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Leia a transcrição da entrevista de Delcídio do Amaral ao UOL

Do UOL, Em Brasília

12/06/2015 06h00

Delcídio do Amaral (PT-MS), líder do governo no Senado, participou do Poder e Política, programa do UOL conduzido pelo jornalista Fernando Rodrigues. A gravação ocorreu em 11.jun.2015 no estúdio do UOL, em Brasília.

 

 

Narração de abertura [EM OFF]:

Delcídio do Amaral Gómez tem 60 anos. Saiu do seu Estado, Mato Grosso do Sul, ainda jovem para estudar em São Paulo. Formou-se em engenharia elétrica e, aos 28 anos, foi engenheiro-chefe da construção da Usina Hidrelétrica de Tucuruí, no Pará. Em seguida, trabalhou por dois anos na Holanda como diretor da Shell.

De volta ao Brasil, assumiu a diretoria da Eletrosul, em 1991. Em 1994, foi nomeado ministro de Minas e Energia, no final do governo Itamar Franco.

Delcídio também participou do governo de Fernando Henrique Cardoso. diretor de Gás e Energia da Petrobras de 2000 a 2001, quando eclodiu a crise do “apagão”.

Ex-tucano, Delcídio filiou-se ao PT em 2001. Assumiu a secretaria de Infraestrutura e Habitação do Mato Grosso do Sul no governo de Zeca do PT e, em 2002, elegeu-se senador. Em 2010, foi reeleito para mais um mandato.

Delcídio tentou 2 vezes ser governador do Mato Grosso do Sul. Em 2006 perdeu no primeiro turno para André Puccinelli, do PMDB. E, em 2014, foi derrotado no segundo turno para Reinaldo Azambuja, do PSDB.

Delcídio preside a Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. Em abril de 2015, foi nomeado pela presidente Dilma Rousseff líder do governo no Senado.

UOL [OFF]:Olá. Bem-vindo ao “Poder e Política - Entrevista”. O programa é uma realização do portal UOL. Esta gravação é realizada no estúdio do UOL, em Brasília. E o entrevistado desta edição do “Poder e Política” é o senador Delcídio do Amaral, pelo PT do Mato Grosso do Sul, líder do governo no Senado.

Senador Delcídio, tudo bem?
Graças a Deus. Tudo bem, Fernando. É uma satisfação muito grande estar aqui conversando com você. E, principalmente, no UOL.

45 dias de líder do governo, 1 mês e meio.
Nem 45 dias, viu.

Que balanço o sr. faz desse período?
Dificílimo. Porque o governo ainda não consolidou uma base no Senado. Cada votação tem uma história diferente.

Se fosse só no Senado estava bom.
É. Também na Câmara. E temas muito difíceis. Temas relativos a essas MPs que foram aprovadas. Um quadro conturbado sob o ponto de vista econômico também. Uma série de preocupações dos desdobramentos, não só das medidas do governo, mas também com a economia, com os impactos sociais. Portanto, foi pouco menos de um mês, mas dias extremamente difíceis e que eu fiquei virando dia e noite.

A presidente Dilma Rousseff nomeou o vice-presidente da República, Michel Temer, para coordenar a articulação política do Palácio do Planalto. Nos últimos dias houve um movimento de um setor do PT, houve uma ação explícita do ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, que foi entendida como uma ação para retirar uma parte do poder de Michel Temer nessa missão. Qual é a sua avaliação sobre esse episódio?
Eu acho que, primeiro eu conversei com o presidente Michel. Conversei com o ministro Aloizio Mercadante. Na verdade é o seguinte, a intenção não é, de forma nenhuma, afastar o presidente Michel da coordenação política. Essa é uma delegação que foi dada pela presidenta da República, no meu ponto de vista, a presidenta agiu corretamente. Porque o presidente Michel é um bom articulador, é um homem sereno, equilibrado. Os resultados na Câmara e no Senado são inquestionáveis.

Mas houve um movimento.
O que é que há hoje, Fernando? Por que essa discussão? Talvez essa discussão não foi bem colocada e por isso é que gerou essas distorções. Na verdade, a articulação política não envolve só esse trabalho junto aos líderes, juntos às bancadas nas votações. A coordenação política também, que está diretamente vinculada às atividades da SRI [Secretaria de Relações Institucionais], ela inclui o acompanhamento de Plenário, inclui o acompanhamento dos trabalhos das comissões, ela, no dia a dia, recebe parlamentares, trata de questões dos Estados, de emendas parlamentares. O meu entendimento é que o ministro Aloizio Mercadante tem uma preocupação com esse dia a dia das Relações Institucionais.

Alguém teria que preencher esse cargo formalmente?
Mas não no sentido de querer afastar o presidente Michel Temer, nada disso. E eu tenho sentido que entre os dois há uma harmonia grande.

É importante, então, que seja preenchido formalmente o cargo da Secretaria de Relações Institucionais? Só para dizer, ela era ocupada por Pepe Vargas, por um período, ministro do governo Dilma. Ele saiu, ficou vago e daí Michel Temer herdou essa função como vice-presidente da República. Mas a função de ministro da Secretaria de Relações Institucionais está vaga. O sr. acha que tem que ser preenchido isso?
Não. Eu acho que uma das sugestões que foram apresentadas nessa discussão, eu acompanhei algumas delas, era que o ministro [Eliseu] Padilha assumisse a coordenação. Ele não quis. Agora, palavras do ministro Padilha para mim: que ele tem ficado muito mais tempo lá na SRI do que propriamente no Ministério da Aviação Civil. E, segundo o ministro Padilha, ele está muito seguro que mesmo ele respondendo pela SRI, ajudando o vice-presidente Michel Temer, ele tem condições de atender as demandas dos parlamentares. A gente tem que dar esse voto de confiança. E acho que a presidenta Dilma fez um movimento correto. Não podia nomear, por exemplo, o presidente Michel como ministro da coordenação política, porque fica até uma coisa ruim de se administrar politicamente.

Deixa eu entender. Já está debelado isso e, portanto, vai continuar vaga essa função.
Continua e o ministro Padilha exerce essa função junto com a Aviação Civil.

Exerce de fato sem ser nomeado.
Exatamente. É de fato, mas não é de direito.

