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Reinaldo Azevedo

Lavajatismo: Fachin nega a Lula o que Justiça liberou a procurador flagrado

Diogo Castor de Mattos, Edson Fachin e trecho do despacho do juiz que dá ao procurador acesso a dados da Operação Spoofing, o que ministro do STF negou a Lula - Reprodução; Rosinei Coutinho/SCO/STF; Reprodução
Diogo Castor de Mattos, Edson Fachin e trecho do despacho do juiz que dá ao procurador acesso a dados da Operação Spoofing, o que ministro do STF negou a Lula Imagem: Reprodução; Rosinei Coutinho/SCO/STF; Reprodução

Colunista do UOL

05/08/2020 06h44

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Email inválido

Enquanto os idiotas se juntam aos nefelibatas e desinformados em defesa do não-compartilhamento com a PGR dos arquivos da Lava Jato — e todos eles já são cabos eleitorais voluntários ou involuntários da pré-campanha de Sergio Moro à Presidência —, coisas do arco da velha vão acontecendo a indicar, mais uma vez, que a força-tarefa e suas consequências fizeram do país uma terra praticamente sem lei. Prestem atenção a este relato. Lembram-se da tal Operação Spoofing?

Foi deflagrada para chegar às pessoas que hackearam as mensagens, trocadas por intermédio do Telegram, entre procuradores da Lava Jato e entre ao menos um deles, Deltan Dallagnol, e o então juiz Sergio Moro. A 10ª Vara Federal do DF tem a custódia do material apreendido, compartilhada com o STF. Dois ministros do tribunal requisitaram uma cópia do conteúdo do hackeamento: Alexandre de Moraes e Luiz Fux. Não percam o fio.

MEMÓRIA RÁPIDA
O fato é conhecido. Os responsáveis pela invasão procuraram o site The Intercept Brasil para entregar o material que haviam colhido. Como se tratava de assunto de altíssima relevância e que dizia respeito ao interesse público, o TIB e parceiros da imprensa publicaram uma série de reportagens evidenciando a impressionante cadeia de ilegalidades e de armações que uniu procuradores da Lava Jato e Sergio Moro, então titular da 13ª Vara Federal de Curitiba. Eles estavam numa caçada, dando de ombros para a lei. A presa principal era Lula, mas não a única.

Uma nota antes que avance: a invasão do Telegram é um ato ilegal, como ilegais foram todos os vazamentos de investigações sigilosas praticados pela Lava Jato e que inundaram e inundam a imprensa ao longo de seis anos. Tanto a publicação do conteúdo das conversas, que irritou a Lava Jato, como a daqueles vazamentos que faziam a alegria dos procuradores nada têm de ilegal. E, ainda assim, não são coisas equivalentes. O site não orientou os hackers, como resta comprovado. Já a publicação de vazamentos de investigação sigilosa nasce necessariamente de uma combinação entre jornalistas e procuradores ou delegados. Adiante.

ACESSO AO CONTEÚDO
A defesa de Lula recorreu ao Supremo com dois habeas corpus: um deles pede a suspeição do então juiz Sergio Moro; outro, a dos procuradores. Ambos antecedem a publicação das reportagens com os diálogos comprometedores. E é evidente que a defesa pediu que estes fossem apensados às respectivas petições já que são a prova inquestionável da suspeição. Nota à margem: já há dois votos contra a suspeição do ex-juiz, dados por Edson Fachin e Carmen Lúcia em dezembro de 2018, antes da Vaza Jato. Acompanharam até aqui? Vamos seguir.

PEDIDO NEGADO
Os advogados de Lula entraram com um pedido no Supremo no dia 2 deste mês para ter acesso ao conteúdo do material colhido pela Operação Spoofing. Edson Fachin, o rei do punitivismo, negou. Entenderam? Embora o ex-presidente seja o principal interessado naquele conteúdo, já que a parte conhecida ao menos indica uma espécie de conluio entre juiz e procuradores para condená-lo, com um conjunto impressionante de ações ilegais, o ministro deu de ombros para a requisição da defesa.

E por que os advogados do ex-presidente entraram com o pedido? Agora vem o mais impressionante: porque, acreditem, um dos procuradores flagrados nas conversas indecorosas, Diogo Castor de Mattos, recorreu à 10ª Vara Federal do DF para ter acesso a parte do material que, para todos os efeitos, está sob sigilo. E, acreditem!, ele conseguiu!

PEDIDO E CONCESSÃO
Solicita o advogado do procurador:
A defesa de Diogo Castor de Mattos requer acesso aos autos e especificamente aos seguintes documentos: laudo pericial que comprova a invasão do celular do procurador Diogo Castor de Mattos e um mensagem específica trocada entre o Procurador da República José Robalinho e o hacker (que estava usando o celular do conselheiro do CNMP Marcelo Weitzel) no dia 12/06/2019 (id 233528377)

E o juiz Ricardo Augusto Soares Leite decidiu no dia 5 de junho:
"Defiro. A autoridade policial deverá disponibilizar à defesa de Diogo Castor de Mattos o acesso ao laudo pericial que comprova a invasão do celular do procurador Diogo Castor de Mattos (...)"

PERÍCIA
Eis aí: desde que o material da Vaza Jato começou a ser publicado, Moro e os procuradores se escondem num lugar impossível: não admitem a veracidade do conteúdo, mas também não a negam. Como se nota, o juiz franqueia o acesso ao que chama "laudo pericial que comprova a invasão". Então há uma perícia. E a solicitação corresponde à admissão tácita de que o conteúdo publicado pela Vaza Jato é verdadeiro -- como, de resto, sempre foi evidente.

O conjunto da obra revela, mais uma vez, o papel que desempenha o ministro Edson Fachin como uma espécie de procurador da Lava Jato no Supremo. De um juiz, espera-se, como é óbvio, que seja o que Moro nunca foi na Lava Jato: imparcial. E, como se revela também nesse episódio, não é diferente com Edson Fachin. Abre mão de seu papel de magistrado para ser guardião da Lava Jato e, por consequência, queira ele ou não, de suas ilegalidades.

O homem, sem dúvida, está fazendo história.