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Tales Faria

Operação da Lava Jato do RJ confirma críticas de Paulo Guedes ao Sistema S

Ministro da Economia, Paulo Guedes - ADRIANO MACHADO
Ministro da Economia, Paulo Guedes Imagem: ADRIANO MACHADO

Chefe da Sucursal de Brasília do UOL

09/09/2020 16h31

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"Nada contra a educação no Sistema S, mas você recolhe 100, gasta 20 com educação e 80 financiando campanha política, tentando aprovar legislação favorável, comprar prédio no Rio de Janeiro para diretor. Está sobrando dinheiro."

Não. A declaração acima não faz parte de nenhuma delação premiada. O autor é um homem de mercado, que conhece os bastidores da elite empresarial e financeira do país, assim como as formas mefistofélicas encontradas por alguns membros dessa elite para sobreviver.

Esse é um dos trechos de uma palestra de abril do ano passado, proferida pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, em Campos do Jordão (SP). Consta de um texto do repórter Antônio Temóteo, publicado aqui no UOL.

Na palestra, Guedes afirmou que as entidades do Sistema S -Sesi, Senai, Senac, etc- destinam para a educação apenas parte dos recursos que arrecadam. Usam o restante para financiar campanhas políticas e comprar apoio para aprovar leis favoráveis à manutenção da mamata.

As buscas e apreensões realizadas da Polícia Federal na manhã desta quarta-feira, 09, no Rio de Janeiro foram baseadas em levantamento da Operação Lava Jato em que, segundo o Ministério Público, entidades do Sistema S no estado teriam destinado pelo menos metade do seu orçamento anual a contratos com escritórios de advocacia.

Essas entidades do RJ gastaram R$ 355 milhões com advocacia, dos quais "ao menos R$ 151 milhões foram desviados", disse o MP.

Segundo o Ministério Público, o ex-presidente da Federação do Comércio do Rio de Janeiro Orlando Diniz revelou, em delação premiada, ter criado um "sistema de gestão integrada das entidades", que permitiu a transferência de valores do Sesc e do Senac para a Fecomércio.

Explica o Ministério Público: "Como os contratos eram feitos com a Fecomércio/RJ, entidade privada, o seu conteúdo e os seus pagamentos não eram auditados pelos conselhos fiscais do Sesc e do Senac Nacional, pelo TCU ou pela CGU, órgãos que controlam a adequação dos atos de gestão das entidades paraestatais com a sua finalidade institucional."

Ou seja, teria sido encontrada uma maneira de fugir de fiscalizações. É o que o ministro Paulo Guedes aponta como uma das formas historicamente usadas pelos dirigentes dessas entidades para usar o dinheiro público a fim de se manter no comando e influenciar autoridades do Legislativo, do Executivo e do Judiciário.

O mecanismo consta de uma delação premiada. Não está provado que Orlando Diniz disse a verdade nos detalhes. Nessas horas, o criminoso pode incluir desafetos com o sem culpa no cartório. É preciso provar ainda, antes de apontar esse ou aquele advogado, juiz ou autoridade como corrupta.

Mas não é só o ministro Guedes quem acha que essas entidades do Sistema S há bastante tempo promovem uma gastança muito além do serviço que prestam.

Fazem parte do sistema S: o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai); o Serviço Social do Comércio (Sesc); o Serviço Social da Indústria (Sesi); e Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio (Senac). Existem ainda os seguintes: Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar); Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo (Sescoop); e Serviço Social de Transporte (Sest).

Essas entidades recebem contribuições recolhidas regularmente pelo governo da folha de salários das empresas pertencentes à categoria correspondente.

Guedes assumiu o Ministério falando em cortar de 30% a 50% dos recursos destinados ao Sistema S. Conseguiu isso com a pandemia do coronavírus, quando editou a MP 932 como parte de um pacote temporário voltado para cortar gastos da folha de pagamentos das empresas.

Alimentou a guerra que quem vem travando desde o início do governo com entidades como CNI (Confederação Nacional da Indústria), Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) e a CNC (Confederação Nacional do Comércio), que administravam, antes da pandemia, um orçamento anual de cerca de R$ 18 bilhões.

Este blog mesmo já publicou que o ministro precisou virar a mesa para fazer de Carlos Melles presidente do Sebrae, no ano passado, destituindo João Henrique Sousa, um indicado do MDB de Michel Temer.

A guerra em torno da MP 932 já foi parar na Justiça, com recursos das entidades aos tribunais superiores e com vetos e tentativas do governo de tornar o corte definitivo. Quem vai vencer no final das contas ainda não está certo. Mas dessa guerra depende uma parte do ajuste fiscal proposto pela área econômica do governo.