Falta um projeto muito importante do ajuste fiscal para ser aprovado no Congresso. Que é o projeto de lei que revê a política de desoneração da folha de pagamento das empresas. Como deve ser a conclusão dessa votação, que ainda está na Câmara, no seu entender?
Primeiro, o seguinte. O Senado ainda não... Ontem foi a primeira reunião, Fernando, dos senadores, dos líderes, com o presidente Michel e com os líderes deles na Câmara para discutir desoneração. Nós ficamos fora dessa discussão. Acho que foi um iniciativa correta do presidente Michel no sentido de incluir os senadores nesse debate para não acontecer o que aconteceu na [MP] 668.

Explica o que é a 668 para todo mundo entender.
A 668 é uma medida provisória importante, que compõe todo um elenco de MPs que foram encaminhadas. A 664, que trata especificamente de questões trabalhistas, de disfunções, melhor dizendo.

No caso da 668, que ponto específico o sr. estava se referindo?
A 668, o que é que efetivamente existe? Quando nós aprovamos a medida provisória 668, detectamos que existiam jabutis, que é como é a gente chama...

Emendas.
Ou seja, emendas ou contrabandos de temas no seio da medida provisória e nós inclusive aprovamos 3 medidas provisória numa só semana. Uma coisa impossível. Eu estou no Senado há algum tempo. Eu nunca vi o Senado aprovar 3 medidas provisórias numa semana só. E o que é que os senadores reclamaram: “mas nós não temos nem condições de discutir”. Quer dizer, as coisas são tratadas na Câmara e nós não podemos mudar nada porque se voltar para a Câmara atrasa a tramitação e caduca a medida provisória.

Quais os jabutis da 668?
Várias. Os vários jabutis.

Os dois ou três principais.
Uma, veio a questão do Refis, que está sendo discutido agora.

O Refis que é o refinanciamento de dívidas que as empresas têm com o governo.
Isso. Outra questão também é a das igrejas.

Que são impostos devidos pelas igrejas, ou taxas não recolhidas.
Cooperativas de leite. Uma espécie de encontro de contas com o BNDES. De créditos e débitos, que nós estamos checando. A questão do Parlashopping. Que foi um outro jabuti que foi muito polêmico nessas discussões todas. Os senadores estão juntos com os deputados na desoneração para, se aprovar na Câmara, no Senado a desoneração não virar uma novidade. Então os senadores já estão trabalhando junto com os deputados para que a gente não tenha dificuldades depois.

Posso entender que esse projeto de lei da desoneração da folha de pagamentos na Câmara o governo já está entendendo que será impossível aprová-lo tal como foi enviado para o Congresso?
Na verdade a intenção do governo, Fernando, era aprovar na íntegra o projeto que foi encaminhado. Mas, evidentemente, você sabe muito bem, esse é um processo complicadoenvolvendo segmentos importantes da economia. E, evidentemente, acho que as tratativas da Câmara avançaram muito. O governo inclusive tentou fazer uma composição entre os jabutis da 668, da medida provisória, com a desoneração.

Ou seja, dizendo, a presidente sanciona a medida provisória 668 tal como está em troca do projeto.
Isso. Os pouquíssimos vetos mantendo os jabutis principais, vamos dizer assim...

Em troca da Câmara e do Senado aprovarem o projeto de lei da desonerações sem mudanças.
Exatamente. Porque ele tem um impacto muito forte.

Mas eu entendo que isso já ficou vencido.
Ficou vencido. Então, nas negociações surgiu o segmento de comunicação, a questão dos callcenters, surgiu também a questão dos transportes. Acho que uma coisa coerente, razoável, era eventualmente se algum setor vier a receber um tratamento diferenciado, que fosse alinhado com a medida provisória das desonerações lá de 2011. Como não foi possível, em função até das negociações na Câmara,  o governo de certa maneira agora já compreende que o texto não vai ser exatamente aquilo que se esperava com relação às desonerações.

E dessa forma haverá mais vetos portanto, na 668?
Muito possivelmente. Até em função do impasse. Hoje mesmo eu conversei muito com o ministro Levy [Fazenda] e ele foi ao encontro do presidente da Câmara exatamente para discutir essas questões.

O sr. hoje, nesta quinta-feira, conversou com o ministro Joaquim Levy logo cedo. O que a equipe econômica diz é que se o possível de desoneração da folha de pagamento sofrer muitas alterações, será necessário não só vetar itens das MPs, mas também elevar alguma taxa, imposto ou contribuição, o que seja, para compensar. O ministro tocou nesse assunto com o sr.?
Não. Ele tem a expectativa que o governo tenha êxito nas duas Casas. Tanto na Câmara, como no Senado. Evidentemente, ele talvez não consiga dentro das negociações alcançar o valor inicial, o valor previsto. Mas o ministro Levy entende isso\. Porque ele é um ministro da Fazenda, mas ele é um ministro político também. Então, o Congresso que recebe de certa maneira. Quer dizer, os parlamentares, em contato com as bases, tendem a aperfeiçoar as medidas provisórias em função das demandas que eles sentem no dia a dia da política. Nos seus Estados, nas suas cidades. E o ministro Levy vai compreender muito bem isso.

Mas veja só. Se por acaso o projeto das desonerações realmente for desidratado, que é a tendência pelo que se percebe...
Mas não desidratado de uma forma... O que vai ser proposto? Existem duas alternativas. Uma, que você caminharia para o fim da desoneração gradativamente, terminando o ano que vem. Agora, caminha para você ter uma alíquota intermediária para determinados setores. Isso vai causar um impacto naqueles números que se previa inicialmente. Mas não que prejudique ou que, de certa maneira, esfacele o ajuste fiscal e as desonerações. Como aconteceu com as outras MPs também.

Mas o ministro tem dito que talvez seja necessário aumentar algum tipo de imposto no caso de haver uma perda na votação desses projetos.
Por enquanto, nós temos trabalhado nesses ajustes, mas sem falar em aumento de imposto. Pelo menos esse é o critério que o governo está seguindo até agora. Por tudo que representa mais aumento de carga tributária. Então, vai depender muito do balanço desses números para que a gente faça uma avaliação daquilo que falta ainda para o ajuste fiscal, daquilo que compromete, eventualmente, o superávit previsto. Eu acho que é por aí. E, só pegando uma carona na sua pergunta, acho que o Congresso mais a frente pode até cumprir um papel importante com relação a essa questão do superávit, ou talvez acomodar, adotar números mais compatíveis com esse esforço que todos nós estamos fazendo para colocar a economia do Brasil nos eixos.

