Justiça condena Prefeitura de Santa Maria a indenizar família de vítima da Kiss
Uma semana antes do incêndio que causou a morte de 242 pessoas na boate Kiss na madrugada de 27 de janeiro de 2013 completar quatro anos, a prefeitura de Santa Maria (RS) foi condenada pelo TJ-RS (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul) a pagar uma indenização de R$ 200 mil aos pais e ao irmão de Ariel Nunes Andreatta, morto na tragédia aos 19 anos.
A indenização foi decidida por unanimidade pela 10ª Câmara Cível do tribunal, que confirmou a sentença de primeiro grau da juíza Simone Brum Pias, da comarca de Augusto Pestana. É a primeira vez que uma indenização é concedida em segunda instância a familiares das vítimas do acidente, mas ainda cabe recurso.
Os pais de Ariel, Darci e Elizete Terezinha, não quiseram comentar a decisão.
Como o casal mora no município de Joia, a ação foi distribuída para a comarca mais próxima da cidade.
A magistrada entendeu que a prefeitura foi omissa em relação ao licenciamento da boate e determinou uma indenização por danos morais de cem salários mínimos (R$ 78,8 mil na época da sentença) para cada um dos pais e R$ 7.535 por danos materiais, que foi o valor pago pelos familiares pelo funeral de Ariel.
O irmão da vítima receberá uma indenização de 50 salários mínimos (R$ 39.400 na data da sentença). Os valores deverão ser acrescidos de correção monetária. A ação original incluída ainda indenização aos avós de Ariel, mas a juíza não acatou a demanda.
A magistrada também havia determinado uma pensão mensal aos pais, de dois terços do salário mínimo, a partir de agosto de 2015, até que a vítima completasse 25 anos, em 8 de julho de 2019, e de um terço até data em que completasse 65 anos.
A sentença do TJ não acolheu o pedido.
A prefeitura anunciou que irá recorrer da decisão, mas especialistas ouvidos pela reportagem do UOL disseram que o STJ (Superior Tribunal de Justiça) não deverá acatar a apelação devido à decisão unânime do TJ-RS.
O relator do recurso na 10ª Câmara, desembargador Jorge Alberto Schreiner Pestana, declarou no seu voto que a responsabilidade do município ficou caracterizada tanto pela omissão relativa ao funcionamento irregular da boate quanto pela “atuação deficiente” ao conceder alvará sem exigência dos requisitos mínimos de segurança.
“Mesmo que tivesse sido regular a concessão (o que não foi, repiso), ciente das irregularidades com o projeto arquitetônico, cabia ao poder público municipal a cassação do funcionamento. Isso era de sua competência”, proferiu o magistrado.
Em sua defesa, o município havia alegado que o alvará de localização tinha sido expedido de acordo com a legislação vigente e que não era necessário “olhar a edificação para fins de concessão”.
Também atribuía a culpa do acidente aos proprietários da boate e ao governo do Estado, já que a responsabilidade sobre a fiscalização das condições de segurança do local era do Corpo de Bombeiros.
O presidente da Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria, Sérgio da Silva, comemorou a decisão e disse que a sentença abre precedente importante para outros parentes que estão acionando a prefeitura na Justiça.
“Embora não tenha repercussão criminal, é uma decisão fundamental para amenizar a dor de pais e irmãos com a ausência de seus entes queridos”, disse Silva.
Um dos advogados da associação, Luis Fernando Smaniotto, previu que decisões semelhantes vão começar a proliferar pelos tribunais de primeiro grau no Rio Grande do Sul.
“Vai começar a pipocar. Só no Fórum de Santa Maria, temos informação de que há 200 ações tramitando, tanto de parentes de vítimas quanto de sobreviventes”, informou o advogado.
Pelo Código de Processo Civil, ações de indenização envolvendo agentes públicos prescrevem em cinco anos.
Smaniotto disse também que a sentença poderá ser relacionada às ações criminais que tramitam na Justiça, já que a prefeitura não considerou necessária uma sindicância, na época do acidente, para apurar responsabilidades no âmbito do poder público.
“Além de estar marcada para sempre pelo cianeto criminoso que matou 242 inocentes, a população de Santa Maria ainda terá de arcar financeiramente com a irresponsabilidade da prefeitura? Isso é inaceitável, é preciso haver responsabilidade criminal”, afirmou.
O incêndio na boate foi provocado por um sinalizador disparado por um dos músicos da banda Gurizada Fandangueira, que fazia show no local na madrugada de 27 de janeiro de 2013.
Morreram na tragédia 242 pessoas e outras 600 ficaram feridas --algumas com sequelas até hoje.
Respondem a processo criminal os antigos donos da boate, Elissandro Spohr e Mauro Hoffmann, além de dois integrantes da banda, Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Bonilha Leão.
Os quatro deverão irão a júri popular, ainda sem data para ocorrer.
Indenização a sobrevivente
Na semana passada, o TJ-RS determinou o pagamento de uma indenização de R$ 20 mil a uma sobrevivente da tragédia. Na primeira instância, a juíza Eloisa Helena de Hernandez havia negado o pedido de indenização, motivada por danos morais e sessões de fisioterapia.
A decisão de segundo grau considerou tanto a prefeitura quanto o governo do Estado como corresponsáveis pelos danos da vítima, que não teve o nome divulgado. Prefeitura e governo gaúcho já anunciaram que irão recorrer da sentença.
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