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André Santana

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Zebrinha brilha na Dança dos Famosos: 'Um preto na TV quebrando paradigmas'

A dança de Zebrinha no teatro, no cinema e em mostra internacional  - Nara Gentil
A dança de Zebrinha no teatro, no cinema e em mostra internacional Imagem: Nara Gentil

Colunista do UOL

30/06/2023 04h00

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No próximo domingo (2), a Bahia estará em festa para celebrar a data máxima para o estado, que esse ano será ainda mais especial: os 200 anos das lutas de independência do Brasil, que tiverem em território baiano um capítulo decisivo.

Enquanto as ruas de Salvador terão a animação do desfile de fanfarras, grupos musicais, performances artísticas, tropas militares, protestos de movimentos sociais e presença de muitos políticos — incluindo o presidente da República —, um baiano estará mostrando seu talento para milhões de lares brasileiros por meio da televisão.

É o bailarino e coreógrafo José Carlos Arandiba, o Zebrinha, jurado da competição Dança dos Famosos, do Domingão do Huck. Será a grande final, ao vivo. É a segunda temporada com a presença de Zebrinha no júri técnico, ao lado de Ana Botafogo e Carlinhos de Jesus.

Nem bem terminou a participação na atração da Globo e o artista já está envolvido em diversos projetos, dialogando com as linguagens do teatro, do cinema e, claro, levando a arte da dança para diversos espaços, dentro e fora do Brasil.

Zebrinha conversou com a coluna sobre sua movimentada agenda nas artes; sobre a estreia nesta semana com o Bando de Teatro Olodum; sobre a trajetória de exibições do documentário que dirigiu, além de avaliar como positiva sua presença no Dança dos Famosos e destacar a importância, cada vez maior, das pessoas negras serem protagonistas da sua própria história.

Nildinha Fonsêca em Intervenção coreográfica criada por Zebrinha, no Museu de Arte da Filadélfia - Acervo Pessoal - Acervo Pessoal
Nildinha Fonsêca em Intervenção coreográfica criada por Zebrinha, no Museu de Arte da Filadélfia
Imagem: Acervo Pessoal


Dança dos Famosos: Com cerca de 50 anos dedicados à dança, dialogando sua formação clássica com a íntima proximidade com as expressões populares e da cultura negra, Zebrinha considera muito importante participar de um programa de grande audiência, que populariza e valoriza a dança.

"É de suma importância estar ali, quebrando paradigmas. Poucas vezes podemos ver um preto na televisão que não esteja para fazer graça. Por isso, levo com muita seriedade a minha participação, sempre valorizando o investimento artístico dos participantes e, sobretudo, as transformações que a dança traz para eles, como confirmam os depoimentos dados. O retorno positivo do público, principalmente de pessoas pretas, é de que a minha presença traz orgulho e possibilidade, que é o que considero mais importante, para que todos possam se inspirar e acreditar que também podem, que também possuem talentos."

Zebrinha criou as coreografias de A Resistência Cabocla, espetáculo do Bando de Teatro Olodum sobre o 2 de Julho - Nara Gentil - Nara Gentil
Zebrinha criou as coreografias de A Resistência Cabocla, espetáculo do Bando de Teatro Olodum sobre o 2 de Julho
Imagem: Nara Gentil

Bando de Teatro Olodum no Bicentenário do 2 de Julho: Desde 1993, Zebrinha é o coreógrafo do Bando de Teatro Olodum, companhia de Salvador que revelou talentos nacionais como os atores Érico Brás, Lucas Leto, Lázaro Ramos e a cantora Virgínia Rodrigues, entre outros artistas negros. Atualmente, Zebrinha integra a diretoria colegiada da companhia, com a função de diretor artístico, além de continuar criando movimentos coreográficos para os espetáculos do grupo.

Hoje estreia na Praça do Campo Grande, centro de Salvador, 'A Resistência Cabocla', que reúne mais de 30 artistas da dança, do teatro e da música, para contar o protagonismo de negros, negras e indígenas no processo de Independência do Brasil.