Esse projeto da desoneração era para ter sido votado no dia 10 de junho, quarta-feira, mas foi adiado possivelmente para a próxima semana. A expectativa é votar de qualquer jeito semana que vem?
Semana que vem votar.

Na Câmara.
Nós pretendíamos ter votado ontem, na Câmara. Porque é uma questão importante. Esse projeto tem uma noventena. Então, se a gente conseguisse votar nessa semana, na semana que vem se fosse bem costurado o acordo, nós poderíamos votar no Senado. Ou levar uns 15 dias para votar no Senado. Quer dizer, nós terminaríamos a votação no final de junho. Como você tem uma noventena, você já poderia a partir de outubro, receber no caixa do Tesouro Nacional os reflexos da desoneração. Mas infelizmente, também por uma questão de cautela, foi melhor a gente adiar até para costurar melhor esse acordo.

Mas a chance de adiar de novo semana que vem já é menor.
Não. Acho que semana que vem vota. Não tenho dúvida nenhuma.

O que todo mundo fala é que nesse período a articulação política, o vice-presidente, Michel Temer, vai resolver as pendências de nomeações da base aliada que foram requeridas, enfim. Vai conversar para tentar construir uma maioria. É isso também?
Na verdade nessas discussões, e claro, eu compreendo isso muito bem, a responsabilidade do presidente Michel é essa. Nós temos uma base aliada. A base aliada tem que participar do governo. Então, dentro dessas discussões, o governo efetivamente está trazendo a base aliada para o Executivo. Para funções importantes também. E com isso, trabalhando no sentido de efetivamente consolidar uma base na Câmara e uma base no Senado. E importante também, trabalhando na questão das emendas parlamentares. Tem muitos restos a pagar de 2013, de 2014. E a gente sabe muito bem o que é que isso representa para os municípios.

Qual é o valor que poderia ser liberado desses restos a pagar nas próximas semanas?
A intenção é R$ 1 bilhão.

Em que período?
É num período relativamente curto. Nós já daríamos o start a partir desse mês e gradativamente chegando nessa valor de R$ 1 bilhão.

Mas R$ 1 bilhão em quanto tempo? Junho? Julho?
Depende muito, Fernando. Porque cada município é uma história. Então, por exemplo...

Estamos falando das emendas ao orçamento propostas por senadores e/ou deputado.
É. Mas nós não estamos falando ainda de 2015. Nós estamos falando de 2013, 2014. A documentação estando em ordem, os municípios comprovando a execução das obras, naturalmente, e dentro desse contingenciamento já foi colocado esse R$ 1 bilhão exatamente para atender esses restos a pagar. Isso é absolutamente fundamental e é outro fator que causa insatisfações dentro do Congresso.

Começa já em junho esse pagamento?
A ideia é começar já em junho.

O sr. é do PT. No passado, o PT chamaria pagamento de emendas, nomeações para cargos no executivo, de fisiologia. Isso é fisiologia?
Não. Eu não encaro isso. E uma coisa é você ser oposição. Aí quando você senta na cadeira...

Fisiologia muda de nome.
A história é diferente. Eu prefiro interpretar isso, se você tem uma base aliada, a base aliada, os partidos são responsáveis também pela administração do país e, portanto, cada partido tem que ter seus representantes que efetivamente têm que atender exigências de caráter técnico, gerencial. Respeitar a ficha limpa. Uma série de procedimentos que foram adotados, e ações que o próprio Congresso votou, que são extremamente relevantes. E não é novidade. Isso aqui não acontece só no Brasil. Acontece em todos os países.

A Câmara dos Deputados fez uma votação no atacado de muitos itens da chamada reforma política. Fim da reeleição, doação de empresas apenas para partidos, mandato de 5 anos para todos os cargos no Executivo, entre outros itens. Uma clausula de desempenho ou barreira, como queira, que flexibiliza em relação ao que se tem hoje. Porque vai ficar mais fácil para um partido ter representação, acesso ao fundo partidário e etc. Porque basta eleger um deputado. São várias medidas. Quais delas no Senado tendem a prosperar? Vamos lá. Fim da reeleição, próspera no Senado?
Fim da reeleição é possível.

Doação de empresas apenas para partidos, prospera?
Esse é um debate difícil. Porque há posições muito fortes no sentido de retomar a discussão de financiamento público de campanha. Então, não é um assunto pacífico. Eu acho que um tema que o Senado olharia com muito bons olhos, porque já votou inclusive, é a questão do fim das coligações nas eleições proporcionais.

É. Mas isso aí já foi rejeitado. A Câmara rejeitou.
Acho que essa seria uma medida utópica, mas com um efeito profilático grande. Eu quero ser muito sincero com você. Eu estou absolutamente pessimista com uma reforma política que, pelo menos a população brasileira aguardava, esperava ansiosamente, porque eu acho que essa votação da Câmara ela produziu pouquíssimo.

Essa cláusula de barreira ou desempenho, que obriga os partidos a eleger apenas um deputado federal, não importa onde, para ter acesso ao fundo partidário, TV e etc, essa medida deve passar no Senado? O sr. acha ou é muito ruim para a população?
Acho que é muito ruim. Muito ruim porque na verdade a intenção é você fortalecer partidos e não ter uma constelação de partidos de um deputado cada um. Você vê hoje em determinados partidos, tem às vezes um parlamentar que é líder e líder de si mesmo. Então, uma coisa dessas é surreal. E a ideia era você ter um número de partidos menores, partidos mais consistentes, com políticas muito bem definidas. E não partidos que na verdade funcionam quando vem eleição, negocia tempo de televisão, enfim.

Agora, o fim da reeleição. O presidente [do Senado], Renan Calheiros (PMDB-AL), já se pronunciou a favor, disse que o Senado deve aprovar. O sr. também está dizendo isso. A sua posição pessoa sobre o fim da reeleição?
Eu sou favorável ao fim da reeleição. Agora, com um mandato de 5 anos.

