André Santana

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Pescadores ocupam órgão federal na Bahia e cobram proteção dos territórios

Mais de 200 pescadores e pescadoras artesanais da Bahia ocuparam nesta segunda (22), a sede da SPU (Superintendência do Patrimônio da União), em Salvador, para cobrar do órgão agilidade nos processos de regularização fundiária e de proteção dos territórios tradicionais.

A principal reivindicação das comunidades pesqueiras de diferentes regiões da Bahia é a fiscalização da ocupação das praias e áreas de manguezais por empreendimentos empresários, com impactos ambientais que comprometem o sustento das famílias que vivem da pesca artesanal.

A SPU, autarquia vinculada ao Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, se comprometeu em realizar uma operação das áreas mais afetadas e ampliar o diálogo com outros órgãos do governo para garantir um projeto de desenvolvimento nessas comunidades.

"Realizamos essa ocupação no prédio da SPU justamente porque o diálogo que se estabelecia entre a SPU e nós do movimento chegou a um a ponto que não dava mais para esperar por tanta morosidade da SPU em dar avanço nos processos, alguns parados desde 2010, e que não conseguem avançar", explicou Raimundo Siri, pescador artesanal da comunidade de Cova da Onça, em Boipeba, no Baixo Sul da Bahia.

A comunidade à qual Siri representa trava uma intensa batalha com a construção de um luxuoso complexo hoteleiro na Ponta dos Castelhanos, em uma Área de Proteção Ambiental, que deve ocupar 1.651 hectares de extensão, o equivalente a quase 20% de todo território da ilha, onde vivem comunidades tradicionais e quilombolas de pescadores e marisqueiras.

O pescador passou a receber graves ameaças depois que as obras do complexo foram suspensas no ano passado, após a Secretaria de Patrimônio da União, acatar pedido do Ministério Público Federal, que questiona a autorização da transferência de titularidade do terreno e a violação de direitos das comunidades tradicionais.

"A SPU sempre vem com a desculpa que está sem capacidade de olhar nossos pedidos por falta de funcionários. Mas, quando é para empresários, a resposta é rápida. Precisamos que esses pedidos sejam analisados, para que possamos continuar a lutar pelas nossas comunidades", ressalta Siri.

De acordo com documento entregue ao governo pelo movimento, as comunidades pesqueiras da Bahia vivem uma situação de instabilidade, violência e ameaças de expulsão e mortes, pelo desenvolvimento econômico nocivo ao meio ambiente e à reprodução física e cultural dos territórios pesqueiros e quilombolas.

Pescadores denunciam cercas elétricas em praias e mangues

"Muitas das comunidades pesqueiras têm sido ocupadas e invadidas por empresários do mercado imobiliário e do extrativista que têm impedido o direito de ir e vir daqueles que sobrevivem e vivem da pesca artesanal, colocando cercas, inclusive elétricas, em mangues e áreas de praias e em terrenos de Marinha", denuncia Siri.

Os pescadores alegam que todos esses conflitos poderiam ser evitados se a SPU cumprisse com a fiscalização das áreas de mangues e praias e os impactos ambientais e de vida das comunidades pesqueiras, e com a urgente regularização das terras ocupadas pelas populações tradicionais.

"Queremos que o SPU fiscalize essas áreas e nós ajude a desmanchar as cercas, para que possamos andar pelas nossas comunidades, ir ao mar, à pesca e, principalmente, nos apoie no saneamento básico, na fiscalização do lixo que esses empreendimentos e empresários têm trazido e poluído os manguezais, praias e flora regional. Quando chove o esgoto vai todo para as praias", solicita Domingos Mendes Oliveira, pescador e morador de Diogo, no litoral norte baiano.

O pescador Lucimário dos Santos, da comunidade de Pratigi e Matapera, em Camamu, no Baixo Sul da Bahia, destaca duas prioridades do movimento que são a abertura imediata dos caminhos tradicionais de pesca e que as comunidades tenham o direito de opinar sobre a chegada de novos empreendimentos, para que eles não sejam nocivos àqueles que vivem e sobrevivem da pesca e mariscagem artesanal.

"A chegada desenfreada e sem fiscalização pela SPU tem interferido na nossa subsistência. É importante que o órgão desenvolva protocolos de consulta", pontua Lucimario.

O movimento dos pescadores foi recebido pelos gestores da SPU na Bahia, como o superintendente do órgão, Otávio Freire, e também o superintendente do Incra na Bahia, Carlos Borges.

Otávio Freire avaliou a ocupação do prédio como um movimento legítimo de pressão das comunidades, que resultou em encaminhamentos importantes para as pautas. "A SPU junto com outros órgãos, como Incra, ICMBio, Iphan e Ibama, tem feito um esforço conjunto para realizar as regularizações, tentando diminuir o processo burocrático que trava os processos", disse.

Além da escuta sobre os problemas e conflitos vivenciados pelas comunidades, o SPU se comprometeu em realizar operações de fiscalização em 15 dias nas áreas mais afetadas e listadas pelo movimento, um diálogo maior com outros órgãos como o INCRA e um retorno ao movimento até o 20 de agosto para as respostas aos encaminhamentos das demandas.

"Aqui a gente está assumindo um compromisso, que é fazer um debate estrutural, estruturante, estratégico sobre desenvolvimento nessas áreas. Também tem uma pauta positiva, não só reativa, que a gente sabe que é muito pesada, mas também contar com os outros órgãos do governo para, à medida que a gente for resolvendo a questão fundiária, que é histórica no Brasil, a gente também possa disputar um projeto de desenvolvimento para esses locais", disse aos presentes, Olívia Carolino, diretora suplente do Departamento de Modernização e Inovação da SPU/BA.

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