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Peluso decide não antecipar votos do mensalão e se despede do Supremo

O ministro Cezar Peluso se aposenta compulsoriamente na próxima segunda-feira (3); nesta quinta-feira (30) ele estará no julgamento do mensalão pela última vez  - Roberto Jayme/UOL
O ministro Cezar Peluso se aposenta compulsoriamente na próxima segunda-feira (3); nesta quinta-feira (30) ele estará no julgamento do mensalão pela última vez Imagem: Roberto Jayme/UOL

Do UOL, em Brasília

29/08/2012 15h46Atualizada em 29/08/2012 21h50

O ministro Cezar Peluso decidiu nesta quarta-feira (29) não antecipar os votos sobre os réus do mensalão que ainda não foram julgados pelos ministros que o antecederam no julgamento realizado no Supremo Tribunal Federal (STF). Como Peluso se aposentará compulsoriamente na próxima segunda-feira --quando completa 70 anos, idade limite para a magistratura-- ele só teve tempo de votar sobre os réus João Paulo Cunha, Marcos Valério, Ramon Hollerbach, Cristiano Paz e Henrique Pizzolato.

De acordo com o chamado "voto fatiado", os ministros estão votando apenas sobre um dos itens da denúncia da Procuradoria Geral da Republica, que diz respeito aos supostos desvios de verba na Câmara dos Deputados e no Banco do Brasil.

Após apresentar seu voto parcial, condenando os réus pela maioria dos crimes, Peluso disse que "não condena ninguém por ódio". "Hoje sou o juiz de carreira mais velho em atividade no Brasil, com mais de 45 anos. Nenhum juiz verdadeiramente digno de sua vocação condena ninguém por ódio. Nada mais me constrange do que condenar um réu em matéria penal."

Em seguida, o presidente da Corte, ministro Ayres Britto, emocionou-se ao despedir-se de Peluso. "Vossa excelência é a encarnação do seu próprio discurso. (...) Vossa excelência faz o que prega, e me parece que autenticidade é exatamente isso: no encurtamento da distância entre o que se teoriza e o que se pratica”, acrescentou Britto.

Presente no plenário, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, também homenageou Peluso. “[Peluso] soube dar ao efêmero a densidade do eterno”, disse.

O decano da Suprema Corte, ministro Celso de Mello, sucedeu o procurador. "Os grandes ministros do Supremo Tribunal Federal, como o iminente ministro Cesar Peluso, não partem jamais", afirmou, qualificando o ministro como seu "modelo de magistrado."

Por fim, o advogado e ex-ministro Márcio Thomaz Bastos, que defende o réu José Roberto Salgado no julgamento do mensalão, pediu a palavra e homenageou Peluso, dizendo que a função de ministro do STF deveria ser vitalícia. Bastos pediu um intervalo de alguns minutos para que o ministro pudesse ser cumprimentado pelos colegas de Corte e pelos advogados presentes nos plenário. 

O presidente da casa aceitou o pedido e suspendeu a sessão por 30 minutos.

Especulações

A aposentadoria de Peluso durante o julgamento gerou dúvidas. Especulou-se que o ministro pediria para votar integralmente sobre todos os 37 réus --o que contraria uma regra geral da Casa, de expor o entendimento antes do relator e do revisor. Advogados apontaram que, caso ele tomasse a decisão, haveria espaço para questionamentos.

O ministro fez questão de manter o mistério sobre o seu voto até a véspera: “Amanhã vocês verão. Não estraguem a surpresa", disse o magistrado ontem nos corredores do Supremo.

Sobre o fato de o julgamento terminar com alguns réus tendo a condenação de Peluso e outros, não, o advogado criminalista Thiago Gomes Anastácio --que acompanhou na redação do UOL a sessão do STF desta quarta-feira-- explicou que não há controvérsia. "Com o fatiamento, foram criados pequenos julgamentos, uns independentes dos outros. E o que importa na condenação é o voto mínimo, de seis ministros", afirmou. 

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  • Arte UOL

Após a saída do ministro, há o risco de haver empate entre os dez ministros restantes --se isso ocorrer, o presidente da Casa pode votar duas vezes, por meio de um voto de desempate, ou, de acordo com advogados, o empate deve favorecer os réus. "Na dúvida, deve-se absolver, não há discussão", resumiu Anastácio.

A saída de Peluso não afetará o curso do processo, explicam especialistas ouvidos pelo UOL. Pelo regimento interno do STF, o quórum mínimo para votações em plenário é de seis ministros. E, mesmo que haja a nomeação de alguém para a vaga, esse novo ministro não poderá julgar o processo do mensalão por não ter participado das outras fases do caso.

A escolha de um novo ministro fica a cargo exclusivamente da presidente Dilma Rousseff, que não tem um prazo delimitado para fazê-lo. Segundo a Constituição, ela pode escolher quem ela quiser desde que a pessoa tenha mais de 35 anos e possua “notório saber jurídico”. Depois, o nome precisa ser aprovado pela maioria absoluta do plenário do Senado –porém, este procedimento é considerado uma mera formalidade.

Quem decide em caso de empate no STF? Advogado explica

Entenda o mensalão

O caso do mensalão, denunciado em 2005, foi o maior escândalo do primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. O processo tem 38 réus --um deles, contudo, foi excluído do julgamento no STF, o que fez o número cair para 37—e, entre eles, há membros da alta cúpula do PT, como o ex-ministro José Dirceu (Casa Civil). No total, foram denunciados 14 políticos, entre ex-ministros, dirigentes de partido e antigos e atuais deputados federais.

O grupo é acusado de ter mantido um suposto esquema de desvio de verba pública e pagamento de propina a parlamentares em troca de apoio ao governo Lula. O esquema seria operado pelo empresário Marcos Valério, que tinha contratos de publicidade com o governo federal e usaria suas empresas para desviar recursos dos cofres públicos. Segundo a Procuradoria, o Banco Rural alimentou o esquema com empréstimos fraudulentos.

O tribunal analisa acusações relacionadas a sete crimes diferentes: formação de quadrilha, lavagem ou ocultação de dinheiro, corrupção ativa, corrupção passiva, peculato, evasão de divisas e gestão fraudulenta.

Entenda o dia a dia do julgamento