STF libera inquérito sobre José Serra no dia da prescrição
Resumo da notícia
- Ministério Público Eleitoral de SP agora corre contra o tempo para evitar arquivamento da apuração sobre crime eleitoral do senador do PSDB
- Senador é investigado por suposto caixa dois de R$ 5 milhões na campanha eleitoral de 2014; em setembro, STF acolheu pedido da defesa e avocou o caso
Faltando poucas horas para a prescrição da acusação de crime eleitoral, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu devolver para a Justiça Eleitoral de São Paulo o inquérito que estava na Corte desde 10 de setembro e que investiga o senador José Serra (PSDB-SP) por um suposto caixa dois de R$ 5 milhões nas eleições de 2014.
A decisão do ministro relator do caso no Supremo, Gilmar Mendes, é datada de 29 de outubro e só nesta terça-feira (3) entrou no sistema de acompanhamento processual do tribunal. A prescrição ocorre nesta quarta-feira (4). O caso está no STF porque o ministro acolheu um pedido da defesa e avocou o processo, isto é, chamou os autos para sua análise, o que provocou a sua paralisação.
Agora o MPE (Ministério Público Eleitoral) de São Paulo corre contra o relógio. Depois de ser intimado, o que não havia ocorrido até às 16h30, o órgão tem até o final desta quarta-feira (4) para apresentar uma eventual denúncia.
A peça ainda ainda precisa ser aceita pela Justiça Eleitoral. Só assim a contagem do prazo de prescrição poderá parar. A prescrição ocorre quando a Justiça não consegue, em tempo hábil, processar uma acusação contra uma pessoa, que a partir daí não pode mais ser acusada daquele suposto crime.
Caso uma eventual denúncia do MPE não seja feita ou não seja acolhida até o final desta quarta-feira, Serra deverá se livrar da possibilidade de punição por suposto crime de falsidade eleitoral previsto no artigo 350 do Código Eleitoral.
A prescrição do crime apurado pelo MPE normalmente ocorreria em 12 anos. Mas como Serra tem mais de 70 anos de idade, o prazo conta pela metade.
Acusação aponta caixa 2 na campanha de Serra em 2014
Segundo o MPE, o senador omitiu à Justiça Eleitoral, na campanha ao Senado em 2014, o recebimento das receitas em caixa dois ordenadas pelo empresário José Seripieri Júnior, fundador, ex-presidente e controlador da empresa de planos de saúde Qualicorp.
É possível, a depender de uma análise mais detalhada do MP, que a investigação, mesmo se declarada prescrita sobre o crime eleitoral, possa continuar em relação a Serra sobre outros possíveis crimes além do eleitoral, ainda não prescritos, como corrupção e lavagem de dinheiro. O inquérito também deverá continuar sobre outros investigados.
O cálculo sobre a data exata da prescrição do crime eleitoral foi apresentado ao STF no último dia 16 de outubro pelo procurador-geral da República, Augusto Aras. Havia dúvidas se a prescrição já havia ocorrido em setembro. Em ofício, Aras esclareceu que o prazo se esgotaria hoje, 4 de novembro, e, por isso, pediu "com urgência, face à iminência do prazo prescricional do crime de falsidade ideológica eleitoral", a devolução dos autos para São Paulo.
O marco considerado para as contas da PGR (Procuradoria-Geral da República) foi 4 de novembro de 2014, data final do prazo de apresentação de contas eleitorais.
Investigação só começou em SP porque STF decidiu
A ironia sobre o imbróglio jurídico em que se transformou o inquérito é que ele começou a tramitar na Justiça Eleitoral de São Paulo por decisão do próprio STF. A Segunda Turma do tribunal decidiu que vários casos semelhantes tramitassem na Justiça Eleitoral.
Em 14 de março de 2019, o plenário do tribunal decidiu, por seis votos a cinco, que a Justiça Eleitoral é o foro competente para processar e julgar casos relativos à Operação Lava Jato mas com suspeitas de caixa dois eleitoral, ainda que associado à corrupção.
Foi uma derrota da força-tarefa da Lava Jato no Ministério Público Federal e atingiu diversos casos em andamento no Paraná, São Paulo e Rio de Janeiro e também na PGR, em Brasília. Eles tiveram que ser suspensos e enviados para a Justiça Eleitoral nos estados.
