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'Fui o único condenado', diz legista responsável por reviravolta no caso da morte de PC Farias

Carlos Madeiro

Do UOL, em Maceió

05/05/2013 06h00

Principal responsável pela reviravolta das investigações da morte do empresário Paulo César Farias e sua namorada, Suzana Marcolino, em junho de 1996, o médico-legista George Sanguinetti diz que até agora foi o único condenado. Em 2000, ele foi sentenciado a dois anos de prisão por ter alegado que o laudo inicial para a causa das mortes teria sido comprado por R$ 400 mil.

"Entre todas as condecorações, essa [condenação] é a que mais dou valor. Dezessete anos após o crime, fui o único condenado, e os acusados estão livres", afirmou Sanguinetti ao UOL, sem esconder a frustração por ter ficado de fora do julgamento dos quatro acusados pelas mortes, que começa nessa segunda-feira (6), em Maceió.

O coronel e professor de medicina legal aposentado também insinua que sua exclusão apontaria para uma falta de interesse em condenar os "verdadeiros culpados" pelo crime, que não estariam sequer apontados na denúncia. Como não foi perito oficial, ele teria de ser convocado como testemunha --o que poderia ser feita pelo MPE (Ministério Público Estadual) ou pela defesa, o que não ocorreu.

Serão julgados os policiais militares Adeildo Costa dos Santos, Reinaldo Correia de Lima Filho, Josemar Faustino dos Santos e José Geraldo da Silva. O júri popular será comandado pelo juiz Maurício Breda, da 8ª Vara Criminal da Capital. A acusação, porém, não traz nomes de autores material e intelectual e acusa os seguranças por "omissão dolosa."

Questionado o que teria levado a sua "exclusão" do caso, Sanguinetti tem uma resposta simples: "Isso é Alagoas. Sem dúvida eu poderia contribuir muito com o caso, dando toda essa explicação que fiz, mas infelizmente não me chamaram. Não há interesse em aprofundar a discussão e condenar os réus", disse o legista, que mora em Maceió, mas vive cercado de seguranças.

O legista foi considerado peça-chave nos questionamentos à perícia oficial do caso PC Farias e conviveu anos com as ameaças de morte. Em 1998, ele ganhou o prêmio Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro, pela obra “A Morte de PC Farias: O Dossiê de Sanguinetti”.

Depois da fama nacional, foi chamado para atuar em casos policiais relevantes, como o da menina Isabella e do goleiro Bruno. Até hoje diz que se sente um "arquivo vivo" e trabalha com consultorias. "Se estou vivo ainda, devo à imprensa", alegou.

Insistência na fraude

Coronel da PM de Alagoas em 1996, Sanguinetti passou a ser o ponto de discordância da investigação policial, que apontava para crime passional seguido de suicídio. Polêmico, o legista deu várias entrevistas questionando a tese oficial, com base nas imagens feitas da cena do crime.

De tanto insistir, acabou autorizado pelo juiz Alberto Jorge Correia a produzir um laudo, em 1997, a pedido do MPE, no qual apontou várias contradições --o que resultou num pedido oficial de nova perícia, que mudou a versão para duplo assassinato.

"Há vários pontos claros na investigação. Suzana tinha marcas no pescoço. Alguém a segurou e a executou quando ela estava em pé. E Paulo César também não foi morto naquele local. Ele foi colocado ali forjadamente e ainda teve o corpo lavado, para tirar o sangue", defendeu o legista.

Outro ponto questionado por Sanguinetti é que, segundo os laudos, Paulo César Farias ainda estava com comida não digerida no estômago, enquanto Suzana apresentava o estômago completamente vazio. Portanto, os dois não estariam juntos momentos antes do crime.

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Lugar errado, na hora errada

Para o médico-legista, o crime teve interesse "político-econômico", já que PC Farias iria depor, quatro dias depois de sua morte, na CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) das Empreiteiras.

"Ele estaria falando demais. As autoridades alagoanas trabalharam para tornar o caso um crime passional, mas não foi. Ele morreu porque era um arquivo vivo. O caminho percorrido pelos que tramaram está nos autos. Não precisa ir longe. Suzana foi uma coadjuvante, estava no lugar errado, na hora errada", disse, sem citar quem seria o mandante.

Ausência justificada

Sobre a ausência de Sanguinetti no júri, o promotor Marcus Mousinho disse: "Ele não fez parte de nenhuma das perícias, não examinou nenhum de cadáveres ou local do crime. Analisou de forma inoficiosa, diante de algumas dúvidas que a promotoria tinha e pediu para que ele confeccionasse um laudo contestando a primeira perícia”.

“Quando ele fez esse laudo, o MPE não se sentiu esclarecido, e foi pedido que fosse designada uma segunda equipe de perícia. Por isso que não está sendo chamado", afirmou Mourinho. Dois dos quatro peritos oficiais foram convocados e vão depor no júri.

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