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Vereador acusado de chefiar milícia no Rio vai ganhar mais de R$ 300 mil em menos de dois meses

Deco teve o seu primeiro dia de trabalho nesta quarta-feira (23) após deixar a prisão, na segunda-feira (22), por decisão do Supremo Tribunal Federal. Um grupo de vereadores corre contra o tempo para viabilizar e aprovar o pedido de cassação do mandato. - Bruno Gonzalez/Agência O Globo
Deco teve o seu primeiro dia de trabalho nesta quarta-feira (23) após deixar a prisão, na segunda-feira (22), por decisão do Supremo Tribunal Federal. Um grupo de vereadores corre contra o tempo para viabilizar e aprovar o pedido de cassação do mandato. Imagem: Bruno Gonzalez/Agência O Globo

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, no Rio

24/10/2012 18h17

Os vereadores do Rio de Janeiro estão desesperançosos quanto ao sucesso do pedido de cassação vereador Luiz André Ferreira da Silva (sem partido), o "Deco", que retomou o cargo na terça-feira (23), após ficar um ano preso sob acusação de chefiar uma milícia da zona oeste da cidade.

Em menos de dois meses de trabalho, Luiz André vai faturar dos cofres públicos mais de R$ 300 mil, o que inclui salários, contratação de pessoal (até 20 assessores), auxílio-paletó e demais verbas de gabinete. O mandato termina em dezembro.

Os parlamentares necessitam de 22 assinaturas para encaminhar a emenda à Comissão de Justiça e Redação, que por sua vez repassaria ao Conselho de Ética --após todo o procedimento burocrático, ocorreria a votação secreta. Até o momento, 14 vereadores assinaram.

Os autores da representação --Andréa Gouvêa Vieira (PSDB), Eliomar (PSOL), Paulo Pinheiro (PSOL) e Paulo Messina (PV)-- solicitaram "regime de urgência" ao presidente da Casa, porém o trâmite necessário para a aprovação levaria, em média, pelo menos três meses, segundo os parlamentares.

"Qual é o tempo que ele tem de mandato? Apenas dois meses. Com esse tempo, ele não vai conseguir aprovar nada na Câmara. Além da questão do envolvimento com as milícias, a permanência ele é um grande prejuízo aos cofres públicos. Não existe motivo para não cassá-lo", afirmou Messina.

Qualquer projeto elaborado pelos vereadores é analisado por pelo menos três comissões, que variam de acordo com a natureza da proposta. Cada grupo leva, em média, 14 dias para aprovar ou não o projeto em questão --além disso, ainda há a fila para inclusão na pauta do plenário.

Os 14 vereadores que já assinaram em favor da cassação de Deco são: Eliomar (PSOL), Carlo Caiado (DEM), Ivanir de Mello (PP), Leonel Brizola Neto (PDT), Teresa Bergher (PSDB), Andréa Gouvêa Vieira (PSDB), Paulo Pinheiro (PSOL), Carlos Bolsonaro (PP), Edson da Creatinina (PV), Reimont (PT), Paulo Messina (PV), Tio Carlos (DEM), Sônia Rabello (PV) e Márcia Teixeira (PR).

STF concede habeas corpus

A defesa de Luiz Andre Ferreira da Silva, o Deco, obteve habeas corpus concedido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio de Mello, no dia 13 de outubro. Na segunda-feira (22), ele deixou a penitenciária federal de segurança máxima de Porto Velho, em Rondônia, e regressou à capital fluminense.

A medida cautelar aprovada pelo STF substitui a prisão preventiva de Deco, deferida em abril de 2011 pela desembargadora do TJ-RJ (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro) Gizelda Leitão Teixeira. O suspeito responde por formação de quadrilha armada.

Na ocasião, a magistrada entendeu que o suposto miliciano poderia ameaçar testemunhas do processo, e aprovou a solicitação da promotoria "para garantir a ordem pública e por conveniência da instrução criminal". Em sua decisão, Marco Aurélio de Mello aceitou a versão da defesa sobre uma possível falta de provas, e afirmou que a investigação só deu após a prisão, constrangendo assim a "liberdade de ir e vir" do acusado.

"O exame do processo, no entanto, revela constrangimento ilegal a alcançar a liberdade de ir e vir do paciente. A prisão preventiva foi implementada a partir de simples imputação, dando-se a culpa como selada. Considerado o que narrado pelo Ministério Público, assentou-se que a ordem pública estaria em risco e haveria a possibilidade de tumulto na instrução criminal. Nada se disse de concreto capaz de enquadrar a espécie no artigo 312 do Código de Processo Penal. Em síntese, determinou-se a prisão para, depois, apurar-se", narra trecho da medida cautelar.

O ministro citou ainda a argumentação do advogado de Deco, Felipe Machado Caldeira, sobre o fato de a única arma encontrada pela Polícia Civil em poder do suspeito ter sido uma "faca de uso doméstico".

Mello também concedeu alvará de soltura a outras sete pessoas acusadas de ligação direta ou indireta com a milícia supostamente chefiada por Deco: Hélio Albino Filho, Paulo Ferreira Junior, Arilson Barreto das Neves, Maria Ivonete Santana Madureira, Gonçalo do Souza Paiva, Jorge de Souza Paiva e Edilberto Gomes Alves.

Milícia

O grupo paramilitar que seria liderado pelo ex-vereador, na versão da polícia e do Ministério Público, atua em diversos pontos de Jacarepaguá, tais como Praça Seca, Campinho, Tanque, Mato Alto, Chacrinha, entre outros. Os criminosos cobram taxas por serviços oferecidos de forma clandestina, a exemplo do "gatonet" --furto de sinal de TV por assinatura-- e da distribuição do gás.

Para se impor, segundo a denúncia do MP, a quadrilha recorre a meios cruéis como homicídios por meio de armas de fogo, facões e cordas para enforcamento. Além disso, pratica ocultação e destruição de cadáveres, torturas, estupros, invasões de domicílios e outros crimes.

Então vereador pelo PR, Deco foi capa de alguns jornais em 2008, quando teria feito uma ameaça ao presidente da CPI das Milícias, o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL), durante sessão na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). Na época de sua prisão, em abril de 2011, Ferreira também foi acusado de planejar a morte de Freixo e da chefe de Polícia Civil do Rio, Martha Rocha, conforme informações encaminhadas ao Disque-Denúncia.

Em julho do ano passado, Deco foi transferido para a penitenciária federal de segurança máxima de Porto Velho, em Rondônia, a pedido do Ministério Público. Em nota, o órgão afirmou que o ex-vereador continuava liderando as ações da quadrilha, "ameaçando a paz social e, inclusive, planejando execuções".

Entre os alvos estariam membros do próprio MP, o delegado titular da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas e Inquéritos Especiais, Alexandre Capote, e testemunhas que colaboraram nas investigações.