Governo alega "desvio de poder" e vai ao STF para anular impeachment
A AGU (Advocacia-Geral da União) entrou nesta terça-feira (10) com um mandado de segurança no STF (Supremo Tribunal Federal) para anular o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff (PT). O recurso se baseia na decisão do próprio Supremo que afastou o ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), do mandato e do cargo. Segundo a AGU, Cunha teria atuado com desvio de poder quando acolheu e conduziu o processo de impeachment contra Dilma. A votação no Senado, que pode determinar o afastamento da presidente, está marcada para amanhã.
O relator do mandado de segurança será o ministro Teori Zavascki.
"As razões que levam o STF a afastá-lo são as mesmas razões que fazem com que impetremos essa ação", disse José Eduardo Cardozo, advogado-geral da União, em entrevista a jornalistas. Na semana passada, o STF decidiu pelo afastamento de Eduardo Cunha da Presidência da Câmara e a suspensão de seu mandato. A decisão atendeu a um pedido feito pela PGR (Procuradoria-Geral da República) em dezembro de 2015 e que alegava que Cunha usava seu cargo para obstruir investigações contra ele na Operação Lava Jato e no Conselho de Ética da Câmara.
Cardozo argumenta que há inúmeras evidências de que entre os atos praticados por Cunha para se livrar das investigações da Lava Jato e do processo no Conselho de Ética estaria uma chantagem supostamente praticada por ele contra integrantes do governo. Segundo ele, Cunha só acolheu o pedido de impeachment contra Dilma após o governo não ceder às suas pressões. A AGU anexou reportagens sobre as supostas chantagens cometidas por Cunha ao mandado de segurança.
"O presidente Eduardo Cunha agiu com desvio de poder durante toda a fase de processamento (do impeachment) na Câmara", disse Cardozo.
Parte da argumentação do mandado de segurança impetrado pela AGU utiliza a decisão do ministro do STF Gilmar Mendes que anulou, por desvio de finalidade, a nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como ministro-chefe da Casa Civil em março deste ano. Segundo Cardozo, como Gilmar Mendes anulou a nomeação de Lula em razão de um suposto desvio de finalidade, há margem para que o STF decida pela anulação do processo de impeachment na medida em que Cunha foi afastado pelo Supremo justamente por cometer atos com “desvio de finalidade”.
"Trata-se simplesmente de garantir coerência valorativa ou justificativa ao sistema jurídico e de apartar, com clareza, discricionariedade de arbitrariedade", explicou Cardozo.
O mandado de segurança impetrado pela AGU pede, liminarmente, a suspensão do processo de impeachment contra Dilma. No chamado "mérito" da ação (pedido principal), a AGU requer a anulação de todos os atos de Eduardo Cunha relacionados ao impeachment. Ainda não há informações sobre quando o STF irá julgar a ação.
Bala de prata
O advogado-geral da União negou que este recurso seja uma espécie de "bala de prata" nas tentativas do governo de impedir o impeachment. "Não posso dizer que esta seja a bala de prata. Por que não é? Porque há outras questões que podem ser judicializadas a qualquer momento", declarou. Entre os fatores citados por Cardozo estão supostas irregularidades constitucionais.
"Quando afirmamos que há uma ruptura constitucional, este é um dos fatores. Existe, por exemplo, a falta de existência de evidência de crime de responsabilidade. O desvio de poder é um dos aspectos que caracteriza um processo de impeachment em desconforme com a Constituição", declarou o AGU.
Ao responder sobre até onde a presidente Dilma iria para impedir o processo de impeachment junto ao STF, Cardozo foi enfático. “Eu diria que eu diria como qualquer pessoa que se sente lesada. Até onde você iria? Até o fim. Até que eu consiga fazer com que meu direito sejam pisoteados”, disse.
Interino da Câmara anula impeachment, mas volta atrás
Cardozo criticou a pressão exercida por partidos políticos, incluindo o próprio PP, contra a decisão do presidente da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA), que na última segunda-feira (9) anulou as sessões de votação do processo de impeachment na Câmara. A decisão gerou revolta de integrantes da oposição e do PP, que ameaçou expulsá-lo. No final da noite de segunda-feira, porém, Maranhão recuou e revogou sua decisão.
“Isso demonstra o ingrediente político de um processo que está sendo realizado à revelia da lei”, disse o representante da AGU.
Sobre a mudança na decisão de Maranhão, Cardozo disse que a pressão exercida contra o presidente da Câmara mostraria que há uma “situação anômala no Brasil”. “Num processo político-jurídico, isso apenas aumenta a percepção nacional e internacional de que há uma situação completamente anômala no Brasil”, afirmou.
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