Carla Araújo

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Reportagem

Lula muda tom e reduz ruído no mercado em dia de 'Carta ao povo brasileiro'

"Responsabilidade fiscal não é palavra, é compromisso desse governo desde 2003 e a gente manterá ele à risca." A frase dita nesta quarta-feira (3) pelo presidente Lula, em cerimônia no Palácio do Planalto, deve ter soado como música aos ouvidos do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

Os dois tiveram uma conversa hoje cedo no Alvorada e, apesar de bastante restrita, auxiliares dos dois lados disseram à coluna que o ministro procurou sensibilizar Lula de que é preciso alinhar o discurso e arrefecer os ruídos com o mercado financeiro.

Do lado do presidente, muitos vinham rechaçando que a recente alta do dólar era uma consequência direta das falas de Lula, como, por exemplo, a de que ainda era preciso discutir a real necessidade de corte de gastos.

A argumentação é que Lula sempre soube da importância da responsabilidade fiscal e que muito do barulho dos últimos dias era resultado de interpretações de "ataques especulativos" do mercado, como também alegou o presidente.

Na Fazenda, no entanto, o próprio ministro reclamou que era preciso alinhar o discurso do governo: "O melhor a fazer é acertar a comunicação", disse Haddad na véspera do encontro com Lula.

Além de buscar alinhar a estratégia das falas do presidente, o ministro fez questão de ressaltar que as reuniões de hoje - ainda haverá mais uma no fim do dia - têm o foco na questão fiscal e não especificamente no dólar.

Isso porque o cenário de alta ou queda do dólar é uma consequência e o ministro tem o compromisso de entregar ao presidente uma proposta de corte de gastos nos próximos dias. "Eu não estou querendo marcar data, porque nós estamos há 60 dias trabalhando nisso", afirmou ontem (2).

A nova reunião desta quarta-feira contará com a presença dos ministros da Casa Civil, Rui Costa; do Planejamento, Simone Tebet; e da Gestão, Esther Dweck. O objetivo, além de tratar da elaboração do PLOA (Projeto de Lei de Orçamento) de 2025, é também alinhar a execução orçamentária de 2024.

Versões de cartas para falar com o mercado

Em 2022, quando ainda era candidato e disputava com o então presidente Jair Bolsonaro, Lula recorreu à divulgação de uma carta para prometer uma política fiscal responsável.

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No documento, ele salientava que "política fiscal responsável deve seguir regras claras e realistas, com compromissos plurianuais, compatíveis com o enfrentamento da emergência social que vivemos e com a necessidade de reativar o investimento público e privado para arrancar o país da estagnação".

O gesto de assumir compromissos publicamente foi visto, à época, com bons olhos por analistas do mercado financeiro.

A primeira versão de uma carta, porém, como instrumento para se comprometer com o mercado, foi a chamada 'Carta ao Povo Brasileiro', lançada em 2002, quando o então candidato sofria resistência do mercado pelas críticas que fazia ao modelo de gestão adotado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso. Essa posição despertou o medo de que um eventual governo do PT rompesse com acordos já estabelecidos. Com a Carta, ele tentou diminuir a resistência de investidores a sua candidatura.

Na ocasião, a carta foi vista como um dos gestos mais importantes para desmistificar a imagem do líder sindicalista que não teria responsabilidade com as contas públicas.

"A questão de fundo é que, para nós, o equilíbrio fiscal não é um fim, mas um meio. Queremos equilíbrio fiscal para crescer e não apenas para prestar contas aos nossos credores", escreveu Lula, antes de chegar à Presidência pela primeira vez.

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