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EUA destroem armas químicas: de Rússia a Sudão, que países ainda oferecem perigo?

Início da destruição de projéteis contendo o agente nervoso sarin no depósito militar de Blue Grass, no Kentucky, em 2020 - Dylan Lovan/AP Photo/picture alliance
Início da destruição de projéteis contendo o agente nervoso sarin no depósito militar de Blue Grass, no Kentucky, em 2020 Imagem: Dylan Lovan/AP Photo/picture alliance

11/07/2023 04h00

Numa vasta instalação militar no estado americano do Kentucky, um marco está prestes a ser atingido: trabalhadores do depósito de Blue Grass estão destruindo as últimas armas químicas dos Estados Unidos, o que acabará com o único arsenal do tipo oficialmente declarado restante no mundo.

A destruição dos últimos foguetes remanescentes contendo o agente nervoso GB, também conhecido como sarin, encerrará décadas de campanha pela destruição de um arsenal que ao fim da Guerra Fria totalizava mais de 30 mil toneladas.

Armas químicas foram usadas pela primeira vez numa guerra moderna na Primeira Guerra Mundial, na qual se estima que essas munições tenham matado ao menos 100 mil pessoas. Apesar de posteriormente banidas pelo chamado Protocolo de Genebra, assinado em 1925 e que entrou em vigor três anos depois, países continuaram a estocar armas químicas durante décadas.

O dia 30 de setembro deste ano foi estabelecido como prazo para os EUA acabarem com seu arsenal no âmbito da Convenção sobre Armas Químicas, acordo internacional que entrou em vigor em 1997 e conta com a adesão de 193 países.

Quem não assinou tratado?

Kingston Reif, que durante anos fez campanha pelo desarmamento e agora atua como vice-secretário adjunto de Defesa dos EUA para redução de ameaças e controle de armas, afirmou que a destruição completa do arsenal químico do país "fechará um importante capítulo na história militar".

Autoridades consideram a eliminação do arsenal americano um grande passo adiante no âmbito da Convenção sobre Armas Químicas. Somente três países - Egito, Coreia do Norte e Sudão do Sul - não assinaram o tratado. Israel assinou, mas não ratificou o acordo.

Reif destaca que ainda existe a preocupação de que países signatários, especialmente a Rússia e a Síria, possuam estoques não declarados de armas químicas. Oficialmente, a Rússia destruiu seu arsenal em 2017, após o Reino Unido e a Índia fazerem o mesmo em 2007 e 2009, respectivamente — mas, portanto, há quem duvide.

A Convenção sobre Armas Químicas não acabou com o uso desse tipo de munição. Na guerra civil na Síria, forças leais ao presidente Bashar al-Assad usaram armas químicas no país diversas vezes entre 2013 e 2019. E de acordo com o IHS Conflict Monitor, organização baseada em Londres que analisa dados de inteligência, os combatentes do "Estado Islâmico" usaram armas químicas ao menos 52 vezes no Iraque e na Síria de 2014 a 2016, aponta reportagem do New York Times.

Ativistas pelo controle de armas esperam que o marco alcançado pelos EUA possa motivar os países que ainda não destruíram suas armas químicas a fazê-lo e também ser usado como modelo para a destruição de outros tipos de munição.

"Isso mostra que países podem realmente banir armas de destruição em massa", afirma Paul F. Walker, vice-presidente da Associação de Controle de Armas e coordenador da Coalizão da Convenção sobre Armas Químicas. "Se países quiserem fazer isso, é preciso apenas vontade política e um bom sistema de controle."

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Cilindro usado para transportar armas químicas chega ao depósito de Blue Grass, em 2015
Imagem: Dylan Lovan/AP Photo/picture alliance

A destruição nos EUA

No Kentucky, estão sendo eliminados os últimos de um total de 51 mil foguetes contendo o mortal agente sarin que foram armazenados desde os anos 1940 no depósito, localizado próximo à cidade de Richmond. Segundo reportagem publicada pelo New York Times nesta quinta-feira (06/07), a destruição seria concluída nos próximos dias, possivelmente já nesta sexta-feira.

Recentemente, outra instalação militar americana, perto de Pueblo, no estado do Colorado, concluiu a destruição das últimas armas químicas que abrigava, iniciada em 2016. A missão de eliminar cerca de 2.600 toneladas de projéteis e morteiros cheios de gás mostarda chegou ao fim no último dia 22 de junho.

Estes representavam cerca de 8,5% do estoque original de 30.610 toneladas do agente. No total, cerca de 800 mil munições contendo gás mostarda foram armazenadas desde a década de 1950 em bunkers de concreto numa área rural ao leste de Pueblo.

Décadas de luta

Na década de 1980, moradores dos arredores do depósito militar de Blue Grass, no Kentucky, protestaram contra os planos iniciais de incinerar as 520 toneladas de armas químicas ali armazenadas, iniciando uma batalha de décadas sobre como acabar com o arsenal.

O Exército dos EUA eliminou a maior parte de suas armas químicas incinerando-as em locais mais remotos, como o Atol Johnston, no Pacífico, e um depósito no meio do deserto de Utah. Mas a instalação no Kentucky fica próxima a Richmond, a apenas algumas dezenas de quilômetros de Lexington, a segunda maior cidade do estado, e a menos de 2 quilômetros de uma escola.

Craig Williams, que se tornou a principal voz da oposição popular, afirmou que moradores temiam que a incineração dos agentes químicos liberasse gases tóxicos. Com a ajuda de legisladores, a população conseguiu fazer com que o Exército apresentasse planos alternativos para a destruição.

O depósito de Blue Grass abrigou agente mostarda e os agentes nervosos VX e sarin, grande parte deles dentro de foguetes e outros projéteis, a partir da década de 1940. A usina de descarte do estado foi concluída em 2015 e começou a destruir as armas em 2019.

A instalação usa um processo chamado neutralização para diluir os agentes mortais para que possam ser descartados com segurança. Tanto na usina de descarte do Kentucky quando na de Pueblo, no Colorado, robôs foram usados para eliminar as armas.