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Reinaldo Azevedo

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Por que chora Bolsonaro? Funcionando o estado de direito, chora de medo!

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Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

05/12/2022 15h51

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Não. Eu não li "Quando Nietzsche Chorou". Certos livros me pegam pelo avesso. Nem sei direito do que trata o dito cujo. Leio aqui: "Mistura ficção e realidade"... Tá bom. "Para tão longo amor tão curta a vida", escreveu o poeta caolho. E, sei lá, talvez eu devesse me interessar pelas vezes em que Bolsonaro chorou. Mas também não.

Aconteceu de novo. Ele interrompeu a greve e participou, nesta segunda, de uma cerimônia de cumprimento a oficiais-generais no Clube Naval de Brasília e depois de um almoço oferecido pelos promovidos. Enxugou as lágrimas enquanto era cumprimentado. Nas fotos, aparece com cara de quem teve o pirulito roubado. Mas isso também é falso. O doce estava em disputa, e ele perdeu. Crianças birrentas choram, se jogam no chão, esperneiam, espalham muco nasal e baba à sua volta. Adultos, quando chefes de Estado, têm de se ater à Constituição. Sem babar.

Participaram da solenidade os generais Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria-Geral da Presidência), Braga Netto e Paulo Sérgio Nogueira, ministro da Defesa, além dos comandantes Freire Gomes (Exército), Baptista Júnior (Aeronáutica) e Almir Garnier (Marinha). Os três primeiros são da reserva.

Há uma absurda e inédita tensão militar no fim do governo. Até outro dia, os comandantes militares articulavam uma inédita entrega do cargo antes da posse do novo presidente. O Alto-Comando do Exército, num rasgo de responsabilidade, se opôs. Ainda não é certo que Baptista Júnior, da Aeronáutica, tenha se convencido da inconveniência da afronta.

Há gente de choro difícil. Não é, por exemplo, o meu caso. Um filme pode me levar às lágrimas, assim como gestos de solidariedade que vejo, muito especialmente os oriundos daqueles que, às vezes, têm numa reserva de egoísmo quase que sua única chance de sobrevivência. E, ainda assim, se doam.

Bolsonaro chora por quê? Dadas a mediocridade de sua carreira política e as barbaridades que jogou ao vento ao longo de 27 anos, as circunstâncias lhe sorriram — e também aos filhos. Mau militar, migrou para a carreira política e chegou à Presidência num combinado de eventos que levou o país à lona administrativa, ambiental, legal, ética e moral.

Na disputa eleitoral, fraudou à vontade as regras do jogo e, tudo indica, contava com uma virada de mesa, que não veio, em caso de derrota. Na verdade, ele chegou a ameaçar a realização de eleições. Enquanto Eduardo, o filhote, leva supostos "pen drives" para passear no Qatar, alimenta com seu silêncio o delírio golpista de uma minoria de ensandecidos.

Chora por quê? Melancolia? Frustração? Raiva? No fim das contas, nada disso é da nossa conta. De um presidente da República, espera-se que cumpra os mandamentos constitucionais e que não estimule a desordem.

A Presidência da República não é um assunto privado. Que se restabeleça e que a Justiça Brasileira cumpra o seu papel. Bolsonaro tem muitas explicações a dar. Talvez tema que o estado de direito funcione a contento. E, nesse caso, chora de medo.