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Especialistas apontam repressão ao tráfico de drogas como causa da onda de violência em SP

Débora Melo

Do UOL, em São Paulo

30/06/2012 06h00

A onda de violência desencadeada há 16 dias em São Paulo já registra um saldo de seis policiais militares mortos, 12 ônibus incendiados e ataques a três bases da PM. Para especialistas em segurança pública ouvidos pelo UOL, esses ataques não estão necessariamente ligados entre si e podem ser uma resposta às ações de repressão ao crime organizado, principalmente ao tráfico de drogas.

MAPA DOS ATAQUES EM SÃO PAULO

As investigações, contudo, não descartam a possibilidade de que os ataques sejam uma represália da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) aos seis mortos em operação da Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar) em maio ou, ainda, à transferência de um dos chefes do grupo para outra penitenciária.

6 PMs MORTOS - CRONOLOGIA

23.junFerraz de Vasconcelos (Grande SP)
22.junJardim Edda
21.junJardim Bento Novo (zona sul)
20.junVila Formosa (zona leste)
17.junSão Mateus (zona leste)
13.junGuaianases (zona leste)

O consultor em segurança pública José Vicente da Silva Filho, coronel da reserva da Polícia Militar de SP e ex-secretário nacional de Segurança Pública, diz não acreditar que exista uma liderança de grande facção emitindo ordens de ataques. “A PM vem fazendo uma cruzada contra o tráfico de entorpecentes, e nesse processo acabam surgindo grupos insatisfeitos com as ações da polícia”, diz.

O coronel afirma que tem conversado com autoridades da Segurança Pública e que a polícia não trabalha com a hipótese de que as mortes dos PMs estejam relacionadas com os ataques a coletivos. “O comportamento criminoso tem essa coisa da cópia, essa coisa que a gente chama de ‘onda’. No caso dos ônibus, as investigações apontam para a participação de grupos de adolescentes nessas ocorrências. É um fenômeno preocupante, mas eu acredito em fatos isolados”, afirma.

Para o especialista em segurança pública Jorge Lordello, a disseminação das drogas no Estado, especialmente o aumento do consumo de crack, foi um “divisor de águas” nas políticas de combate à criminalidade. Segundo Lordello, dependentes químicos acabam sendo um “alvo fácil para o crime”. “Não posso afirmar que esses casos [ataques] tenham acontecido nessas condições, mas essa é uma realidade. Hoje existem muitos usuários, especialmente no caso do crack, que acabam trabalhando para o tráfico.”

A Polícia Militar informou que está realizando operações em todo o Estado, "com o objetivo de prevenir a ocorrência de atos ilícitos e de desordem por parte de infratores da lei, quer de forma isolada ou coletiva". Já a SPTrans --empresa que administra as cooperativas de transporte da capital-- informou que está em contato permanente com o comando da PM "para preservar a segurança dos usuários do sistema de transporte".

Ataques

Nos ataques mais recentes a ônibus, entre a noite de quinta (28) e a madrugada desta sexta (29), criminosos incendiaram um coletivo no Jardim Danfer, em Cangaíba (zona leste), e outro no Jardim Soraia, no Capão Redondo (zona sul) --os ataques têm se concentrado nas zonas sul e leste e em cidades da Grande São Paulo. Ninguém ficou ferido.

12 ÔNIBUS INCENDIADOS

29.junCangaíba (zona leste)
28.junCapão Redondo (zona sul)
27.junFerraz de Vasconcelos (Grande SP)
26.junTremembé (zona norte)
26.junTaboão da Serra (Grande SP)
26.junSacomã (zona sul)
26.junJardim Santa Emília (zona sul)
25.junSão Mateus (zona leste)
24.junJardim Ângela (zona sul)
24.junGuarulhos (Grande SP)
23.junDiadema (Grande SP)
14.junSão Vicente (litoral)

Os fatos lembram a onda de ataques de maio de 2006, quando o PCC iniciou uma série de atentados em represália à transferência de seus principais líderes para presídios situados fora de São Paulo. Na ocasião, cerca de 450 pessoas morreram no Estado, sendo 40 policiais.

Nesses 16 dias, dez pessoas também foram mortas em três chacinas, e a polícia investiga se essas mortes são uma resposta aos ataques contra PMs. Na última quarta-feira (27), o chefe da Polícia Civil de São Paulo, delegado Marcos Carneiro Lima, classificou os acontecimentos como "momento atípico de violência" no Estado. “Precisamos saber mais sobre quem morreu para tentar entender quem teria interesse em matar esses policiais e essas vítimas das chacinas. Não podemos descartar que quadrilhas estejam aproveitando o momento para matar rivais”, disse. Todos os PMs foram mortos quando estavam fora de serviço.

Já o secretário de Segurança Pública do Estado, Antonio Ferreira Pinto, disse em entrevista ao jornal “O Estado de S.Paulo” que a situação estava “sob controle”. Em meio à crise, o secretário foi a Buenos Aires para assistir à primeira partida da final da Taça Libertadores, disputada entre o time argentino Boca Juniors e seu time, o Corinthians. Ao jornal, Pinto confirmou que esteve na Argentina e disse que havia tirado licença oficial de dois dias para viajar.

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), afirmou na última quarta-feira (27) que aqueles que "enfrentarem a polícia vão levar a pior". "Os criminosos serão presos. E, se enfrentarem a polícia, vão levar a pior. Essa é a ordem, e o governo não retrocede um milímetro nesse trabalho", disse.