Que é o que a Câmara aprovou. Há um problema aí no mandato de 5 anos para todos os deputados, como a Câmara aprovou. Que vem a ser como resolver o mandato de senadores, porque mandato de senador no Brasil tem o dobro de anos do mandato de deputados, de vereadores, etc. Se todo mundo tem mandato de 4 anos, o senador tem de 8 anos. Se o mandato for para 5 anos para todos os cargos, como pede a Câmara, o mandato de senador ficaria só 5 anos ou teriam de ser 10? Como fazer?
Nós ainda não discutimos isso. Aliás, até porque na verdade nós estaríamos debatendo um tema, em tese, em causa própria. Nós não debatemos essa questão do Senado. Mas eu acho que os senadores têm que ter um tempo de mandato maior, porque o Senado é a casa revisora, o Senado é a casa da Federação. E acho que o papel dos senadores, o mandato mais longo, ele garante inclusive uma independência maior principalmente com relação aos temas federativos e os temas mais importantes para o crescimento do nosso país.

Esse fato de os senadores terem um mandato maior. Um mandato de 10 anos para um político hoje, no Brasil. Vamos admitir que na opinião pública talvez não vai pegar muito bem, dizer que um político será eleito para ficar 10 anos. Como isso está relacionado ao fim da reeleição e ao mandato de 5 anos, pode ser que nada acabe sendo aprovado nesse caso?
Aliás, essa é uma grande preocupação minha. Por que, Fernando? O que é que está acontecendo hoje no Congresso? As comissões permanentes e comissões especiais não estão cumprindo seu papel. Você faz requerimento para votar tudo na mesa, vai tudo para o plenário. Você não avalia, consistentemente, os prós e contras de cada tópico desses. E aí, com um discurso que aparentemente é muito bonito, “a casa da democracia, aqui nós resolvemos no voto”, nós estamos votando verdadeiros frankesteins. Porque você vai votando aos pedaços como as comissões permanentes. Os parlamentares não atuaram, não debateram, não discutiram intensivamente isso. Você tem aprovações pontuais que depois não se fecham. Portanto, para responder agora diretamente à sua pergunta, eu acho que sincronizar todas essas questões não será fácil.

E nesse caso, para não ficar pior do que já é, melhor é não votar?
Melhor não votar.

Porque algumas medidas boas como, por exemplo, o fim das coligações para eleições proporcionais que o Senado votou, a Câmara rejeitou. Que era uma medida pontual, como o sr. disse, teria um efeito profilático grande. Como essas medidas não passam, essas outras mais complexas que tendem a piorar o modelo, melhor não votá-las.
É melhor. Para piorar o que já está aí, é melhor deixar do jeito que está. Lamentavelmente. Porque acho que a reforma política era um tema extremamente relevante para o parlamento. E acho que poderia melhorar muito a política no Brasil.

Vamos mudar de assunto agora. O PT realiza nesta semana, hoje quinta-feira, sexta e sábado, o seu 5º Congresso Nacional em Salvador, na Bahia. A direção da legenda tem se empenhado em minimizar, é verdade, as críticas que o partido faz, ou setores do partido, ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Só que tem representantes da CUT, que é ligada ao PT, tendências minoritárias, algumas nem tanto dentro do PT, que devem contestar no Congresso o ajuste fiscal, devem xingar o ministro Joaquim Levy. Como é que resolve isso?
Primeiro, uma das coisas que o PT tem é essa debate aberto. Aliás, o PT é um partido que se consolidou na contradição, no debate. Isso faz parte da história do PT. Como é que eu estou vendo isso para esse Congresso? Existe. As críticas vão surgir? Vão. Determinadas correntes do PT vão fazer críticas.

É que não são determinadas correntes tão minoritárias assim. Quando a gente vê o programa partidário do PT, num dia à noite, falando contra medidas do ajuste fiscal, com o próprio presidente Lula aparecendo na televisão e criticando a Câmara dos Deputados, no dia em que a Câmara dos Deputados ia votar uma medida do ajuste fiscal. O maior líder do PT é o presidente Lula. Ele incentivou as críticas de setores sindicalistas do partido. Muito difícil de resolver, porque não se trata de um minoritário, é uma pessoa que foi presidente da República, que é líder do PT. Lula errou nesse caso?
Eu acho que, apesar das críticas, as resoluções que vão surgir desse Congresso, o PT vai compreender bem. Vai sinalizar claramente o seu, apesar de divergir em vários pontos. Mas, apostar no sucesso do governo da presidenta Dilma. Não tem saída. O PT, é claro que você tem uma história de partido e uma história de governo, mas se o governo Dilma não caminhar bem, o projeto do PT também sai muito prejudicado. Então, a respeito das divergências, que eu volto a repetir, podem ser muito sadias dependendo dos temas e do mérito dessas divergências, nós não podemos dissociar, depois de tudo que nós passamos e temos passado, essas medidas provisórias. Essa pauta difícil, árida, que nós enfrentamos ao longo dos últimos meses. Nós não podemos, como se diz lá no Pantanal, virar o cocho agora. Então, a despeito das divergências, o resultado desse Congresso do PT é uma sinalização clara que o PT vai ajudar a presidenta Dilma a levar o governo na forma como todos nós esperamos, como todos os brasileiros aguardam.

Mas senador Delcídio, nas últimas semanas ,quando se discutiu o ajuste fiscal, a direção nacional do PT, o ex-presidente Lula, que é o líder maior do PT, acertaram com o discurso que fizeram criticando parte do ajuste?
Eu acho que o presidente Lula, ele é a maior liderança do PT e é um militante, uma pessoa ouvida. Ele tem absoluta convicção, ele pode , eventualmente, como alguns setores do PT, divergir de medidas que foram adotadas pelo governo. Mas mesmo na divergência eles entendem que nós precisamos marchar juntos, porque o nosso projeto passa por um bom governo Dilma, apesar das dificuldades que nós estamos enfrentando.

O sr. evita dizer que houve um erro da direção ao ter atacado tanto certas medidas do ajuste fiscal?
Não. Eu acho que isso você convive, isso você vivencia no próprio parlamento. Na nossa bancada mesmo do PT, nós passamos agora nas votações, inclusive, situações difíceis. Às vezes, por exemplo, você tem lideranças do partido que tem. Vou dar um exemplo que você conhece bem. O senador [Paulo] Paim (PT-RS). O senador Paim se colocou frontalmente contra algumas medidas porque tem uma história...

O senador Paulo Paim, do PT do Rio Grande do Sul.
Paulo Paim do Rio Grande do Sul. É um grande senador da República. Ele, por exemplo, no caso da 665, assumiu uma posição crítica com relação a abono salarial. Essas divergências existem no PT e nós aprendemos a conviver com essas divergências. As divergências sendo salutares, ajudam não só o PT, mas ajudam o governo também.

