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Rubens Valente

REPORTAGEM

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Consultoria de Pires diz que preço do diesel está "defasado" no Brasil

Adriano Pires, indicado para presidência da Petrobras - Divulgação CBIE
Adriano Pires, indicado para presidência da Petrobras Imagem: Divulgação CBIE

Colunista do UOL

02/04/2022 17h42

A firma de consultoria do economista Adriano Pires, indicado à presidência da Petrobras pelo presidente Jair Bolsonaro, publicou um artigo nesta sexta-feira (1) no qual afirma que está "defasado" o preço do diesel e da gasolina praticado nas refinarias do Brasil.

Análises sobre o cenário dos preços internacionais têm sido publicadas com frequência no site da empresa de Pires, mas a de sexta-feira é a primeira nesse sentido desde que o economista foi indicado ao comando da petroleira no último dia 28. Sócio-fundador da empresa, denominada CBIE (Centro Brasileiro de Infraestrutura), Pires trabalha há mais de 20 anos para várias empresas multinacionais e nacionais de petróleo, gás e energia, mas se recusa a revelar sua carteira de clientes, conforme a coluna divulgou no último dia 30.

O artigo assinado apenas "Por CBIE" e intitulado "Segue negativa a defasagem entre os preços de refinaria da gasolina e do diesel" diz que, "de acordo com a a atualização mais recente, em 28 de março, o preço médio do diesel na refinaria nacional ficou em R$ 0,57/litro (ou -11,1%) abaixo do preço no Golfo do México (EUA)".

O texto diz ainda que "o preço da gasolina doméstica ficou R$ 0,25/litro (ou -6%) abaixo do preço no Golfo do México (EUA), em 28 de março". A análise do CBIE pontua que "tal como para o diesel, não houve reajustes no preço da gasolina nas refinarias nacionais".

Para o especialista em petróleo Paulo César Ribeiro Lima, consultor legislativo aposentado da Câmara dos Deputados, ex-engenheiro da Petrobras e Ph.D. na área de petróleo pela Universidade de Cranfield, na Inglaterra, o artigo "confirma que o Pires vai querer que a Petrobras receba mais do que está recebendo hoje" por meio do sistema de PPI (Preço de Paridade de Petróleo), criado pelo governo de Michel Temer em 2016 e mantido no governo de Bolsonaro, pois Pires "entende que a Petrobras está recebendo menos do que deveria".

"E acho que quem vai pagar essa diferença somos nós. Não vai ser pago na bomba, vai ser pago pelo Orçamento da União, a exemplo do que ocorreu na greve dos caminhoneiros [governo Temer]", disse Lima. Para contentar os caminhoneiros grevistas de 2018 e reduzir o preço do diesel em R$ 0,46, Temer adotou subsídios e renúncias fiscais que, juntos, oneraram os cofres públicos em mais de R$ 13 bilhões só naquele ano, segundo análise do Inesc (Instituto de Estudos Socioeconômicos).

Adriano Pires e sua empresa, o CBIE, foram procurados pela coluna durante a semana para se manifestar sobre a carteira de clientes e outros aspectos da firma. A resposta foi: "Infelizmente não podemos atendê-lo, pois o prof. Adriano Pires está em período de silêncio". A indicação do economista para a Petrobras deverá ser analisada no próximo dia 13 em assembleia geral ordinária da companhia.

O site do CBIE tem uma aba com nomes de diversas empresas que "confiam" na consultoria. Alguns dos nomes listados são gigantes do petróleo como Chevron, Shell, ExxonMobil e a própria Petrobras. Há ainda órgãos públicos regulatórios do setor, como a ANP (Agência Nacional do Petróleo), o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) e o MME (Ministério de Minas e Energia).

Além de o Ministério Público junto ao TCU (Tribunal de Contas da União) ter representado no tribunal para apurar os serviços prestados por Pires às multinacionais do petróleo, o deputado federal Jorge Solla (PT-BA) pediu uma apuração do MPF (Ministério Público Federal).

O deputado diz na representação que "a condição de Pires" contraria artigos da lei 12.813/2013, que trata do conflito de interesses em cargos do Executivo federal, "uma vez que o representado [Pires] não dá qualquer indicativa de que irá abrir mão de sua atividade empresarial".

"A atividade empresarial e privada que o Sr. Adriano Pires desenvolve no setor energético, especialmente o de petróleo, gás e biocombustíveis, é totalmente incompatível com a presidência da Petrobras, por serem interesses diretamente relacionados, e até mesmo contrapostos, sendo ainda consultor, como mesmo se define no site da 'CBIE' dos interesses privados de pessoas jurídicas concorrentes e interessadas, que notadamente visam o lucro", diz a representação do parlamentar.

O deputado mencionou que as empresas clientes do CBIE "ora são concorrentes, ora são clientes da Petrobras" e portanto "possuem interesse direto nas diretrizes da gestão da estatal, não só do ramo energético, mas também do setor financeiro".

"São estas relações e interesses que compõem a trajetória do empresário que demonstram a sua parcialidade ou tendência a ajudar ou adotar políticas favoráveis as diversas empresas que atuou ou atua como 'consultor'", diz o deputado.

Ainda não houve manifestação do MPF sobre o pedido do parlamentar.

Em seu site, o CBIE fiz que "em 1995, nasce como um centro de pesquisa na área de infraestrutura, cinco anos depois, torna-se uma consultoria econômica e regulatória atendendo clientes nacionais e internacionais, sendo reconhecida como uma das 100 consultorias mais influentes do Brasil no setor de energia no ano de 2016 e, atualmente, é referência no setor de infraestrutura no país".