Zika: Parecer do Senado refuta argumento do governo Lula para vetar pensão
Um parecer da CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) do Senado refuta um dos argumentos apresentados pelo governo Lula para vetar a pensão especial vitalícia a crianças com deficiência permanente decorrentes de síndrome congênita associada ao vírus da zika.
O projeto foi aprovado pelo Congresso em 2024, após nove anos de tramitação, mas foi vetado integralmente na quarta-feira (8), pelo presidente Lula, o que revoltou pais e mães dessas crianças. No lugar do projeto de lei, Lula editou uma MP (medida provisória) estabelecendo o pagamento de uma indenização de R$ 60 mil, em parcela única.
No veto, publicado no Diário Oficial da União desta quinta-feira (9), um dos argumentos utilizados pelo governo federal foi a falta de "apresentação de estimativa do impacto orçamentário-financeiro correspondente e previsão de fonte orçamentária e financeira necessária à realização da despesa ou previsão da correspondente transferência de recursos financeiros necessários ao seu custeio."
O que diz o parecer do Senado
Assinado pelo então senador Rodrigo Cunha (Podemos-AL) e aprovado em 13 de agosto de 2024 pela CAE, o parecer estima em R$ 185 milhões ao ano o custo do pagamento das pensões. O projeto vetado também criava uma indenização de R$ 50 mil às famílias, o que custaria R$ 91,4 milhões aos cofres públicos, de acordo com o documento.
Para os cálculos, o Senado usou como fonte uma nota produzida por um técnico do Senado e dados do Ministério da Saúde, que apontavam à época para 1.828 casos de síndrome congênita associada ao vírus da zika confirmados no Brasil de 2015 a 2023.
Entretanto, segundo associações de famílias, como muitas dessas crianças já morreram, o número estimado hoje é menor, de 1.589 casos.
Ainda de acordo com o parecer, a indenização e a pensão especial não se enquadrariam como benefícios da seguridade social, já que a "natureza jurídica remonta à de indenização diferida decorrente de responsabilidade civil do Estado."
Consequentemente, não se aplica a restrição do parágrafo 5º do art. 195 da Constituição Federal, que requer a apresentação de fonte de custeio total.
Em nota divulgada na quinta-feira, após repercussão do veto, o governo federal repetiu o argumento, dizendo que o projeto "criaria despesa obrigatória de caráter continuado sem a devida estimativa de impacto orçamentário e financeiro, identificação da fonte de custeio, indicação de medida de compensação e sem a fixação de cláusula de vigência para o benefício tributário."
O projeto de lei aprovado em 2024 foi apresentado em 2015 pela então deputada federal Mara Gabrilli, hoje senadora de São Paulo pelo PSD. Ela criticou o veto.
O governo foi convidado a contribuir, negociar e ajustar a proposta, e todas as sugestões apresentadas foram integralmente acolhidas. Câmara e Senado votaram essa matéria em plenário por três vezes, sem nenhum voto contrário. Esse gesto mostra a incapacidade do governo de dialogar e de se comprometer com as demandas humanitárias mais urgentes.
Mara Gabrilli
Agora, o Congresso deverá decidir se mantém ou derruba o veto presidencial. Não há previsão para a análise acontecer.
Como é hoje?
Graças a uma lei de 2020, essas famílias recebem apenas pensão especial de um salário mínimo (R$ 1.518, em 2025), que atende crianças nascidas com microcefalia entre 1º de janeiro de 2015 e 31 de dezembro de 2019.
Entretanto, elas não podem acumular essa pensão com o BPC (Benefício de Prestação Continuada) ou qualquer outra indenização paga pela União.
Com o novo projeto, a proibição ao acúmulo acabaria. Para receber a pensão, a família teria que apresentar laudo de junta médica da pessoa beneficiária.
Segundo mães, a pensão é fundamental para garantir o tratamento e terapias das crianças, que sofrem com vários tipos de deficiências geradas pela síndrome, a mais conhecida delas, a microcefalia.
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