Falta muito, mas o ex-presidente Lula deve ser considerado candidato quase certo do PT a presidente em 2018?
Eu acho que todos nós entendemos que o PT, lançando candidato em 2018, o melhor candidato de todos, sem dúvida nenhuma, é o presidente Lula.

Senador Delcídio, quando o Senado vai instalar a CPI do Futebol? Instalar de fato. Ela já está criada.
Agora nós estamos passando pela liturgia da indicação de indicação dos senadores pelos partidos. Mas ela vai ser instalada rapidamente. Esse é um tema...

Esperava-se que fosse instalada nesta semana. Vai ser na próxima, na sua opinião?
Acho que a partir da semana que vem os partidos vão indicar os seus senadores.

Mas não instala?
Mas aí com a indicação dos senadores, definindo o presidente, já instala automaticamente a CPI.

O sr. acha que na semana que vem pode ter a primeira sessão já ou ainda não?
Não acredito ainda. Acho que não. Mas eu acho que até o final de junho essa CPI está instalada. Porque tem festa junina agora também, aí tem um período que o Congresso funciona na meia-bomba. Então, para ser mais seguro e mais realista, nesse mês de junho com certeza ela vai ser instalada.

O PT definiu quais dos seus integrantes da bancada no Senado devem compor a CPI do futebol?
Não. Ainda não. Nós não discutimos.

Tem pretendentes?
Ah, essa CPI o que tem de pretendente é brincadeira.

Por quê?
Porque é um tema muito popular, as pessoas compreendem bem. Você que acompanhou várias CPIs, determinados temas que CPIs tratam, são temas que a população, são temos complexos até para as pessoas que tem alguma ideia de determinadas empresas, de determinados estatais. Portanto, não é uma coisa que as pessoas compreendam facilmente. Até porque são temas muito específicos. Agora, futebol, o pessoal vai discutir essa CPI em boteco, no trabalho, dentro de ônibus, no metrô, andando, passeando, conversando com amigos.

É diferente da CPI dos Precatórios que ninguém sabe o que é.
Que ninguém sabe o que é. Quer dizer, não sabiam, pelo menos na época.

Como tem as maiores bancadas, PMDB e PT no Senado têm o direito de indicar quem será presidente e relator, que são os dois cargos mais importantes da CPI do Futebol. CPI do Futebol que foi proposta pelo senador Romário, que é do PSB, um partido minoritário. O sr. enxerga o PT ou o PMDB cedendo esses dois cargos importantes para que o Romário ocupe um dos dois?
Eu sinto no PT essa intenção. Não conversei com o líder Eunício [Oliveira] (PMDB-CE) com relação ao PMDB. Mas sinto no líder Humberto [Costa] (PT-PE). Não vejo restrições a isso.

Você está dizendo que o PT abriria mão desse cargo importante, presidente ou relator na CPI do Futebol?
É. Até porque eu acho que talvez o senador mais emblemático nessa questão de futebol é o Romário (PSB-RJ). Por toda a história que ele tem.

Você está entendendo que o PT poderia.
Acho importante. É o condicional. O futuro do pretérito. Poderia. Mas não houve uma discussão na bancada do PT.

O sr. é do PT. O sr. acha seria boa essa solução?
Acho que nós precisamos fazer uma avaliação bem aprofundada com relação a esse tema. Vejo com uma simpatia grande a questão da indicação do Romário (PSB-RJ). Só queria registrar aí um sentimento. É uma percepção. Uma coisa muito pessoal. Essa CPI começou extremamente aquecida. Todo mundo era um alvoroço. Eu senti que de uns dias para cá ela arrefeceu um pouco.

Por quê?
É porque, como toda CPI, quando você cria a turma empolga, depois o pessoal começa a analisar melhor a gravidade dos temas, os desdobramentos. Aí o camarada naturalmente tira o pé do acelerador para pensar melhor.

Observando o que já foi noticiado a respeito desse tema, há uma pressão de alguns clubes de futebol, de alguns políticos para que o presidente da Confederação Brasileira de Futebol, Marco Polo Del Nero, se afaste ou renuncie ao cargo. O sr. tem opinião sobre isso?
Eu não conheço bem o presidente Marco Polo Del Nero. Mas eu acho que vai haver, necessariamente, uma grande reestruturação no futebol. No futebol mundial.

O sr. acha que ele deveria, de maneira prudencial, se afastar?
Eu acho que seria uma boa medida. Até para facilitar os entendimentos necessários. Para fazer frente a esses impasses todos e a essas denúncias, a esses fatos que estão vindo à tona, fruto das investigações do FBI.

O sr. acha que seria prudente que ele renunciasse?
Eu acho. Ou se afastasse. Eu já vi algumas situações, por exemplo, o presidente Itamar [Franco]. O homem mais forte era o [Henrique] Hargreaves, e o que é que o presidente Itamar fez quando houve algumas suspeitas? Foi afastar o seu principal ministro. E depois não foi apurado nada. Ele voltou e voltou mais forte. Então, acho que pelo menos um afastamento não seria ruim.

Tem rumores que o PMDB deve indicar o senador João Alberto, do Maranhão, do PMDB. Só que ele é muito ligado ao grupo da família Sarney, e a família Sarney tem o Fernando Sarney, que é filho do ex-presidente da República, José Sarney, que é um dos vice-presidentes da CBF. Seria impróprio que o senador João Alberto ocupe um cargo de direção nessa CPI por conta disso?
Eu não posso fazer juízo de valor. Isso é competência do PMDB, do líder Eunício indicar. Eu não posso. Pelo que eu tenho sentido...

Para a imagem do Senado.
Não. O senador João Alberto é um homem experiente, é um homem já de dois mandatos como senador. Já foi governador, secretário. É uma pessoa que tem experiência, tem vivência. E sempre tem adotado um comportamento republicano. Mas eu não sinto ainda uma definição clara com relação ao nome do PMDB.

Por falar em CPIs que começam quentes e ficam frias, a CPI do HSBC está há três semanas sem se reunir. O que é que está acontecendo com essa CPI no Senado?
Toda CPI que começa no vácuo de uma investigação, ela não vai para frente. É muito difícil. E você mesmo foi protagonista nesse processo, até pelas suas funções na imprensa internacional com relação à Associação dos Jornalistas Investigativos. Mas na verdade, ela já pegou uma carona no que já vinha sendo feito, já vinha sendo apurado. Então, toda CPI que começa assim, ela tem muitas dificuldades em avançar nas investigações. Porque, primeiro uma CPI não tem os mecanismos necessários para fazer uma investigação, que é uma investigação complexa, porque é uma investigação de sistema financeiro, como essa do HSBC. Já pegou o negócio no meio do caminho.

