Raquel Landim

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Opinião

Haddad e Mantega convenceram Lula a poupar BC, mas ajuste fiscal é incerto

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva estava convencido de que todos que relacionavam os movimentos do dólar às suas falas intervencionistas na economia eram um bando de "cretinos". Foi preciso uma tropa de conselheiros de sua confiança para mudar sua opinião.

A cena é inusitada e só mesmo a recente escalada do dólar para promovê-la. Economistas heterodoxos - que sempre combateram os juros altos e defenderam a política de aumentar os investimentos para alavancar o crescimento - explicando para Lula que quanto mais ele atacasse o Banco Central, pior seria para a inflação.

É claro que Guido Mantega, Eduardo Moreira e Luiz Gonzaga Belluzzo, que participaram com o presidente do jantar na casa do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, na sexta-feira à noite, não morrem de amores por Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central e eleitor declarado de Jair Bolsonaro.

Mas mesmo eles perceberam o que estava óbvio. Quanto mais o dólar se desvalorizava, mais subiam os produtos cotados em moeda americana no país, mais alta ficava a inflação, e pior seria para a popularidade do presidente.

Com a ajuda também de Gabriel Galípolo, que continua cotadíssimo para ser o novo comandante da autoridade monetária, eles conseguiram dizer a Lula que se ele continuasse seguindo os conselhos de alas da extrema esquerda do PT daria um tiro no próprio pé: o pior perdedor seria o próprio governo.

Segundo apurou a coluna, Belluzzo chegou a lembrar de um episódio em que Mantega subiu o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para conter uma escalada de câmbio, uma medida bastante excessiva. No entanto, concordaram os presentes, a situação do Brasil hoje é muito diferente.

As moedas dos países emergentes estão se desvalorizando por causa da relutância do Estados Unidos em cortar os juros. Normalmente, o Brasil, por ter um mercado mais líquido, já teria uma alta mais abrupta do real. Só que a tendência estava excessiva e a culpa era dele: Lula.

Quando ouviu a crítica vinda de amigos e não dos "cretinos", o presidente assentiu e mudou o tom. A resposta foi imediata e o dólar voltou nos últimos dois dias. Depois de bater R$ 5,80 recentemente, atingiu a mínima de R$ 5,466 nesta quinta-feira. O patamar ainda é expressivo. A média dos modelos de inflação dos economistas é de dólar médio de R$ 5,15 neste primeiro semestre.

Também ajudou o mercado a melhorar uma declaração de Haddad sobre o ajuste fiscal. O ministro disse em coletiva de imprensa em Brasília que Lula está comprometido com o ajuste fiscal e que faria um contingenciamento de despesas de R$ 25,9 bilhões em 2025

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O valor é expressivo, mas pairam muitas dúvidas no ar: qual vai ser o tamanho do bloqueio neste ano? como o governo vai conseguir cortar essa despesa? e como será feito o ajuste estrutural da economia brasileira?

Durante o jantar, Lula teria saído convencido de que há gorduras para cortar no Orçamento: pente-fino no INSS, beneficiários inexistentes do Benefício de Prestação Continuada (BPC), fraudes no Bolsa Família. Nada que reinvente a roda, apenas olhar os números com mais detalhe, sem mágica.

Será suficiente? A equipe econômica já fala, por exemplo, em desvincular do salário mínimo, não os pisos de saúde e educação, nem a Previdência, mas outros benefícios, como o seguro-desemprego, e a reação política é enorme.

Haddad vai se balançando na corda bamba, tentando achar um ajuste que não melindre a esquerda e o próprio Lula. A tarefa é difícil, porque, às vezes, a conta simplesmente não fecha e não adianta espernear.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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