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Com falta de leitos, remédios e greve de médicos, Rio Grande do Norte decreta calamidade na saúde pública

Equipamentos de UTI neonatal estão sem uso em hospital do Rio Grande do Norte - Madson Vidal
Equipamentos de UTI neonatal estão sem uso em hospital do Rio Grande do Norte Imagem: Madson Vidal

Carlos Madeiro

Do UOL, em Maceió

04/07/2012 20h06

Diante de uma grave crise instalada nos serviços de atendimento de urgência e emergência, o governo do Rio Grande do Norte decretou, nesta quarta-feira (4), estado de calamidade na saúde pública. O Estado informou que passa a ter apoio do Ministério da Saúde e anunciou investimentos e ações imediatas para amenizar os problemas de quem precisa de atendimento.

Nas últimas semanas, a crise foi agravada com a falta de leitos para internações e até mortes de bebês e gestantes em maternidades. Além disso, centenas de pacientes aguardam por uma vaga de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) ou por uma cirurgia ortopédica nos hospitais das maiores cidades. Faltam remédios e material básico para cirurgias e intervenções simples e há superlotação nos principais hospitais, com pacientes nos corredores. Para completar o caos, os médicos do Estado estão em greve há mais de 60 dias por maiores salários e pedindo melhores condições de trabalho.

Em comunicado oficial, o Estado admitiu, hoje, viver uma grave crise na saúde, com a falta de produtos, mas alega que a situação se arrasta há anos e que realizou investimentos nos últimos meses.

“Vivemos um momento de agudização de um processo crônico de deterioração dos serviços de urgência e emergência. Hoje, o Walfredo Gurgel [principal emergência do Estado, localizada em Natal], com capacidade para atender a 288 pacientes, atende, em média, a 450. O momento é grave, mas a crise não se iniciou agora. Nesses 18 meses de governo um enorme esforço foi feito para superar a situação de crise herdada", disse, em nota, o governo do Estado na justificativa da calamidade.

Com o decreto, a governadora Rosalba Ciarlino (DEM) anunciou uma série de medidas dentro do "Plano de Enfrentamento dos Serviços e Urgência e Emergência do RN", que serão tomadas em conjunto pelos governos estadual e federal. "Não é a primeira vez que é decretado estado de calamidade na saúde do Rio Grande do Norte, mas é a primeira vez que é apresentado um plano de enfrentamento junto ao governo federal. Este é um plano emergencial, mas que vai contemplar ações que terão efeitos a médio e longo prazo", disse a governadora, em entrevista coletiva na tarde de hoje.

Entre as principais medidas estão a implantação de mais 100 leitos, sendo 60 deles de imediato no Hospital Universitário. Haverá também um investimento de R$ 12 milhões para reforma e compra de equipamentos para os quatro principais hospitais de referência da Região Metropolitana de Natal (Walfredo Gurgel, Santa Catarina, Maria Alice Fernandes e Deoclécio Marques). O prazo de conclusão das obras é de 60 dias. O Estado também promete reabastecer as unidades de saúde em até seis meses.

Além disso, serão investidos outros R$ 13 milhões de recursos estaduais para reformas de hospitais. O Ministério da Saúde também deve criar, com recursos federais, uma central de regulação única para gerenciar o uso das vagas. O repasse mensal aos hospitais da rede também terão um aporte de R$ 600 mil para melhorar o atendimento. Haverá também um pedido estadual, ao Ministério da Saúde, para criação de uma força-tarefa e assim zerar a fila de cirurgias ortopédicas em 60 dias.

Greve e superlotação

Nos últimos meses, a crise na saúde pública do Rio Grande do Norte chegou a proporções dramáticas. Desde abril, vários relatos foram feitos de pessoas que estavam internadas em hospitais de forma improvisada fora de UTIs. Com a greve de profissionais e de médicos, o Hospital Walfredo Gurgel teve a situação agravada e passou a conviver com uma superlotação e fila de espera por leitos, além de não ter insumos e medicamentos básicos para atender a população.

No começo de junho, o UOL também noticiou que o MP estadual investiga a morte de uma gestante durante procura por atendimento em maternidade pública em Natal. Segundo a família, a gestante realizou o pré-natal e tanto ela quanto o bebê estavam bem de saúde. Outros casos também foram denunciados e estão sob investigação.

Por conta da falta de vagas e de medicamentos e estrutura precária, o Conselho Regional de Medicina ingressou com uma ação civil pública, no final de junho, pedindo uma indenização de R$ 1 milhão pelos maus serviços prestados à população. Caso a ação, que tramita na 4º Vara Federal de Natal, seja aceita, o dinheiro será destinado ao Fundo Estadual de Saúde e a uma instituição filantrópica ligada a atendimento de suporte à rede de saúde.

Antes, em maio, médicos usaram o Twitter para divulgar a falta de leitos e pedir "socorro". No dia 20 de junho, por exemplo, seis bebês e duas crianças estavam à espera de leitos de UTI em hospitais de Natal. Em meio à falta de vagas, funcionários da saúde denunciaram que equipamentos para 10 leitos de UTI estão encaixotados há dois anos, sem funcionar.

Interdições

Nesta quarta-feira, o Sinmed-RN (Sindicato dos Médicos do Rio Grande do Norte) informou que vai iniciar, na próxima semana, a interdição de setores hospitalares que não apresentam “condições mínimas para o exercício profissional” em Natal e Mossoró (a 278 km da capital).

Segundo os profissionais, os hospitais apresentam vários problemas e devem ter os serviços desativados em etapas. Na próxima terça-feira (10) devem ser interditados as unidades Santa Catarina e o Tarcísio Maia. Ainda durante a semana, os hospitais Walfredo Gurgel, João Machado, Giselda Trigueiro e Ruy Pereira também devem ter a interdição decretada.

Em meio à crise estadual, denúncias de corrupção abalaram também a saúde pública municipal de Natal. No último dia 27, uma operação deflagrada pelo MP prendeu sete pessoas acusadas de participar de um esquema fraudulento de licitações e despesas fictícias ocorridas na Secretaria Municipal de Saúde de Natal.

A 7ª Vara Criminal também ordenou que fossem afastados dos cargos a secretária municipal de Saúde, Maria do Perpétuo Socorro Lima; o secretário de Planejamento, Antônio Carlos Soares Luna; o coordenador administrativo e financeiro da Secretaria de Saúde, Francisco de Assis Rocha Viana; e o assessor jurídico da SMS Thobias Bruno Gurgel Tavares. O grupo também foi proibido de ter acesso ou frequentar as dependências dos prédios onde estavam lotados.