Tem uma informação de que muitos dos citados com possíveis contas no HSBC, contas não-declaradas no exterior, não declaradas à Receita Federal, ao Banco Central, portanto, passíveis de um crime sério, que é o de evasão de divisas, que não prescreve, muitos empresários de empresas importantes pressionaram tanto os senadores como o governo. O sr. ouviu alguma coisa a respeito?
Não, eu não ouvi. Não ouvi, mas eu presumo. Eu fui presidente da CPI dos Correios que você acompanhou muito mais proximamente. Você sabe, uma CPI como essa faz pressões que você passa, há uma ação forte em cima dos parlamentares, quando é mista dos deputados e senadores. Agora, nesse caso, dos senadores, eu não tenho dúvida nenhuma, porque seria de se estranhar se não houvesse nenhum tipo de pressão.

A Operação Lava Jatom que está investigando os contratos da Transpetro, que foi presidida de 2003 a 2015 pelo ex-senador Sérgio Machado, indicado por Renan Calheiro (PMDB-AL), presidente do Senado, tem um inquérito que resultou disso tudo, a gente sabe, o presidente Renan é um dos que foi incluído na lista do procurador-geral, Rodrigo Janot, e está aguardando para ver o que acontece. O sr. acha que é bom para o Senado que o senador Renan Calheiros aguarde no cargo a definição sobre o caso dele? Dois: se for aceita a denúncia ele também deve permanecer no cargo de presidente do Senado?
Primeiro, o presidente Renan foi votado, foi eleito pelos seus pares, senadores e senadoras, a gente não pode fazer qualquer juízo de valor. É uma investigação.

Mas ele foi eleito antes de a lista do procurador-geral, Rodrigo Janot, ser divulgada.
Pois é, mas o importante é o seguinte, o fato de alguém estar sendo investigado, isso não presume culpabilidade.

Mas o sr. acabou de dizer que o Marco Polo Del Nero talvez devesse se afastar.
Não, mas no caso do Marco Polo Del Nero, eu acho que até...

E não tem nem processo contra ele.
Isso a gente não sabe.

No Brasil, não tem.
Até porque agora estão surgindo desdobramentos importantes da investigações.

Mas no caso do presidente Renan já há elementos, a Procuradoria-Geral da República pediu para o Supremo Tribunal Federal investigá-lo.
Gostaria de separar muito bem esses casos. E por que que eu tenho essa leitura em relação ao futebol? É que o futebol vai passar por uma razia. Vai passar por um processo de reestruturação forte e, para você quebrar tabus, acho que essa é uma oportunidade ímpar para trazer novos protagonistas.

Mas isso não se aplica à política também?
Que vão ter legitimidade para introduzir as mudanças necessárias. O Senado é uma estrutura de décadas e décadas. Do Brasil República.

Mas as pessoas marcharam aos milhões em 2013, nas ruas, pedindo renovação da política. Não se aplicaria também ao Senado, neste caso?
Eu acredito que sim, mas a renovação da política... Esse tema que você está tratando é muito importante, e esses movimentos populares demonstraram isso. Acho que a política não está nas pessoas, não está só... Essa mudança política é uma nova forma de você fazer política, é a introdução de temas que refletem essa realidade que levou a essa mobilização intensa nas ruas. Portanto ela não passa necessariamente por pessoas. Ela é uma coisa muito mais ampla, porque é uma questão de mérito.

Ou seja, o sr. acredita que é apropriado que o presidente do Senado, Renan Calheiros, permaneça no cargo até o final do eventual julgamento a que ele seja submetido?
Enquanto não houver uma pessoa, no caso, um senador da República eleito, eleito no seu Estado, eleito pelos seus companheiros de Senado, portanto com absoluta legitimidade. E, se não houve nenhum julgamento, nós não podemos fazer uma condenação prévia, não teria lógica nenhuma. Nós temos muito casos pelo Brasil, se a gente aplicar essa regra nós podemos estar cometendo injustiças com muitas pessoas.

O sr. foi diretor de gás e energia da Petrobras no final do governo Fernando Henrique, 2000, 2001. Nesse período, a corrupção que rondava a estatal era menor ou maior do que a revelada pela Operação Lava Jato?
Essa operação, e as investigações, e o papel da Procuradoria-Geral da República, e também o Supremo Tribunal Federal e outras instâncias da Justiça vão fazer juízos de valor de tudo isso. Agora o que eu quero dizer é o seguinte. A Petrobras sempre teve preocupações com a sua governança, com questões de compliance, e isso vem de muito tempo, principalmente quando a Petrobras abriu o capital, lançou ADRs em Nova York. Agora, o fato de você ter uma companhia estruturada, com gente muito qualificada, com tecnologia desenvolvida que é ímpar no mundo, e respeitada por todo o mercado de petróleo, você não fica incólume a eventuais desvios de pessoas. Agora, eu, pelo menos na época em que fui diretor da Petrobras, a diretoria era muito diligente, o Conselho [de Administração] também. Agora, ninguém pode fazer uma afirmação, você não controla uma empresa do tamanho da Petrobras, não consegue controlar todas as pessoas. Você tem regras que mitigam ações que venham a prejudicar a Petrobras.

A Petrobras é muito grande, cresceu muito, tem dezenas e dezenas de milhares de funcionários. Esteve aqui outro dia, sentado nessa cadeira, o senador José Serra (PSDB-SP), dizendo que –coisa que ele não falava antes– talvez a Petrobras devesse ser preparada para ter algumas áreas que sejam no futuro entregues à iniciativa privada. Ele citou, por exemplo, a Petrobras produz até fio têxtil em Pernambuco. Por que uma empresa como a Petrobras tem que fazer isso? O sr. acha que seria bom para a Petrobras que ela fosse enxugada um pouco?
Acho que a tendência da Petrobras é uma tendência de valorizar principalmente o upstream, a exploração e produção. E eu não tenho dúvida. Agora, com o presidente [Aldemir] Bendini, ele está organizando o portfólio da companhia nesse sentido.

