"Me sinto sem identidade", diz jovem brasileira no Japão
Patrícia Morghetti chegou ao Japão com seis anos de idade. Em sua ingenuidade de criança, achava que estava deixando Londrina (PR) com a mãe e o irmão apenas para encontrar o pai, que já estava no país há alguns anos. Mas já se passaram 15 anos e ela nunca mais voltou ao Brasil.
"Às vezes, eu me sinto sem identidade. Não pertenço ao Japão, mas o Brasil é um país desconhecido para mim também", disse à BBC Brasil.
Ela estudou em escola brasileira e, por isso, não fala o idioma local. "Na época em que cheguei ao Japão, não havia muitas famílias estrangeiras e meus pais tiveram receio de eu sofrer bullying. Por isso, optaram pelo ensino brasileiro", contou.
Patrícia mora em Hamamatsu, na província de Shizuoka, cidade com uma das maiores concentrações de brasileiros no Japão. "Sempre vivi nessa redoma, nessa comunidade brasileira. É como se estivesse à parte da sociedade".
"Moro num país do qual não falo a língua, do qual não entendo nada e não consigo me integrar à sociedade."
Atualmente, a brasileira trabalha num bar, onde se comunica com clientes estrangeiros em inglês. "Só de não trabalhar na fábrica já está ótimo. Na fábrica, as pessoas param no tempo, não evoluem, e eu sempre tive certeza que não queria aquilo para mim", acrescentou.
Hoje, aos 21 anos, e com dois filhos para criar, ela planeja finalmente voltar ao Brasil no fim do ano que vem.
"A imagem que tenho do Brasil é aquela que vejo na TV: corrupto, violento, onde não se pode confiar nas pessoas. Mas também vejo como um país de oportunidades, pois pelo menos poderei me comunicar no meu idioma", afirma.
Foram histórias como a de Morghetti que inspiraram Kimihiro Tsumura, professor de Estudos da Comunicação Contemporânea da Universidade Hamamatsu Gakuin, e a cineasta Mayu Nakamura a produzir um documentário, lançado neste ano no Japão.
Andorinhas Solitárias (Kodoku na Tsubametachi, título em japonês) retrata a vida de cinco jovens brasileiros da quarta geração (yonsei), cada qual com seus problemas sociais de adaptação, identidade, separação e integração social em um meio adverso.
A obra explora o sentimento comum de não pertencer ao Japão, mas mostra também as dificuldades de se readaptar ao Brasil.
O pesquisador Angelo Ishi, sociólogo e professor da Universidade Musashi, em Tóquio, no entanto, faz ressalvas. Para ele, o documentário peca ao mostrar uma "realidade" que não é a comum dos jovens da segunda geração de brasileiros no país.
"O filme apresenta, deliberadamente, os exemplos mais graves de jovens que enfrentam ou causam problemas para si e para os outros", avalia.
Para Ishi, o grande problema nem é o fato do documentário deixar de citar os casos de sucesso e de jovens que "deram certo", mas, sim, omitir a realidade da grande maioria dos jovens. "Eles vivem em um 'limbo' entre o 'sucesso' e o 'fracasso'; não estão chegando até a faculdade, mas nem por isso se perderam na criminalidade, depressão e autoflagelo", afirmou.
"Andorinhas Solitárias é sensacionalista por ignorar e omitir as andorinhas menos agitadas, cujas feridas são menos visíveis, e que enfrentarão em breve as noites solitárias de hora-extra numa fábrica e a eterna procura de um sentido para suas vidas", analisou Ishi.
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