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Porto Alegre mantém 15 servidores em secretaria extinta há 2 anos, diz ONG

O prefeito de Porto Alegre, José Fortunati (PDT) - Sergio Lima/Folhapress
O prefeito de Porto Alegre, José Fortunati (PDT) Imagem: Sergio Lima/Folhapress

Flávio Ilha

Colaboração para o UOL, em Porto Alegre

29/09/2016 17h19

A Prefeitura de Porto Alegre mantém 15 servidores em cargos de comissão, com salários que variam de R$ 838,10 a R$ 7.747,40, atuando na Secretaria Extraordinária para a Copa do Mundo (Secopa), extinta por decreto em setembro de 2014. As informações constam de dossiê do Observatório Social de Porto Alegre, que fez uma varredura nos cargos em comissão (CC) mantidos pelo Executivo municipal.

Segundo o relatório, publicado na última quarta-feira (28), a prefeitura mantém 699 CCs na administração direta e mais 298 em autarquias e empresas públicas.

A Secopa foi criada em 2008 para coordenar a preparação de Porto Alegre para a Copa do Mundo, que recebeu cinco jogos do Mundial. No dia 26 de setembro de 2014, dois meses depois de terminado o evento, o órgão foi extinto, juntamente com todos os cargos em comissão e funções gratificadas.

A Secretaria de Administração do município, entretanto, continuou considerando a presença dos servidores. Segundo relatório de agosto, a Secopa aparece com uma estrutura de 15 CCs e mais quatro cargos com funções gratificadas --quando um servidor recebe um adicional para exercer cargos de coordenação ou chefia.

Os CCs, de acordo com o relatório da secretaria, variam do nível 4 até o nível 8, que é o mais alto na escala administrativa do município. A prefeitura negou a existência dos cargos e atribuiu a informação a um “erro operacional”. Na manhã desta quinta-feira (29), a planilha em que constava a estrutura funcional da Secopa foi alterada e excluiu os dados. A prefeitura acusa a ONG de tentar interferir no resultado eleitoral ao divulgar o relatório na semana do pleito.

O presidente do Observatório Social, Diogo Chamun, rebateu as insinuações de interesse político nas informações. “Somos uma entidade voluntária e apartidária, que não escolhe data para divulgar seus relatórios. Usamos apenas informações oficiais que constam dos portais públicos, sem fazer interpretações”, disse.

Segundo ele, a existência de “informações discrepantes” coloca em dúvida a credibilidade do acesso público aos dados da prefeitura. “É espantoso dizer que uma informação desse tipo pode estar errada num documento oficial. Não é uma boa prática e mostra o descaso da administração pública com a prestação de contas à comunidade, além do completo descontrole sobre seus cargos”, afirmou. 

A ONG também apontou outras distorções na administração municipal em relação a cargos comissionados. O maior volume de CCs, de acordo com o relatório, está na Secretaria de Governança Local, que reúne 155 servidores nessa situação --dois a mais que todo o quadro de funcionários lotado no órgão. A secretaria foi criada no final de 2004, a pedido do então recém-eleito José Fogaça (PMDB).

O gabinete do prefeito concentra 119 CCs, enquanto na Secretaria de Acessibilidade e Inclusão Social há três servidores em cargo comissionado para cada funcionário de carreira. São, no total, 19 CCs para seis funcionários. Na Secretaria da Juventude, o caso mais inusitado: há 15 cargos comissionados na pasta e nenhum servidor efetivo vinculado à secretaria.

O relatório também apontou que há uma grande distribuição de funções gratificadas (FG) nos diversos órgãos da administração direta. No total são 2.040 FGs distribuídas entre 25 secretarias, com destaque para Saúde (403) e Educação (343). Os benefícios variam de R$ 214,20 a R$ 930,30 mensais. A administração direta tem 13.422 funcionários em atividade.

No caso da Secretaria Municipal de Planejamento Estratégico e Orçamento, há mais FGs do que o número de funcionários efetivos que poderiam receber o benefício. De acordo com o levantamento do Observatório Social de Porto Alegre, há 36 funcionários efetivos no órgão para 64 funções gratificadas.

Segundo Chamun, as situações levantadas a partir dos relatórios oficiais não podem ser chamadas de excepcionais. “Em tese, por exemplo, nenhum órgão público deveria ter mais funções gratificadas do que o número de funcionários. Mas prefiro não comentar os dados, quem tem de fazer isso é a administração municipal”, disse.

O UOL apurou que pelo menos nove dos 15 CCs que faziam parte da estrutura funcional da extinta Secopa continuam vinculados à folha de pagamentos da prefeitura na administração direta. Cinco desses nove funcionários ocupam cargos comissionados em órgãos públicos.

Outro lado

A prefeitura explicou que os cargos foram extintos por decreto e que, portanto, não podem ser ocupados, sob pena de o atual prefeito, José Fortunati (PDT), estar cometendo um crime de responsabilidade. A assessoria de imprensa afirmou que a informação válida é a que consta no Portal da Transparência, onde a Secopa não existe.

O atual secretário municipal da Juventude, Airton Bermasque, reconheceu que não há funcionários de carreira lotados na sua secretaria, mas que trabalha com cinco servidores cedidos de outros órgãos. Bermasque foi assessor de gabinete do então secretário da Secopa, João Bosco Vaz.

“Quando chegamos aqui [em março de 2015], havia só dois servidores. Pedimos apoio ao prefeito [José Fortunati] e obtivemos outras três cedências. Agora funciona tudo direitinho, cada servidor de carreira ocupa a chefia de um departamento”, disse o secretário, que assumiu o posto há dois meses --até então, era chefe de gabinete do antigo titular da pasta. Outros dois CCs do órgão também são oriundos da extinta Secopa.

A Secretaria Municipal de Planejamento Estratégico e Orçamento, por meio de sua assessoria de imprensa, justificou que o número elevado de FGs no órgão tem relação com o volume de funcionários cedidos de outros departamentos para o funcionamento da pasta.