A investigação sobre o caixa dois de Serra foi um dos vários casos redistribuídos pela PGR em cumprimento às decisões do STF.
Operação avançou para o período em que Serra tinha mandato, e assim voltou ao STF
Já que a competência estava autorizada pelo próprio STF, o Ministério Público Eleitoral de São Paulo começou a investigação no ano passado. As suspeitas giravam em torno da campanha de 2014, quando Serra ainda não era senador e, portanto, não detinha foro privilegiado no STF.
A apuração partiu da delação premiada de Elon Gomes de Almeida, ex-diretor-presidente de uma empresa controlada pela Qualicorp.
Em julho passado, o MPE desencadeou, em conjunto com a Polícia Federal de São Paulo, a Operação Paralelo 23, que cumpriu 15 mandados de busca e apreensão e quatro de prisão temporária em São Paulo, Itu (SP), Itatiba (SP) e Brasília.
As buscas incluíram uma casa e um apartamento de Serra em São Paulo. O seu gabinete no Senado também seria alvo de uma busca e apreensão, mas o então presidente do STF, Dias Toffoli, concedeu uma liminar, solicitada pela Mesa do Senado, que impediu a operação no endereço. Um dos presos foi Seripieri Júnior, sócio e um dos fundadores da Qualicorp.
Os investigadores estavam analisando o material apreendido e tomando depoimentos quando, no começo de setembro último, os advogados de defesa de José Serra ajuizaram uma reclamação constitucional no STF, que foi distribuída ao ministro Mendes por prevenção. A defesa argumentou que a investigação havia avançado para fatos ocorridos em 2015, quando Serra já era senador da República, o que atrairia toda a investigação para o STF. Mendes então avocou o procedimento para análise.
PGR se manifestou mais de uma vez com intuito de agilizar investigações
Ainda em setembro a subprocuradora-geral da República Lindôra Araújo apresentou ao STF uma saída simples para o suposto problema. Pediu que fossem arquivadas todas as suspeitas em relação a 2015. Assim, o caso poderia ser devolvido à Justiça Eleitoral de São Paulo para a continuidade da apuração sobre os fatos de 2014.
Em 16 de outubro, o procurador-geral da República reiterou sobre o problema da prescrição, agora indicando o dia 4 de novembro como limite. Gilmar Mendes decidiu no dia 29, a decisão entrou no sistema do STF no dia 3.
Procurado pela coluna antes da última decisão do STF, o promotor de Justiça eleitoral, Fábio Bechara, disse que "a promoção de arquivamento pela PGR em relação aos fatos que teriam ocorrido a partir de 2015 afasta a competência do STF, segundo o entendimento firmado pela corte, ao limitar a aplicação da regra do foro especial". Ele foi designado, em dezembro de 2019, responsável pela coordenação do grupo de promotores que investiga em São Paulo os casos eleitorais derivados da Operação Lava Jato.
Em nota, defesa de senador diz que inquérito "é vazio"
Os advogados de defesa de Serra, Flávia Rahal e o ex-ministro do STF Sepúlveda Pertence, afirmaram em nota nesta quarta-feira (4) que o STF "e o próprio Ministério Público Federal reconheceram a nulidade da absurda busca e apreensão ordenada pela Justiça Eleitoral nos endereços de José Serra, com a determinação de desentranhamento de tudo aquilo que foi originado a partir das medidas invasivas e ilegais determinadas contra o senador".
De acordo com a defesa, a PGR "afirmou, em sua manifestação, que 'tampouco há indícios acerca da prática de crimes durante e relacionados ao mandato de Senador da República'. Com isso, houve o arquivamento de toda a parte do inquérito posterior a 2014, comprovando o objetivo que sempre se teve com essa investigação: desmoralizar a imagem e reputação do senador".
"O inquérito que remanesce e que hoje volta à Justiça Eleitoral de Primeira Instância é vazio e não pode ter outro destino que não o arquivo. José Serra continua acreditando no discernimento da Justiça e aguarda com serenidade o reconhecimento das demais ilegalidades e das inverdades das acusações que lhe foram feitas."
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