Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Encarar o homofóbico, como fez o senador Contarato, é lição civilizatória
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Em um dos momentos mais fortes da CPI da Covid até agora, o senador Fabiano Contarato (Rede-ES) deu uma lição de civilidade diante de uma postagem homofóbica feita contra ele pelo empresário bolsonarista Otávio Fakhoury, que depõe hoje por, vejam só, espalhar discurso de ódio e fake news sobre a pandemia nas redes sociais.
Escreveu o empresário: "O delegado homossexual assumido [em referência a Contarato] talvez estivesse pensando no perfume ali de alguma pessoa daquele plenário... Quem seria o perfumado que o cativou?". Sim, o nível é pré-escolar.
Convidado por Omar Aziz (PSD-AM) a ocupar a cadeira da presidência da comissão, Contarato confrontou Fakhoury de forma emocionada e elegante. Projetou para todos lerem o que o bolsonarista havia divulgado, afirmou que a família dele não é pior que a do empresário, detalhou o mal que esse tipo de preconceito, comum ao presidente da República, causa. O senador lembrou que o Brasil é o país que mais mata pessoas LGBTQIA+.
Essa ação conta com uma enorme potência transformadora, se não para o empresário, ao menos para quem assistir a cena.
Se nós, homens, pudéssemos ser confrontados com o nosso comportamento machista, o mundo seria muito melhor. Porque uma coisa é a covardia do pseudo-anonimato das redes sociais e aplicativos de mensagens e a covardia dos agressores que andam armados e em bando nas ruas. A outra é ter que ouvir, frente a frente, a vítima de nossa agressão.
Soma-se a isso a vergonha por conta das câmeras de TV que transmitiam tudo, produzindo conteúdo que será reexibido nos telejornais.
Como resposta, a mesma desculpa de sempre: foi "brincadeira". Brincadeira é termos que discutir homofobia a esta altura do campeonato, na terceira década do século 21. Brincadeira é um empresário sabotar o combate à covid-19, distribuindo informações falsas sobre a doença, bombando ataques ao isolamento social e às vacinas, promovendo inúteis elixires mágicos.
"Sonho com o dia em que não vou ser julgado pela minha orientação sexual, que meus filhos não serão julgados por serem negros, que minha irmã não será julgada por ser mulher", disse Contarato.
Nas redes sociais, ele afirmou que expôs sua família para que outras famílias LGBTQIA+ não sofram o que a dele sofre. Ele tem marido e dois filhos. "O dinheiro não compra dignidade, não compra caráter", concluiu.
Fakhoury acabou se desculpando ao senador e "a quem se sentiu ofendido". Mas a cúpula da CPI pediu à Polícia do Senado a instauração de inquérito sobre o crime de homofobia. Mais tarde, o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), também mostrou postagens do empresário com ataques homofóbicos a ele.
O caso reforça que o bolsonarismo é também uma ilusão de ótica, composto por pessoas que parecem bem maiores quando estão na internet.