escassez de produtos básicos, como leite e medicamentos. Filas nas portas das farmácias se tornaram rotina, assim como moradores famintos pegando manga, coco e mamão diretamente das árvores.

Crianças fazem desenhos sobre a fome na Venezuela - Carlos Jasso/Reuters - Carlos Jasso/Reuters
Em desenho, criança diz não ter comido nada no café da manhã e estar com fome
Imagem: Carlos Jasso/Reuters

Um dos alunos da Padre Jose disse ter comido apenas manga e banana em uma de suas refeições. Outro relatou arroz e feijão. Um terceiro, disse não ter tido nada para comer no café da manhã: "Estamos à espera de alimentos". "Eu tenho macarrão e presunto para o almoço. Estou com fome", acrescentou.

Um estudante disse que a pizza era o seu prato favorito, mas que havia comido apenas "bolo de milho com queijo no café da manhã, espaguete com ovo no almoço e um bolinho no jantar." Sem ter comido nada no café da manhã, outro disse gostar de "lasanha e torta."

Segundo a diretora da escola, Maria Hidalgo, uma em cada quatro crianças não comem de forma adequada. "É dramático o que estamos passando", disse.

Crianças fazem desenhos sobre a fome na Venezuela - Carlos Jasso/Reuters - Carlos Jasso/Reuters
Aluno faz um "X" nas refeições em que não teve nenhum tipo de alimento para comer
Imagem: Carlos Jasso/Reuters

Governo nega desabastecimento

Os opositores do governo dizem que a crise da Venezuela é culpa das políticas econômicas do presidente Nicolas Maduro e de seu predecessor, Hugo Chávez. Por seu lado, o governo diz que é vítima de uma "guerra econômica" liderada pela oposição, empresários e pelos Estados Unidos.

Alexis Marin, que dirige o programa de alimentação para as escolas públicas do país, disse que as crianças estavam recebendo suprimentos adequados. "Mesmo com toda a guerra econômica, não podiam destruir o programa de alimentação escolar", disse à televisão estatal.

Especialistas dizem que não há fome

A crise alimentar se aprofundou em 2016, são relatados mais casos de subnutrição e mais pessoas comem duas ou menos vezes por dia. Levantamento realizado em 2015 mostrou que 90% dos venezuelanos está comendo menos e com menor qualidade.

De acordo com a Fundação Bengoa, especialista nesta área, a desnutrição está entre 20% e 25%. Mas, segundo especialistas venezuelanos, a falta de alimentos no país não é grave como a que ocorreu na Etiópia nos anos 80 ou na Coreia do Norte em 1990.

A situação não se enquadra no que o Programa Alimentar Mundial das Nações Unidas define como uma escassez generalizada de alimentos: que pelo menos 20% das famílias sofram escassez severa; que a desnutrição seja de mais de 30% e que, ao dia, morram duas pessoas a cada 10 mil.

De acordo com instituto de pesquisa Datanalisis, 43% das famílias sofrem de escassez, mas apenas de produtos como arroz, farinha ou leite. Não há falta de frutas e verduras, que são produzidas de forma abundante no país.

Entenda por que falta comida na Venezuela

New York Times