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Reinaldo Azevedo

Em favor da Lava Jato, "Fux-we-trust" já impôs censura à Folha contra Lula

Luiz Fux, presidente do Supremo. Não tem a mão de Deus... Se o Altíssimo tivesse um topete, talvez estivéssemos diante de uma tentativa malsucedida de emulação - Marcelo Camargo/Agência Brasil/ND
Luiz Fux, presidente do Supremo. Não tem a mão de Deus... Se o Altíssimo tivesse um topete, talvez estivéssemos diante de uma tentativa malsucedida de emulação Imagem: Marcelo Camargo/Agência Brasil/ND

Colunista do UOL

08/10/2020 06h47

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O ministro Luiz Fux é mesmo um amigão da Lava Jato. Reproduzo abaixo, em azul, post que publiquei neste blog no dia 12 de junho do ano passado.

Trata daquela conversa de Deltan Dallagnol com seus pares — e com o então juiz Sergio Moro — depois de um encontro do procurador com o ministro. Avaliem vocês mesmos.

Em favor da Lava Jato, Fux chegou até a impor dois modos de censura à Folha:
- proibiu o jornal de entrevistar Lula na cadeia:
- proibiu a publicação caso a entrevista já tivesse sido realizada.

Ele o fez com base em que lei? Em nenhuma.

Feriu os Artigos 5º e 220 da Constituição.

Às vezes, a gente fica com a impressão de que, em matéria de Lava Jato, o ministro faz qualquer coisa. Parece até que nem é dono de sua vontade, tais os absurdos que perpetra. Fica-se com a impressão de que os procuradores têm o domínio do seu querer.

Seria alguma forma de abdução?

Segue a reportagem.

*
O site "The Intercept Brasil" passou a este jornalista trecho de uma conversa do procurador Deltan Dallangol com um grupo de procuradores. No dia 22 de abril de 2016, ele relata um encontro que manteve com Luiz Fux, ministro do Supremo. Explicam-se as circunstâncias: o então juiz Sérgio Moro tinha sido repreendido publicamente pelo ministro Teori Zavascki, relator do petrolão no tribunal, por ter divulgado trecho de um grampo duplamente ilegal que trazia um diálogo entre Dilma Rousseff, presidente da República à época, e Luiz Inácio Lula da Silva. Dallagnol deixa claro que ele e Fux conversaram sobre o assunto.

Transcrevo as mensagens do procurador a seus pares, que foram depois retransmitidas a Moro, que deu uma resposta. Leiam:

13:04:13 Deltan Caros, conversei com o FUX mais uma vez, hoje

13:04:13 Deltan Reservado, é claro: O Min Fux disse quase espontaneamente que Teori fez queda de braço com Moro e viu que se queimou, e que o tom da resposta do Moro depois foi ótimo. Disse para contarmos com ele para o que precisarmos, mais uma vez. Só faltou, como bom carioca, chamar-me pra ir à casa dele rs. Mas os sinais foram ótimos. Falei da importância de nos protegermos como instituições

13:04:13 Deltan Em especial no novo governo

A mensagem é retransmitida a Sérgio Moro, que responde:

13:06:55 Excelente. In Fux we trust

Em português: "Confiamos em Fux" E responde Dallagnol em "kakakês":
13:13:48 Deltan Kkk ...

COMENTO
Há algum crime aí? Não. Ignoro, no entanto, o conteúdo da conversa "boa". Mas o que se constata claramente é um ministro do Supremo a condescender com a prática ilegal de um juiz. Mais do que condescendência, segundo as palavras de Dallagnol, o que se tem claramente é o endosso e o incentivo à ilegalidade.

O que terá querido dizer Fux quando asseverou que os procuradores e o juiz podiam "contar" com ele. Poder-se-ia dizer: "Ora, Reinaldo, contar com seu apoio na garantia das leis". Ocorre que Dallagnol está relatando justamente o contrário. Fux estava tratando de forma depreciativa um colega — Teori Zavascki — que havia feito uma clara repreensão ao juiz por ter cometido uma ilegalidade.

A repreensão oral, diga-se, foi coisa pouca, dada a gravidade do caso. O "americanófilo" Moro teria sido preso segundo a legislação vigente nos EUA. A CONFIANÇA Quem se dá a certos desfrutes não consegue ter o respeito pleno nem de aliados. Nota-se que Dallagnol trata o ministro de forma jocosa, não é?, quando diz que só faltou a Fux convidá-lo para uma visita.

A resposta de Moro vem igualmente carregada pela ironia, mas também traduz a certeza de que tudo lhe é permitido, muito especialmente afrontar a lei em nome da causa. A conversa revela algo ilegal? Não! Trata-se apenas de troço vergonhoso, que, mais uma vez, indica a falta de isenção de membros do Judiciário — nesse caso, de um integrante da Corte máxima — para lidar com o assunto.

Insista-se: Fux está a endossar uma ilegalidade num ambiente que lembra, tudo indica, uma conversa entre compadres.

ENTREVISTA DE LULA
A "confiança" em Fux fazia sentido. Foi o ministro que, agredindo os artigos 5º e 220 da Constituição, proibiu não apenas que Lula desse entrevista como que a Folha a publicasse caso já tivesse sido realizada. Como deixam claro conversas entre procuradores, reveladas por "The Intercept Brasil", temia-se que eventual entrevista pudesse favorecer o petista Fernando Haddad na disputa eleitoral. In Fux they trust.

PASSADO
Como esquecer? Fux é o homem que foi indicado por Dilma para o Supremo depois de prometer "matar no peito" o caso José Dirceu -- promessa que nem cumpriu, é verdade. Também é a personagem que beijou os pés de Adriana Ancelmo, mulher de Sérgio Cabral, por ocasião da indicação. Era sinal de agradecimento. Além de ser amigo pessoal da doutora, pesou em favor de seu nome o apoio do então superpoderoso governador. A ética da dupla já era a mesma.

Também beijar pés não é crime. Ou só prometer "matar no peito" a bola.

Pergunta-se sobre esses dois casos, a exemplo da conversa com Dallagnol: "É decente?"

Fux é hoje uma das vozes do punitivismo no Supremo. Em nome da moral e dos bons costumes.

Como se vê.