Corpo de índio é retirado de velório para nova autópsia em Sidrolândia (MS)
O velório do índio terena Oziel Gabriel, 35, morto na última quinta-feira (30) em confronto com policiais federais e militares que cumpriam ordem judicial de despejo de uma fazenda em Mato Grosso do Sul, foi suspenso na tarde desta sexta (31) para que o corpo dele seja submetido a uma nova autópsia. Nesse mesmo dia, a área onde aconteceu o conflito voltou a ser ocupada.
A cerimônia acontecia na casa da família, onde o índio vivia com a mulher e dois filhos, um de 15 anos, outro de 18. “Soube que o ministério [da Justiça] foi quem determinou novo exame, querem saber de onde saiu o tiro que matou nosso patrício”, disse ao UOL Antonio Aparecido, cacique da aldeia Córrego do Meio, que fica a cerca de oito quilômetros da fazenda Buriti, onde ocorreu o conflito anteontem.
O exame será feito por três peritos quem seguiram de Brasília para Campo Grande, onde o exame será feito. O corpo do índio deve ser liberado até este domingo. Ontem mesmo, enquanto o terena era velado, ao menos 200 índios retornaram à fazenda Buriti, de 300 hectares, propriedade do ex-deputado estadual Ricardo Bacha. A área é cercada por aldeias.
Logo depois da morte do índio, o médico Wolney Pereira escreveu em laudo que o índio havia morrido vítima de um ferimento provocado por arma de fogo. O legista narra no documento que o projétil entrou pela barriga do terena, atravessou o fígado e saiu pelas costas.
Onde fica
Sidrolândia está a 71 km de Campo Grande
Balas de borracha
Nova perícia deve apontar o calibre da arma disparada. Os policiais militares, segundo o comandante da PM, coronel Carlos Alberto David dos Santos, em comunicado mostrado nos canais de TV de Mato Grosso do Sul, usaram munições de borracha e bombas de efeito moral.
Representantes do Ministério Público Federal foram ao local depois do conflito e apreenderam cápsulas deflagradas de pistola ponto 40, munições que serão juntadas ao inquérito. A PF e a PM informaram que investigam o caso.
David dos Santos disse que a tropa foi recebida na fazenda, até então ocupada por cerca de 500 índios, com “hostilidade”. Já os índios afirmaram que os policiais chegaram atirando.
A reintegração de posse foi cumprida depois de oito horas de conflito. Com os índios a polícia apreendeu três espingardas, paus e flechas. Catorze terenas foram detidos por desobediência, prestaram depoimentos e foram liberados. No final da operação havia na área cerca de mil índios.
O terena Vinícius Jorge afirmou que assim que o corpo de Oziel for enterrado a fazenda Buriti será “definitivamente ocupada“. E acrescentou: “Se havia mil famílias lá agora serão duas mil”, disse ele.
Índio é morto em desocupação de área invadida no MS
30 fazendas
A Polícia Federal ainda não se manifestou quanto a reocupação da fazenda. Os índios reivindicam 17,2 mil hectares entre os municípios de Sidrolândia e Dois Irmãos do Buriti. Essa área possui ao menos 30 fazendas, e apenas 11 delas ainda não foram ocupadas pelos índios, segundo o cacique Antônio Aparecido.
Evilázio Gabriel, 64, pai de oito filhos, um deles o que morreu, disse não querer vingança por “confiar em Deus”. Ele disse que a reocupação da área seria um meio de vingar-se. “O dono daquela terra lá [fazenda Buriti, propriedade de Ricardo Bacha] é turco. Nós somos índios e, cá para nós, a terra deve ser dos turcos ou dos índios”, disse Evilázio, enfermeiro aposentado.
Em 2010, portaria do governo federal considerou a área em questão como território indígena, mas os fazendeiros moveram recursos e os casos permanecem na esfera judicial. Em Mato Grosso do Sul havia demarcações em curso em 28 dos 79 municípios, mas o levantamento para saber se as áreas pertencem aos índios foi suspenso nesta semana.
Ricardo Bacha, dono da fazenda Buriti, disse que não retornou à fazenda ainda por falta de segurança e que ele está “jurado de morte” pelos índios. Ele disse ainda que em sua fazenda de 300 hectares cria ao menos 350 bovinos e que não sabe o que aconteceu com os animais. A sede da propriedade e um trator foram destruídos pelos índios no dia da desocupação.
Outra invasão
Nessa sexta (31), ao menos 500 índios invadiram a fazenda Esperança, em Aquidauana (140 km de Campo Grande). Líderes da ocupação informaram que a terra é deles e que o manifesto foi um meio de protestar contra a morte do índio, em Sidrolândia.
O Conselho Indigenista Missionário (Cimi), entidade ligada à Igreja Católica e pelas causas indígenas informou que a fazenda Esperança já havia sido homologada como terra dos índios, mas a Justiça Federal suspendeu a decisão em 2010.
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