Moro passa ao "Jornal Nacional" só um aperitivo leve do que pode vir por aí
Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail
O ex-ministro Sergio Moro foi rápido na tréplica. Embora tenha confessado querer que a PF produza para ele relatórios ilegais, o presidente Jair Bolsonaro negou que pretenda interferir nas investigações da PF. Também acusou Moro de propor uma barganha: aceitaria a demissão de Maurício Valeixo se fosse indicado para o Supremo.
Reproduzo trechos da acusação do presidente. E depois vamos para a resposta de Moro. Afirmou Bolsonaro
E mais, já que ele falou em algumas particularidades, mais de uma vez o senhor Sergio Moro disse pra mim: você pode trocar o Valeixo, sim, mas em novembro, depois que o senhor me indicar para o Supremo Tribunal Federal (STF). Me desculpe, mas não é por aí. Reconheço as suas qualidades em chegando lá, se um dia chegar, pode fazer um bom trabalho, mas eu não troco. E outra coisa, é desmoralizante para um presidente ouvir isso, mais ainda externar, ou não trocar, porque não foi trocado, sugerir a troca de dois superintendentes entre 27.
Pois é. Leiam o que informa o "Jornal Nacional". Volto em seguida:
Após o pronunciamento em que o presidente Jair Bolsonaro afirmou que as acusações do ex-ministro Sergio Moro eram infundadas, o Jornal Nacional cobrou do ex-ministro provas de que elas tinham fundamento. Moro mostrou então a imagem de uma troca de mensagens entre ele e o presidente ocorrida na quinta-feira (23).
O contato é identificado por "Presidente Novíssimo", indicando ser o número mais recente do presidente Bolsonaro.
A imagem mostra que Bolsonaro enviou a Moro o link de uma reportagem do site O Antagonista que diz "PF na cola de 10 a 12 deputados bolsonaristas."
Embaixo, o presidente escreveu: "Mais um motivo para a troca", se referindo à mudança na direção da Polícia Federal.
Sergio Moro respondeu explicando ao presidente que a investigação não tinha sido pedida pelo então diretor da Polícia Federal, Maurício Valeixo. Moro disse: "Este inquérito é conduzido pelo ministro Alexandre no STF", se referindo ao ministro Alexandre de Moraes. Moro prossegue: "Diligências por ele determinadas, quebras por ele determinadas, buscas por ele determinadas." E finaliza dizendo: "Conversamos em seguida às 9", se referindo-se ao encontro que teriam na manhã de quinta-feira (23).
O Jornal Nacional também cobrou de Sergio Moro provas de que ele não havia condicionado a troca no comando da Polícia Federal à sua indicação para o Supremo Tribunal Federal, uma acusação feita pelo presidente Bolsonaro no pronunciamento. O ex-ministro mostrou ao JN a imagem de uma troca de mensagens com a deputada federal Carla Zambelli, do PSL, aliada de primeira hora de Bolsonaro. Ela inclusive estava nesta sexta-feira (24) ao lado do presidente durante o pronunciamento.
Carla Zambelli diz: "Por favor, ministro, aceite o Ramage", uma referência a Alexandre Ramagem, diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência, Abin. Ramagem é um dos candidatos de Jair Bolsonaro para assumir a direção da Polícia Federal.
Parte da deputada a proposta para que Sergio Moro aceite a mudança na PF em troca da nomeação dele para o Supremo Tribunal Federal. Ela diz: "E vá em setembro para o STF. Eu me comprometo a ajudar. A fazer o JB - iniciais de Jair Bolsonaro - prometer."
Sergio Moro rechaça a proposta: "Prezada, não estou à venda." Carla Zambelli continua a argumentar: "Ministro, por favor... milhões de brasileiros vão se desfazer."
Em seguida ela responde à mensagem de Moro de que não estaria à venda: "Eu sei. Por Deus eu sei. Se existe alguém no Brasil que não está a verba é o senhor." Verba aqui parece ser venda, com erro de digitação.
Moro finaliza a conversa dizendo: "Vamos aguardar, já há pessoas conversando lá." Segundo o ex-ministro, era uma referência à tentativa de aliados de convencer o presidente a mudar de ideia.
A deputada Carla Zambelli disse que não vai comentar a troca de mensagens com o ex-ministro.
COMENTO
Só faço um reparo nos termos, embora entenda que, em certa medida, o procedimento pode ser parte do ofício. Não creio que o "Jornal Nacional" tenha "cobrado provas" de Moro sobre a acusações que este fez contra Bolsonaro porque tal cobrança, quando houver, caberá à Justiça. Tampouco faria sentido cobrar que provasse ser falsa a afirmação de que ele, Moro, condicionara a saída de Maurício Valeixo a uma indicação para o Supremo. Nem é pertinente aí a palavra "prova" porque tal negociação, se tivesse existido, crime não seria, embora pouco republicana.
Para lembrar: Moro confessou, sim, crimes. Conviria que se explicasse. Mas são outros.
A mim me parece que o ex-juiz tomou a iniciativa de passar as evidências para o Jornal Nacional, desmoralizando, de imediato, a fala do presidente, agora e oficialmente, um oponente seu — pessoal e, por que não dizer?, eleitoral.
Mais: observem que as duas trocas de mensagens que Moro repassou ao JN são recentíssimas. Ele ficou 16 meses no governo. Não parece que o presidente seja notável por exercitar a arte da prudência.
Bolsonaro dispõe de uma máquina gigantesca na Internet para cantar as suas glórias e daqueles que ele elege como seus aliados. E, por óbvio, para satanizar adversários.
Moro, por sua vez, tem pós-doutorado na arte de gerar notícia positivas para si e negativas para aqueles com os quais decide terçar armas. Conhece ainda como poucos — e até já escreveu a respeito, num pequeno ensaio sobre a Operação Mãos Limpas — a tecnologia de vazamento de informações.
Certamente vem mais coisa por aí. Até porque o STF certamente vai abrir uma investigação.