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Leonardo Sakamoto

Por que o ministro não anunciou o erro do Enem dançando com guarda-chuva?

Ministro da Educação, Abraham Weintraub, com um guarda-chuva em um vídeo em que reclamou de uma suposta "chuva de fake news" - Reprodução/Twitter
Ministro da Educação, Abraham Weintraub, com um guarda-chuva em um vídeo em que reclamou de uma suposta "chuva de fake news" Imagem: Reprodução/Twitter

Colunista do UOL

18/01/2020 19h59

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O "melhor Enem de todos os tempos" deu chabu.

Parte dos estudantes respondeu a prova de uma cor, mas a correção foi feita baseada em outra, reduzindo consideravelmente a sua nota. Reclamações circularam pelas redes sociais, levando o ministério a se pronunciar.

Imagine o que passa pela cabeça de uma pessoa que está se esfolando de estudar para conseguir vaga em uma universidade pública quando se depara com uma nota inferior ao seu número de acertos, poucos dias antes de começar a inscrição para o Sisu (Sistema de Seleção Unificada)?

Weintraub gravou um vídeo, ao lado do presidente do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), pedindo a quem levou um "susto" com a nota desculpas pelo "transtorno" e admitindo uma "inconsistência" - novo sinônimo para "erro" ou "burrada". Disse que o problema estava sendo corrigido.

O ministério da Educação, o Inep e as empresas responsáveis por imprimir as provas estão analisando qual o tamanho do chabu. Pode ser 3,9 mil afetados, 39 mil...

O ministro, contudo, não compareceu à entrevista concedida pelo governo a fim de explicar o problema, deixando o abacaxi para o presidente do Inep, Alexandre Lopes, descascar sozinho.

No momento de colher os louros, contudo, ele estava lá. Na última sexta (17), deu coletiva ao lado de Lopes para se gabar dos resultados do Exame Nacional do Ensino Médio 2019, que contou com cerca de 3,9 milhões de participantes.

Para um governo que vive citando a bíblia, esqueceu-se do lembrete de Eclesiastes, capítulo 1, versículo 2 ("Vaidade de vaidades! Tudo é vaidade"), e se despiu de humildade ao dizer que o melhor Enem de todos os tempos mostrava que "gestão e eficiência e respeito ao dinheiro público são marcas do governo Bolsonaro". Afirmou também que não houve "polêmica" no exame, que "não teve problema operacional nenhum".

Ahã, Claudia, senta lá.

Independentemente do desfecho, o caso reforça algo que já escrevi aqui: tudo isso acontece quando um presidente da República deixa vaga a cadeira de ministro da Educação. Desde o início do ano, Bolsonaro indicou prepostos que serviram para desperdiçar tempo do país, substituindo a busca pela melhoria da educação básica e superior e pelo aumento da produtividade da força de trabalho por guerra cultural.

Merenda de qualidade, professor bem pago e formado, escola com papel higiênico e internet, bolsas de pesquisas com valores dignos e pagas em dia? Nope, a prioridade é lutar contra o fantasma do comunismo e a mamadeira de piroca.

Weintraub xinga pessoas pelas redes sociais, ameaça estudantes e professores, inventa que as universidades federais são fábricas de drogas, posta vídeos com gracinhas, como aquele em que dança com guarda-chuvas, reclamando de um temporal de fake news. Enquanto isso, seu ministério segue uma bagunça e até o Fundeb corre risco.

Ele, porém, não é causa, mas consequência - da mesma forma que o ex-secretário de Cultura e plagiador de nazismo, Roberto Alvim. Todos são frutos do bolsonarismo, que espera deles defesa incondicional do presidente e declarações bizarras que sirvam de alimento para a militância.

Em 20 de dezembro, o presidente disse que o que está sendo feito agora na área, "daqui a cinco, dez, quinze anos, vai ter reflexo". Também como sempre digo aqui, Bolsonaro usa a área da educação para ajudá-lo na tarefa de implementar um "Ministério da Verdade", como no livro "1984", de George Orwell. Quer castrar a liberdade com uma intervenção no significado e no sentido da educação pública, acabando com instrumentos que democratizam o conhecimento. Para a extrema direita, a sociedade está corrompida e degradada por conta dessas liberdades, precisando de refundação. Para tanto, uma guerra que ressignifique a realidade é fundamental.

O problema ocorrido no Enem não é uma falha imprevisível, mas consequência de opções feitas pela Presidência da República. Portanto, deve entrar na conta de Bolsonaro quando ele for cobrado por atrasar o futuro.