Mas seriam no futuro vendidos alguns pedaços da empresa para ela não ter que ficar se preocupando com áreas que não são as principais?
Sem dúvida nenhuma.

Que áreas, o sr. diria?
Esse plano de desinvestimento é muito claro nesse sentido.

Tem alguma área, alguma subsidiária da Petrobras que no futuro seria bom que fosse para a iniciativa privada?
Eu não fiz essa análise mais aprofundada. Mas acho que determinadas atividades a Petrobras tem que se desvencilhar delas porque não está no core business da Petrobras.

O sr. não tem medo de falar isso sendo petista?
Não, não tenho medo de falar isso não, eu acho que a Petrobras, dentro do seu portfolio, precisa olhar, acima de tudo, aquilo que dá mais rentabilidade e aquilo que é o grande negócio da companhia. E o grande negócio da companhia é exploração e produção de petróleo.

Ainda porque o sr. foi diretor de gás da Petrobras, em 2011, a estatal lançou a chamada NPP, Nova Política de Preços, e passou a aplicar um desconto no preço do gás natural. O desconto foi ficando, foi ficando, em 2014 começou a reduzir o desconto. Em maio agora de 2015 isso representou um aumento de 8% no preço do gás natural e deve haver, ao longo deste ano, a redução quase que total, ou total, e vai ter aumento de 12% do gás natural, que é monopólio da Petrobras, o seu fornecimento. A inflação está altíssima, a Petrobras está fazendo isso, gás natural é um insumo barato no exterior, no Brasil também. Está correta essa política da Petrobras?
Na verdade, Fernando, houve uma distorção dos preços de gás natural em função do [gasoduto] Bolívia-Brasil. É um projeto que foi estruturado na forma de “take or pay”, ou seja, você tem todo um aumento do volume exportado da Bolívia para o Brasil em milhões de metros cúbicos e o contrato é assim. Você tem um determinado “take” de gás. Ou você consome. Ou não consumindo, você paga do mesmo jeito. Foi montada toda uma estrutura, inclusive acelerando a depreciação do gasoduto, para 10 anos, e isso levou a uma definição de preços em cima de uma cesta de óleos, até pela disputa por mercados assemelhados entre o óleo e o gás natural. Como a tendência agora da Petrobras é trazer parceiros ou eventualmente até vender gasodutos, pelo menos é o que o presidente Bendini tem falado, você começa a criar uma realidade na distribuição de gás natural e no transporte muito diferente. Porque aí você vai ter livre acesso, outras companhias vão poder vender o seu gás e aí criar um mercado competitivo. Até porque hoje, apesar do mercado estar aberto, na verdade a Petrobras...

Tem o monopólio.
O monopólio, que para mim é o mais complicado, não é o monopólio de direito, é o monopólio de fato do gás natural no Brasil. A partir do momento que você crie uma estrutura de competição maior, que você abra os gasodutos para outras petroleiras, você necessariamente vai levar a um preço mais compatível.

Senador, eu entendo isso, mas o que tenho ouvido dos empresários é que não tem política de preços definida, a Petrobras, faz uma política e, de uma hora para outra, muda essa política. Quem se estruturou pensando que ia ter aquela fonte de energia barata, ou por um preço pelo menos que estava definido, se surpreende de manhã com um preço totalmente diferente. Isso num momento em que a economia está em desaceleração, a inflação em alta, e vai ter impacto geral em muitos setores da economia. Não é uma decisão desastrada fazer dessa forma, esse aumento?
O grande problema que a Petrobras enfrentou... Porque a Petrobras tinha uma regra de seguir preço internacional.

Não tem mais.
Não tem mais. Então o que que aconteceu? Isso traz uma série de distorções, Fernando.

Mas nesses caso aqui, específico. Como resolver?
No caso, por exemplo, do gás natural, o gás natural vai ter que acompanhar a tendência dos outros combustíveis. Porque o gás natural esteve muito alto há algum tempo, hoje, inclusive, com o “shale gas” e outras coisas você tem um novo cenário. A Petrobras vai ter que se adaptar a esse cenário. Porque os industriais, os consumidores, não podem ficar à mercê de oscilações ou de mudanças de políticas em cima de uma regra estabelecida.

Mas é exatamente o que está acontecendo agora.
Lamentavelmente. Eu acho que agora, pelo menos...

Mas é um erro a Petrobras ter feito dessa forma, de uma hora para outra, essa mudança do preço? Tem muita indústria no país que depende disso. Se atrelou a esse tipo de insumo.
Na verdade, é que também primeiro tivemos um despacho de usinas termelétricas intenso. E aí você tem uma necessidade forte, com o suprimento de energia do país.

E vai continuar a ter.
Vai continuar tendo. E usina termelétrica a gás operando na base. O Brasil, ainda, sob o ponto de vista de produção de gás, o Brasil não tem uma situação confortável. Então enquanto nós não tivermos aí o gás que vem do Espírito Santo, o gás do pré-sal, nós vamos estar importando o gás, o famoso GNL, aquelas barcaças, que evidentemente têm um custo adicional. Então, na verdade nós somos premidos também pelo tamanho da produção de gás, pelas necessidades, principalmente sob o ponto de vista energético.

E nesse caso foi evitável essa decisão da Petrobras, de dar esse chute para cima no preço?
Foi inevitável, até porque ela fez também de uma maneira consciente, porque muitas...

Consciente até pode ter sido, mas foi de uma hora para outra. Nem avisou.
Mas na verdade muitas dessas indústrias operam... Vou dar um exemplo: caldeiras. Elas têm uma operação dual. Pode consumir óleo e pode consumir gás. Isso, se for combinado com as empresas, funciona.

Mas não foi, né.
Na verdade, não é que não tenha sido. É que surgiu uma circunstância e a Petrobras teve que se adaptar a ela, mas conversou com seus principais consumidores para buscar soluções.

Não é o que o pessoal do setor fala. Diz que ficou sabendo, pediu explicação.
Não, não há ninguém do setor de gás, competentes como eles são, que são surpreendidos por alguma mudança de uma hora para outra na Petrobras. Antes da Petrobras decidir ele já sabe.

Deixa eu falar sobre um caso que se abateu sobre o sr. ontem, quarta-feira, 10 de junho. O caso da sua campanha ao Senado em 2010, que recebeu 3 doações eleitorais no total de R$ 200 mil de 2 empresas de Julio Gerin Camargo, lobista, apontado como operador de propinas no esquema revelado pela Operação Lava Jato. O sr. conhece Julio Gerin Camargo?
Conheço. Julio é meu amigo de muitos anos, amigo de família.

