Após reunião com governo federal, polícias de SP e RJ vão padronizar atuação em atos
Em reunião realizada nesta quinta-feira (31) em Brasília, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e os secretários de Segurança Pública de São Paulo, Fernando Grella, e do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame, decidiram unificar os protocolos de atuação das polícias durante protestos. A padronização da atuação da polícias integra as primeiras medidas do grupo de inteligência criado na reunião de hoje, que envolverá a PF, secretarias de Segurança Pública e polícias dos Estados.
ENTENDA O BLACK BLOC
O "black bloc" ("bloco negro") não é um grupo específico de manifestantes, mas sim uma forma violenta de agir adotada por manifestantes que se dizem anarquistas.
A tática "black bloc" consiste em "causar danos materiais às instituições opressivas". Na prática: depredar estabelecimentos privados --agências bancárias entre eles-- e pichar paredes.
“As polícias de São Paulo e do Rio de Janeiro têm tido um protocolo que orienta a ação e estabelece um regramento. Nossa proposta é unificar os protocolos”, disse o ministro, em entrevista coletiva após a reunião.
Além disso, os governos querem discutir o endurecimento da legislação para atos de vandalismo durante os protestos, a padronização dos órgãos do Judiciário no tratamento aos infratores e o envolvimento do Ministério Público e da Polícia Civil para implantar medidas preventivas e evitar atos violentos.
O protocolo de atuação das polícias sugerido por Cardozo prevê que os organizadores dos protestos informem as forças de segurança o trajeto, o horário e o que irão fazer nos protestos. “Vamos fazer um protocolo unificado que dará visibilidade à sociedade como a polícia se comporta.”
Mudanças na lei
Cardozo disse que será formado um grupo de trabalho entre o Ministério da Justiça, secretarias de Segurança Pública de São Paulo e Rio de Janeiro, CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público), CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) para estudar mudanças na legislação a partir de sugestões feitas pelos secretários de São Paulo e do Rio.
Ambos sugeriram ao ministro mudanças nas leis federais para endurecer o tratamento a quem cometer atos de vandalismo e violência nos protestos, como agredir policiais. De acordo com Cardozo, a ideia é unificar as interpretações jurídicas com relações às infrações. “Estão havendo dúvidas, e é natural que existam, porque o momento é novo”, disse. “Precisamos unificar isso para que cada um saiba o modo de agir, até para que os órgãos de investigações criminais tenham segurança jurídica.”
O ministro disse que outra ideia é estreitar o monitoramento e a troca de informações feitos pela inteligência de órgãos estaduais e federais. “Não se trata, em tempo algum, de fazer acompanhamento de movimentos sociais. Não é isso. Se trata de entender e poder planejar ações com relação a pessoas que tem se organizado com o claro propósito de infringir a lei.”
Outra proposta será criar nos Estados grupos operacionais que envolvam Ministério Público e delegados de polícia para implementar ações preventivas para coibir atos violentos nos protestos, além de sanções aos infratores.
Penas mais duras
Segundo Fernando Grella, a proposta apresentada pelo Estado de São Paulo prevê que a agressões a policiais durante os protestos sejam punidas com penas equivalentes a agressões contra jovens (menores de 14 anos) e idosos (com mais de 60 anos). "Por enquanto continuamos trabalhando com a lei que está aí."
Hoje, o crime de lesão corporal doloso, tipificado no artigo 129 do Código Penal, prevê penas que vão de três meses a oito anos de prisão. Com a mudança, a pena variaria de seis meses (casos de agressões leves) a 12 anos de prisão (agressões gravíssimas).
Outra medida apresentada pelo secretário é criar dois novos agravantes para o crime de dano qualificado, para quando ocorrer em manifestações ou eventos públicos. As penas para este tipo de crime também aumentariam, passando de 6 meses a 3 anos de detenção para 4 a 8 anos de prisão.
José Mariano Beltrame afirmou, na entrevista coletiva, que os policiais que atuam nos protestos precisam ter a garantia de que as detenções resultem em ações penais contra os detidos.
Protestos violentos
O encontro ocorre após protestos violentos realizados em São Paulo. Na sexta-feira (25), manifestação convocada pelo MPL (Movimento Passe Livre) no centro da capital terminou em quebra-quebra, com o Terminal Parque Dom Pedro depredado. No ato, o coronel Reynaldo Simões Rossi, comandante do policiamento do centro, foi espancado por vários manifestantes mascarados. No dia seguinte, a presidente Dilma Rousseff, pelo Twitter, ofereceu ajuda ao governo de São Paulo.
Mais de cem manifestantes foram detidos. Sete continuam presos, no CDP (Centro de Detenção Provisória) do Belém, inclusive o estudante e comerciário Paulo Henrique Santiago dos Santos, 22, apontado como um dos agressores do coronel. Ele foi indiciado por tentativa de homicídio, formação de quadrilha, roubo e lesão corporal. Os demais foram indiciados por formação de quadrilha e dano.
No domingo e na segunda-feira, o palco dos protestos foi a zona norte de São Paulo e realizados por moradores revoltados com a morte do estudante Douglas Rodrigues, 17, baleado por um policial militar enquanto caminhava em uma rua da Vila Medeiros.
Na noite de segunda, a rodovia Fernão Dias foi fechada por manifestantes por algumas horas. Carros, ônibus e caminhões foram incendiados e lojas, saqueadas. Veículos também foram furtados. A polícia suspeita que criminosos ligados ao PCC (Primeiro Comando da Capital) se infiltraram nos protestos.
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Cardozo descartou, por enquanto, o envio de tropas da Força Nacional de Segurança para auxiliar as polícias locais de São Paulo e no Rio de Janeiro. Na avaliação dele, os Estados dispõem de um efetivo significativo de policiais militares e civis.
Após o protesto, o governo de São Paulo acionou, pela primeira vez, o governo federal, e pediu a participação da Polícia Rodoviária Federal (PRF) nos protestos realizados em rodovias interestaduais. Grella e Cardozo mantiveram conversas no início da semana para tratar do assunto. Na terça (29), representantes da PRF se reuniram com a cúpula da Secretaria de Segurança Pública do Estado.
Cerco a "black blocs"
A reunião ocorre em um momento em que os governos buscam formas de endurecer o tratamento a vândalos. Em São Paulo, Alckmin autorizou o uso de balas de borracha nos protestos depois que um protesto no início do mês terminou com atos de vandalismo e a destruição de um carro da PM. No mesmo dia, um casal foi enquadrado na Lei de Segurança Nacional.
No Rio de Janeiro, em meados de setembro entrou em vigor a nova Lei de Organização Criminosa. No último protesto violento na cidade, em 15 de outubro, 70 manifestantes foram enquadrados na lei e muitos chegaram a ser levados ao Complexo de Bangu. Dias depois, foram liberados após decisão judicial.
Os protestos do dia 15 de outubro alcançaram o recorde de detenções em São Paulo e no Rio de Janeiro desde que teve início a onda de manifestações no país. Somando as duas cidades, foram 261 detidos –201 no Rio e 60 em São Paulo.
Ontem (29), o secretário-geral da Presidência da República, ministro Gilberto Carvalho, admitiu que o governo não sabe como lidar com os “black blocs” e disse que há uma disposição do Executivo em entender melhor esta forma de protesto.
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