Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
CNT-MDA- Nº mais relevante: para quase metade, prioridade é bater Bolsonaro
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Se as coisas vão ou não tomar outro rumo para Jair Bolsonaro, aí só mesmo com bola de cristal. Os elementos em curso não o autorizam a ser muito otimista. A economia voltou a crescer, mas ainda demora para que a vida dos mais pobres tenha uma melhora substancial. As acusações de corrupção se adensam, e o presidente parece sentir especial prazer em alimentar a crise.
A pesquisa CNT/MDA divulgada nesta segunda é péssima para o presidente sob qualquer ângulo que se queira. Há uma batelada de números que está a indicar isso. Mas há dois, aos quais se presta menos atenção, que são, de certo modo, os mais relevantes: para nada menos do que 45,1% dos entrevistados, o mais importante é que Bolsonaro não seja reeleito. Isso quer dizer já chegam perto da metade os eleitores que, de saída, se mostram dispostos a fazer qualquer opção para que ele perca. Só 27,7% dizem a mesma coisa sobre o ex-presidente Lula. Para 21,2%, o mais relevante é que não vença nenhum dos dois.
Se o eleitor é instado a uma opção afirmativa, aí 40,3% dizem preferir que Lula ganhe, contra 25,1% que afirmam o mesmo sobre Bolsonaro. Já 30,1% acham que o desejável é que não vençam nem um nem outro. Se Bolsonaro quiser um alento, está aqui: dadas a espantosa ruindade de seu governo e a gestão desastrada da pandemia, não deixa de ser um alento que ainda conte com um quarto do eleitorado. Mas uma conclusão se extrai daí: no embate direto com Lula, a sua desvantagem é grande.
REJEIÇÃO E TERCEIRA VIA
Também os números sobre a rejeição são ruins para o atual mandatário. Não votariam nele de jeito nenhum 61,8% dos entrevistados. Votarão nele (22,8%) ou poderiam votar (11,6%) 34,4%. Números animadores? Não em contraste com os de seu antípoda: a rejeição a Lula é a menor entre os testados: 44,5%. E chegam a 52,5% os que votarão nele com certeza (35,4%) ou poderiam votar (17,1%).
Por enquanto, não surgiu um nome que seduza o eleitorado como alternativa, como expressão da chamada terceira via. Parece até haver demanda para isso. Vamos ver. Dizem que gostariam que ganhasse um candidato que não fosse ligado nem a Bolsonaro nem a Lula 30,1%. Para 21,1%, o mais importante, na próxima eleição, seria que não vencessem nem o atual presidente nem o petista. Ocorre que, até agora, não desponta uma alternativa óbvia.
Na pesquisa espontânea, que costuma indicar votos realmente consolidados, Lula lidera com 27,8%, seguido por Bolsonaro, com 21,6%. O terceiro colocado está a uma enorme distância: Ciro Gomes (PDT) aparece com 1,7%. Sergio Moro (sem partido) e João Doria marcam 0,7%.
Na pesquisa estimulada, Lula rompeu a casa dos 40%: 41,3%. E Bolsonaro agrega muito pouco em relação ao voto espontâneo, o que aponta ser, por ora, o candidato de uma bolha de opinião: 26,6%. Ciro e Moro alcançam 5,9%. Doria marca 2,1%, e Luiz Henrique Mandetta (DEM), 1,8%.
Fica difícil imaginar um Lula fora do segundo turno. Mas se nota que a consolidação de um nome da terceira via não é tarefa corriqueira. Para começo de conversa, seria preciso haver uma só alternativa aos dois líderes, e hoje não parece que isso seja possível. Mais: os eleitores de todos eles, tão desiguais entre si, teriam de realmente concordar com o escolhido para representar essa alternativa, e seria preciso ainda tirar votos dos líderes. Como esse suposto nome único estaria necessariamente à direita de Lula, o mercado mais promissor estaria no eleitorado de Bolsonaro e entre os indecisos.
Em tese, insista-se, não é tarefa impossível: 30,1% expressam desejo por um terceiro nome; 21,2% rejeitam os dois líderes. Moro não será candidato. Se for, mais divide do que soma. Parece pouco provável que surjam nomes novos. Nessa fase de pré-candidatos, há ainda Eduardo Leite, que pretende disputar com Doria a vaga de candidato do PSDB.
CANDIDATO ABSTRATO, NOME REAL E POTENCIAL DE VOTO
Nota-se, por ora, que a personagem abstrata de que fala parte do eleitorado ainda não se encontrou com uma do mundo real. Conta ainda contra os nomes postos -- eis algo relevante a ser trabalhado -- uma rejeição muito alta para potencial eleitoral tão baixo. Dizem que não votariam em Doria 57,9% dos entrevistados, contra 1,5% que o fariam com certeza e 16,5% que poderiam fazê-lo: 18% ao todo. Moro é o terceiro mais rejeitado: 56,7% jamais sufragariam seu nome, em contraste com 4,4% que o escolheriam na certa e 24,7% que talvez o fizessem: 29,1%. Ciro é rejeitado por 52,4%; já 4,3% o têm como a opção, e 26,2%, como uma possibilidade, somando 30,5%. Só 1,2% dão como certo voto em Mandetta, e 13,3% poderiam fazer essa escolha: um potencial de voto de 14,5% para uma rejeição de 51,5%.
Muita coisa vem por aí, é certo, e a campanha ainda não começou — a não ser para Bolsonaro, que nunca desceu de seu palanque golpista. Que o cenário é muito pouco auspicioso para uma terceira via, isso é fato. Os números de todas as pesquisas o evidenciam.
SEGUNDO TURNO E BOLSONARO POUCO AGREGADOR
Se a disputa fosse hoje, Lula daria uma surra eleitoral em Bolsonaro no segundo turno: 52,6% a 33,3%. Observe-se que o petista ganha 12,3 pontos em relação a seu percentual do primeiro turno, e Bolsonaro, apenas 6,7%. Vale dizer: embora todos os outros nomes estejam à direita do ex-presidente, é ele que recebe a maior parte dos eleitores daqueles hoje identificados com a terceira via. Também isso evidencia que Bolsonaro vai se caracterizando como um candidato de trincheira.
Ciro também bateria Bolsonaro: 43,2% a 33,7%. Observem que o candidato do PDT ganharia muitos milhões de votos (afinal, marcou apenas 5,9% no primeiro turno), ainda que tivesse 13,4 pontos a menos do que Lula. Bolsonaro, no entanto, fica praticamente no mesmo lugar, pouco importando se o adversário é o petista ou o pedetista. Dória aparece em empate técnico com o atual presidente, mas numericamente atrás: 33,5% a 36,3%.
Esse baixo potencial de crescimento de Bolsonaro no segundo turno já estava dado em 2018, note-se. Mas aí veio o que veio: o candidato que liderava — Lula — não pôde disputar porque condenado sem provas por um juiz suspeito e ilegítimo, o que foi referendado em segundo grau, e Adélio Bispo dos Santos fez o resto do serviço.
Daí que todo cuidado seja pouco. A esta altura, deve haver muitos espíritos de porco a delirar com eventos excepcionais porque sabem que a normalidade democrática lhes é adversa.