"Toda história tem vários lados, e estamos valorizando um lado que não é contado. Quando apresentamos os heróis e heroínas negras e indígenas que fizeram a nossa independência, parece que não é real, parece que estamos ficcionando, porque não foi dito, foi abafado, mas precisamos dizer. O Bando assumiu esse compromisso, e montamos um espetáculo para ser encenado na rua e para dialogar com todas as idades, mas especialmente com os jovens, com muita música, dança e referências da cultura negra e indígena, para contar nossas lutas por liberdade."

Zebrinha em ensaio de A Resistência Cabocla do Bando de Teatro Olodum - Ariana Fonseca - Ariana Fonseca
Zebrinha em ensaio de A Resistência Cabocla do Bando de Teatro Olodum
Imagem: Ariana Fonseca

Mostra sobre Lina Bo Bardi, por Isaac Julien: Zebrinha foi convidado pelo artista inglês Isaac Julien a integrar uma mostra sobre a vida e obra da arquiteta ítalo-brasileira Lina Bo Bardi, criadora de projetos inovadores como o Museu de Arte de São Paulo (MASP), o SESC Pompeia, a Casa de Vidro no Morumbi e o Teatro Oficina no Bexiga, na capital paulista.

O bailarino baiano foi o responsável por criar uma coreografia para ser encenada na famosa escadaria projetada por Lina no Museu de Arte da Bahia (MAM), no Solar do Unhão, em Salvador.

"Criamos uma intervenção coreográfica para os dançarinos do Balé Folclórico da Bahia, com percussão e canto lírico. O resultado foi tão elogiado que Isaac Julien nos convidou para encenar, em maio, nas escadarias do Museu de Arte da Filadélfia. O público e a crítica adoraram, e Isaac já está mapeando outros espaços em que caibam a proposta da intervenção. O projeto dele sobre Lina Bo Bardi é fantástico, os vídeos estão lindos, está rodando o mundo."

Zebrinha e o inglês Isaac Julien em mostra sobre Lina Bo Bardi - Acervo pessoal - Acervo pessoal
Zebrinha e o inglês Isaac Julien em mostra sobre Lina Bo Bardi
Imagem: Acervo pessoal

Documentário sobre a Dança Negra da Bahia: Em 2022, Zebrinha e a cineasta Susan Kalik embarcaram em um desejo antigo do bailarino: registrar a memória da dança negra por meio da trajetória de dançarinos e dançarinas que romperam o preconceito para consolidar uma presença de corpos negros na dança.

Assim nasceu o documentário "Ijó Dudu - Memórias da dança negra na Bahia", que vem emocionando e recebendo aplausos em todo espaço em que é exibido. Zebrinha, que escreveu o roteiro com Susan, conduziu as entrevistas com os mestres e mestras da dança — alguns contemporâneos seus, outros alunos — que contam suas estratégias para resistir e se manter fazendo arte com seus corpos.

Entre os festivais que Ijó Dudu integrou estão: a Mostra de Cinema de Ouro Preto; o IN EDIT BRASIL - Festival Internacional do Documentário Musical; o Encontro de Cinema Zózimo Bulbul; o Bijou Film Festival (Califórnia, EUA); o AfroCine (Popayan, Colômbia) e o Festival de Cinema Curta Pinhais, no qual recebeu o Prêmio de Melhor Filme.

"O filme nasceu da necessidade de contarmos nossas histórias por nós mesmos. É absurdo que os principais tratados sobre os africanos tenham sido escritos por brancos europeus. Aqui no Brasil não é diferente. Por isso, trouxemos os próprios dançarinos e dançarinas, negros e negras, para contarem suas histórias. Além do documentário, que está circulando bastante, sempre com muitos elogios, temos um material muito rico que queremos transformar em minibios com cada artista que foi entrevistado. São trajetórias inspiradoras para as novas gerações."

Zebrinha e dançarinos brasileiros nas escadarias do Museu de Arte da Filadélfia (EUA) - Acervo Pessoal - Acervo Pessoal
Zebrinha e dançarinos brasileiros nas escadarias do Museu de Arte da Filadélfia (EUA)
Imagem: Acervo Pessoal

Zebrinha não para e já dá dicas dos seus próximos projetos:

"Estou muito interessado em mapear o que se produz de arte pop na periferia de Salvador. Tem tanta coisa incrível sendo feito em termos de arte. São iniciativas necessárias, tanto como experiência artística, como também em atitude política. Como eu tenho dito: Não queremos mais referências, queremos presença".