E o que que se passou?
Isso foi uma doação legal, Fernando. E curioso é o seguinte. Essa matéria já foi veiculada em outubro do ano passado. Para você ter uma ideia, como é que as pessoas... É incrível. Eu vi algumas matérias sobre isso, eu fiz questão até de mandar, nas minhas respostas, as notícias que foram veiculadas sobre esse assunto.

No ano passado?
No ano passado, em outubro do ano passado. Quer dizer, alguns colegas seus, jornalistas, que sequer se deram ao trabalho de fazer uma pesquisa para ver se esse assunto já tinha aparecido. E, pior, esse tema foi tratado inclusive no depoimento do Julio, quando ele diz assim: “eu sempre doei para 2 parlamentares: senador Delcidio Amaral e o senador Romeu Tuma, já falecido. Senador Delcidio porque é meu amigo de família. E o senador Romeu Tuma porque seus filhos foram criados com os meus filhos. Está escrito na delação. Uma coisa absolutamente óbvia, transparente, e aí colocam: “Líder do governo e tal”. Isso aí já foi fatorizado, isso é do conhecimento de quem está investigando, da Procuradoria, não tem absolutamente nada de errado.

O fato de o Julio ser ligado, ser representante comercial da Camargo Correia, ou lobista, como alguns dizem, ter uma atividade que fica em um limiar às vezes um pouco opaco, não prejudica um político como o sr., ainda que sejam doações registradas legalmente?
Eu acho que o Julio, primeiro, é um empresário. O Julio não representava, não trabalhava só em projetos da Camargo Correia. O Julio era o principal representante, é ainda, o principal representante da Mitsui, da Toyo. A Mitsui é uma das maiores trading do mundo, a Toyo é a maior empresa do mundo de engenharia de equipamentos e de construção do mundo. São empresas que zelam pelo seu nome, pela sua imagem, por tudo aquilo que eles construíram. E a despeito dessas coisas todas, essas empresas não se distanciaram dele. Por quê? Porque reconhecem nele um empresário importante, um empresário que trabalhou em projetos fundamentais para as empresas que ele representava.

Maioridade penal.
Sou contra.

O sr. é contra à redução da maioridade penal?
Contra, e nós estamos discutindo agora o projeto do governador [Geraldo] Alckmin. Na verdade é uma emenda, a um projeto do senador [José] Serra (PSDB-SP), que ele mantém os 18 anos, mas em função da tipificação do crime ele estende a penalidade.

O sr. acha que, embora esse seja um tema de grande apelo popular, o Congresso vai acabar chegando a um meio-termo e não apenas reduzindo simplesmente a maioridade para 16?
Acho que vai chegar a um meio-termo. Ontem você já viu, na Câmara, como é que as coisas aconteceram. E eu não tenho dúvida nenhuma. O Congresso não vai adotar uma atitude radical com relação a essa questão.

O sr. vê com simpatia portanto essa ideia que foi defendida já há muitos anos pelo governador Geraldo Alckmin, do PSDB de São Paulo, que é aumentar o período de reclusão do menor, mas segregado do sistema penitenciário normal, é isso?
Sem dúvida nenhuma.

E também agravar a pena daqueles que usam menores para praticar crimes?
Sem dúvida nenhuma. É absolutamente pertinente.

Essas seriam as soluções?
Do meu ponto de vista, sim.

O sr. ficou conhecido sempre como Delcídio Amaral. Daí fui ver seu nome na eleição do ano passado, está Delcídio do Amaral, que é o seu nome. O sr. introduziu esse “do” na hora de se apresentar no ano passado por alguma razão específica?
É numerologia. Sou muito ligado...

Quem fez essa numerologia para o sr.?
Eu tenho uma... Sempre consulto uma pessoa, que de certa maneira me ensinou muitas coisas. Eu sou místico, bastante. Sigo muito o que os números indicam, meu comportamento ele de certa maneira...

Quem é essa pessoa, senador?
É uma pessoa que vive no Sul do Brasil e que sistematicamente eu consulto.

É o que, um místico?
É uma pessoa muito mística. É uma mulher.

É uma pessoa conhecida?
Não. É muito conhecida de alguns.

Como é o nome dela?
Eu prefiro não falar.

Ela recomendou o “do Amaral” para o sr.?
É o “do Amaral” por causa do número. Porque a minha vida foi sempre guiada pelo número 8. E o curioso é que minhas filhas todas têm uma composição de oitos. E esse número sempre seguiu a minha vida. Se você somar Delcídio do Amaral dá 16, que é 8 vezes 2, que é 8 de fevereiro, dia do meu aniversário, e assim vai.

Agora, não deu certo no ano passado.
Não deu certo, mas eu peguei um momento difícil. Primeiro, de um antipetismo intenso, e meu Estado é conservador, você conhece, e exploraram essa questão da Petrobras, que eu estava na lista, não sei o quê, e usaram intensivamente isso. E foi uma das campanhas mais perniciosas que eu tive oportunidade de participar, pela baixaria. Foram ataques pessoais, ataques à família, e eu faço política olhando para frente, de uma maneira positiva, propositiva.

E olhando para frente, o sr. tentou 2 vezes, 2006 e 2014, se eleger governador do Mato Grosso do Sul, e não deu certo. Quais são os seus planos, daqui para frente?
Em princípio, me candidatar à reeleição. Mas vamos esperar o tempo. O tempo vai dizer. Acho que agora, em função de tudo o que aconteceu comigo, eu saí vitimizado da eleição. Tanto é que eu ando no meu Estado e as pessoas de certa maneira avaliam assim: “pô, Delcídio, tentaram vender uma imagem sua que você não era”. E também pelo meu comportamento, permanente, por ser também uma pessoa do mundo, porque eu andei demais, então eu sou plural. Então as pessoas às vezes avaliam: “será que não valeria a pena ousar mais para projetar Mato Grosso do Sul para o espaço que Mato Grosso do Sul merece?”. Então ficou esse sentimento agora, depois de tudo o que aconteceu. O tempo vai dizer.

Senador Delcídio do Amaral, líder do governo no Senado, muito obrigado por sua entrevista ao UOL.
Eu que te agradeço, Fernando, à sua equipe também, foi um prazer enorme conversar com você.