Animação sobre desafios do cabelo crespo arrecada US$ 210 mil, o triplo da meta

Stephen nunca havia arrumado o cabelo de sua filha, Zuri. Até o dia em que a mãe não estava disponível e ele se viu diante deste desafio inédito, de lidar com um cabelo crespo cheio de personalidade --aqui no sentido literal. Esta é a temática de uma animação de cinco minutos, chamada “Hair Love”, do produtor de vídeo e ex-jogador de futebol americano Matthew Cherry, 35. “Ainda não tenho filhos, mas tenho muitos amigos que são pais e me ponho no lugar deles”, afirmou em entrevista ao UOL.

Para colocar o projeto em prática, Cherry criou nos Estados Unidos uma campanha de financiamento coletivo com meta inicial de US$ 75 mil (cerca de R$ 234 mil). A poucos dias de ser encerrado (até 10 de agosto), o projeto arrecadou US$ 210 mil (cerca de R$ 656 mil). Para ele, o bom desempenho mostra que o público realmente quer ver esse tipo de história --as plataformas de arrecadação também servem para mensurar a aceitação de uma ideia.

O projeto promove o amor ao cabelo natural, para que meninas e meninos negros se orgulhem dele. Grandes animações não abordam dinâmicas de famílias negras, não existe esta representatividade. Espero que possamos mudar isso

Matthew Cherry, produtor de vídeo e criador do Hair Love

Além de pai e filha, a história tem como personagens o gato da família, uma vlogueira negra que incentiva a aceitação dos fios naturais e o cabelo de Zuri, que tem personalidade própria. “Quisemos transformá-lo em personagem porque, entre os negros, é muito comum nos julgarem pelos cabelos: os EUA hoje caminham rumo à aprovação de leis que proíbem dreadlocks no ambiente de trabalho. A ideia é transformar o cabelo de Zuri em sua força, seu poder.” Ele diz que não pode dar mais detalhes sobre o roteiro, mas garante que esse personagem inusitado será divertido e tornará a tarefa de Stephen ainda mais desafiadora.

Não há previsão para data de lançamento, mas a estratégia é exibir o curta nos cinemas, antes da animação de um grande estúdio. Com arrecadação que vai além da meta inicial, Cherry diz que poderá contratar mais artistas experientes, aumentando a qualidade e diminuindo o tempo de conclusão do projeto. Desde 2007, quando se aposentou como atleta, ele participou da criação de propagandas, clipes e webséries --até então, nada voltado ao público infantil. Em “Hair Love”, apostou pela primeira vez na animação por considerar esta a forma “mais universal” de contar uma história.

Cherry é responsável pelo roteiro e direção do curta, que tem ilustrações de Vashti Harrison e animação em 3D de Jason Marino. O ex-atleta diz que esta ideia já o acompanha há anos, mas só decidiu colocar o projeto em prática ao se deparar na internet com vídeos --alguns virais-- de pais arrumando os cabelos crespos de suas filhas. “Cada vídeo [de terceiro] que eu postava no Twitter recebia cerca de 10 mil curtidas. Essa confirmação de que as pessoas estavam interessadas nesse tipo de conteúdo foi essencial para eu ir adiante e criar a versão animada dessa situação.”

A segurança para executar o projeto também veio, em parte, de sua antiga carreira. Segundo ele, o fato de ter chegado à NFL (liga nacional de futebol americano, na sigla em inglês) lhe deu um nível alto de confiança que ele leva para outras áreas de sua vida. “Além disso, jogar futebol americano e fazer filmes são atividades realizadas em equipe. Cada posição é valiosa, nenhuma é melhor do que a outra. Comparo dirigir um filme com orientar um time de futebol americano: é meu trabalho colocar todas as peças do quebra-cabeças juntas.”