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Reinaldo Azevedo

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

OS ERROS 3: PT põe sua candidatura sem candidato na rua e chama: "Venham!"

Fernando Haddad e Lula: ex-presidente pede a candidato do partido em 2018 que comece a andar pelo país. Não houve conversa com outras forças de esquerda - Edilson Dantas / Agência O Globo
Fernando Haddad e Lula: ex-presidente pede a candidato do partido em 2018 que comece a andar pelo país. Não houve conversa com outras forças de esquerda Imagem: Edilson Dantas / Agência O Globo

Colunista do UOL

11/02/2021 06h37

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Volta e meia um petista ou outro dizem: "Ah, o PT poderia, sim, apoiar o nome do candidato de um outro partido já no primeiro turno". Nunca nenhum petista ou não petista acreditaram nisso. É pura retórica. E não serei eu aqui a dizer que a legenda não tem o direito de fazê-lo. Noto apenas que não se vivem os anos pré-2002, quando o partido crescia a cada eleição, como a acumular forças para um dia chegar lá — e chegou — nem os anos superpoderosos pós-2002, quando, por óbvio, nem fazia sentido imaginar que pudesse apoiar uma postulação fora da legenda. Com a Lava Jato, veio a derrocada, de que o impeachment de Dilma é um capítulo. A realidade é outra.

Sim, o partido conseguiu um desempenho notável em 2018, dadas as circunstâncias. Já ali se perguntava se não fazia sentido a legenda apoiar um outro nome de esquerda — na verdade, Ciro Gomes (PDT) —, mas o partido escolheu juntar a eleição com a resistência à condenação sem provas de Lula e à sua prisão.

Preso e, por óbvio, inelegível, o ex-presidente lançou o nome de Fernando Haddad, que passou muito longe de uma humilhação eleitoral. Ao contrário: em eleição nacional, não se conhece ninguém que tenha tido antes ascensão tão rápida. Mas houve uma conjuração de forças antipetistas em favor de Bolsonaro. São Paulo, por exemplo, assistiu ao voto "Bolsodoria". Com facada, indústria criminosa de fake news e o hábil manejo do antipetismo, marchamos para a terra dos mortos.

Muito bem! Eis que Lula decide entrar no ringue desde já, mas não se lançando candidato. Mais uma vez, escalou Haddad, o que parece bastante razoável, dado o seu desempenho na eleição anterior. O ex-prefeito e ex-ministro da Educação, por seu turno, assegura, ainda dentro da metafísica petista, que o ex-presidente tem de recobrar seus direitos políticos e que, nesse caso, será ele o nome do PT caso queira disputar.

A jornada de Lula rumo a uma eventual candidatura é longa. Mesmo que a Segunda Turma do STF cumpra a sua obrigação legal e ética e declare a suspeição de Sergio Moro, a condenação no caso do tríplex está anulada, mas não a do sítio, o que manteria Lula inelegível. O recurso em votação é um habeas corpus no âmbito de uma ação penal. Não terá efeito em outra. Sim, também a condenação no caso do sítio se deu sem provas, num processo ainda mais viciado. E foi o suspeito Moro quem admitiu a denúncia e o fez réu. Mas essa será uma batalha nova.

Parece-me, ademais, que, ainda que Lula venha a se livrar a tempo das duas condenações, tornando-se elegível, não faria essa escolha. Seria já monumental para ele que se tornasse um eleitor dos mais influentes. Na cadeia, conseguiu pôr Haddad no segundo turno. Fora dela e livre de condenações, não teria por que não transferir a quase totalidade dos votos que lhe caberia. Acontece... Acontece....

Acontece que 2022 não será 2018. Diria que 2020 já não é. Se a reação a Bolsonaro é grande, o número de fanáticos logo à partida é maior hoje do que antes, e nada faz crer que possa diminuir muito até o pleito. Bolsonaro, ainda que eu possa achar exótico, desperta paixões fanáticas. Em dois anos, teremos uma população imunizada, e a economia não estará vivendo, supõe-se, esse vale de lágrimas, ainda que o estrago seja grande e de longo prazo.

Haddad, com seus modos sempre muito caroáveis, concedeu uma entrevista em que antevê uma nova batalha final entre um nome do PT e Bolsonaro. Isso se traduziu na afirmação de que, segundo ele, o antibolsonarismo é mais forte do que antipetismo. Em princípio, também me parece assim. Mas é preciso, agora com o foco na esquerda e na centro-esquerda, que se faça um esforço para unir essas correntes do eleitorado. Se não for no primeiro turno, que seja no segundo. Mas isso começa já.

Mesmo que se anteveja um segundo turno entre o bolsonarismo e a esquerda-centro-esquerda — convenham: há outro cenários plausíveis —, entendo que o lançamento da candidatura de Haddad (com ou sem a alternativa Lula) deveria ter sido antecedido de uma conversa com as chamadas "forças progressistas" — ou que nome queiram dar.

Há uma certa arrogância, ainda que bastante mitigada pelo perfil de Haddad, em se lançar à frente, como a dizer: "Sigam-nos os que forem contra Bolsonaro".

Parece-me também um erro. E que se note: não aponto aqui o que chamo "erro" como quem sabe qual é a receita da esquerda para vencer a eleição. Não sou de esquerda. Posso ler o jogo, mas não incorporar a metafísica. Parece-me não ser o melhor caminho para enfrentar o bolsonarismo, uma vez que isso cria dissensões no espectro ideológico que tem de estar unido ao menos na forma de combater Bolsonaro, ainda que com candidaturas distintas. E, nesse caso, é dispensável dizer, porque óbvio, que, unido desde a partida, o campo progressista teria muito mais chance de vencer a batalha.

O movimento de Lula indica, no entanto, que ele não considera essa união possível. E, claro!, isso conta a favor daquele que, de tonto, só tem o andado.