Bolsonaro ataca EUA de Biden, China, Europa e Argentina. Chamem Borat!
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Jair Bolsonaro não se comporta como um presidente da República, mas como um arruaceiro. Não por acaso, na reunião desta terça com os chefes de Estado dos Brics (Brasil, Rússia, índia, China e África do Sul), recebeu um estranho elogio de Vladimir Putin, o quase-ditador da Rússia, que exaltou a sua "masculinidade". No encontro virtual, esse homem másculo anunciou que vai divulgar uma lista de países europeus que compram madeira ilegal do Brasil. Aproveitou ainda a ocasião para fazer um ataque indireto à China, maior parceiro comercial do país.
No dia 10, Bolsonaro já havia ameaçado com pólvora Joe Biden, presidente eleito dos EUA, o que ele ainda não reconheceu. Hostiliza com frequência a Argentina, maior parceira da indústria brasileira, cuja participação na produção global recuou de 1,28% em 2018 para 1,19% em 2019. Até 2014, o país estava no ranking dos 10 maiores na área. Despencou para 16º. E daí? Bolsonaro quer briga. Logo estaremos negociando de igual para igual com a Belarus e o Turcomenistão. Ou com o chefão de Borat.
O presidente decidiu dar uma resposta aos países que apontam o desmatamento no Brasil. Afirmou:
"A nossa Polícia Federal desenvolveu um método para permitir a localização da origem de madeira apreendida. Não apenas apreendida, mas o mais importante: a exportada também. Estaremos revelando, nos próximos dias, países que têm importado madeira extraída de forma ilegal da Amazônia".
Ele se referia à Operação Arquimedes, que teve uma primeira etapa ainda em 2017 e apreendeu madeira ilegal que seria vendida para empresas da Alemanha, Bélgica, Dinamarca, França, Itália, Holanda, Portugal e Reino Unido. Não citou os países, mas fez a ameaça. Já havia lançado a mesma acusação em uma "live".
No começo do mês, naquela expedição guiada de embaixadores à Amazônia, houve uma parada na Superintendência da PF em Manaus. Os embaixadores ouviram, então, uma preleção de um delegado, com direito a filminho, acusando os europeus de responsáveis pelo desmatamento no Brasil.
É evidente que não é assim que se faz. Se organismos de fiscalização por aqui detectam que empresas estrangeiras participam do comércio irregular, o certo é que a diplomacia entre em ação e que órgãos policiais troquem informações. Chefes de Estado não fazem ameaças. Mais: a madeira extraída do solo brasileiro, legal ou ilegal, é consumida no mercado interno — entre 85% e 90%. O que sobra é exportado. Logo, a demanda estrangeira não pode responder pelo desmatamento.
De toda sorte, poderíamos estar aqui a falar de um governo exemplar, rigoroso na punição de infratores. Mas o que se tem é precisamente o contrário. Em fevereiro, o presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim, assinou uma portaria dispensando a emissão de certificado do instituto para a exportação de madeira. Bolsonaro pôs fim à destruição de equipamentos e veículos de madeireiros ilegais.
Recentemente veio à luz um documento com a chancela do Conselho Nacional da Amazônia, presidido por Hamilton Mourão, o vice, listando possíveis ações contra o desmatamento e as queimadas. Um dos itens tratava da expropriação de "propriedades rurais ou urbanas acometidas de crimes ambientais decorrentes da grilagem ou de exploração de terras públicas sem autorização". O másculo teve um surto e ameaçou com demissão quem tocasse no assunto.
CHINA
Bolsonaro aproveitou a reunião também para exaltar a suposta superioridade do seu governo no combate à Covid-19 e voltou a fazer carga contra a Organização Mundial da Saúde num contexto em que criticava a suposta politização da doença. O ataque nada velado, que secunda ataques feitos pelo quase ex-presidente dos EUA e possível futuro presidiário, Donald Trump, era dirigido à China.
Xi Jinping, o presidente chinês, já havia feito a defesa de organismos multilaterais, inclusive da OMS, e citou indiretamente a vacina Coronavac, desenvolvida em parceria com o Estado de São Paulo. Defendeu ainda a adesão ao Acordo de Paris, também hostilizado pelo governo brasileiro.
Hoje Bolsonaro é um dos chefes de Estado mais isolados do mundo. Estamos sendo governados por uma caricatura. Resta um admirador: Putin. Não aprecia exatamente as clarividências do capitão, mas a sua, como disse, "masculinidade". É preciso mesmo ser muito macho para comprar brigas estúpidas com o futuro governo dos Estados Unidos, com a China, com a Europa e com a Argentina. Tudo ao mesmo tempo e sem motivo.