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Doente, Rafael Braga deixa cadeia em Bangu para cumprir prisão domiciliar no Rio

O catador de materiais recicláveis Rafael Braga - DDH/Divulgação
O catador de materiais recicláveis Rafael Braga Imagem: DDH/Divulgação

Janaina Garcia

Do UOL, em São Paulo

15/09/2017 17h18

O catador de materiais recicláveis Rafael Braga Vieira, 28, deixou na tarde desta sexta-feira (15) a penitenciária Alfredo Trajan (Bangu 2) para cumprir prisão domiciliar. O benefício foi concedido na última quarta-feira (13) pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça) porque o rapaz, segundo a defesa, precisa de atendimento médico contra tuberculose contraída no sistema prisional fluminense. A decisão é em caráter provisório e terá o mérito julgado pela 6ª turma do STJ.

Braga foi condenado, em janeiro de 2016, a 11 anos e três meses de prisão por ter sido encontrado com 0,6 g de maconha e 9,3 g de cocaína no Complexo de Favelas da Penha, zona norte do Rio.

Nas manifestações de junho de 2013, Rafael --então morador de rua-- foi acusado de portar artefato explosivo por carregar uma garrafa de desinfetante. Ele foi condenado a cinco anos de prisão, mas a defesa do jovem conseguiu o direito de prisão domiciliar com tornozeleira eletrônica. Em janeiro de 2016, porém, Braga voltou a ser detido sob acusação de tráfico de drogas e associação para o tráfico.

A decisão do STJ foi assinada pelo ministro Rogerio Schietti Cruz, que acolheu o pedido da defesa de Braga --a qual alegou que ele contraiu tuberculose na prisão. No despacho, o ministro destacou que a própria direção da Penitenciária Alfredo Trajan (Bangu 2) ao Juízo da Vara de Execuções Penais do Estado do Rio “atesta que o reeducando foi encaminhado ao atendimento médico no dia 17/8/2017, quando permaneceu internado por breve período, dado que obteve alta em 21/8/2017”.

“A carência de condições adequadas e suficientes ao tratamento dos detentos torna-se ainda mais evidente quando contraposta à conjuntura necessária ao tratamento de Rafael Braga Vieira. A superlotação da Penitenciária de Alfredo Tranjan, bem como as péssimas condições de higiene verificadas na unidade e o irrisório contingente de profissionais técnicos e medicamentos constituem terreno fértil à proliferação e ao alastramento da tuberculose pulmonar, doença que se transmite por via aérea, mormente para alguém com a doença em estado ativo”, escreveu o ministro na decisão.

“Em conformidade com os Princípios e Boas Práticas para a Proteção das Pessoas Privadas de Liberdade nas Américas, documento aprovado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos em 13/3/2008, a ocupação do estabelecimento acima do número estabelecido de vagas será proibida por lei. Quando desse fato decorra a violação de direitos humanos, deverá ela ser considerada pena ou tratamento cruel, desumano ou degradante. A lei deverá estabelecer os mecanismos para remediar de maneira imediata qualquer situação de alojamento acima do número de vagas estabelecido. Os juízes competentes deverão adotar medidas corretivas adequadas na ausência de regulamentação legal efetiva”, escreveu, para definir que, “enquanto perdurar o agravado estado de saúde do paciente, é imperioso o seu afastamento da unidade prisional em que cumpre pena”.

Ato em 24 de abril de 2017 com vigília e caminhada na avenida Paulista, em São Paulo, em direção ao prédio da Presidência da República, contra a condenação de Rafael Braga - Alice Vergueiro/Estadão Conteúdo - Alice Vergueiro/Estadão Conteúdo
Ato em 24 de abril de 2017 com vigília e caminhada na avenida Paulista, em São Paulo, em direção ao prédio da Presidência da República, contra a condenação de Rafael Braga
Imagem: Alice Vergueiro/Estadão Conteúdo

A decisão, em caráter liminar, observa que Braga deve permanecer recolhido em sua residência “só podendo dela ausentar-se para compromissos relativos ao tratamento de saúde que vier a submeter-se, ou com autorização judicial”, de modo que “o descumprimento da prisão domiciliar importará no restabelecimento da custódia preventiva”.

Campanha pediu liberdade a Braga

Neste ano, ganhou força uma campanha para que ele tenha o direito de responder em liberdade, enquanto recorre da condenação. Para militantes dos direitos humanos, o caso de Rafael Braga é um símbolo do desequilíbrio no tratamento de negros e pobres perante a Justiça.

A prisão de Braga voltou à tona recentemente após Breno Borges, filho da presidente do Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso do Sul (TRE-MS), desembargadora Tânia Freitas, preso com 130 kg de drogas e munições, ter sido autorizado a trocar a prisão pelo tratamento da síndrome de borderline numa clínica.

Em julho passado, na Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio, no centro da capital fluminense, o desembargador e presidente da seção, Luiz Zveiter, pediu vista do processo. Outros dois desembargadores negaram o habeas corpus para que Braga respondesse em liberdade à condenação por tráfico de drogas.

Para um dos advogados que atuam voluntariamente na causa de Braga, Lucas Sada, a cessão da prisão domiciliar, por parte do STJ, “é louvável” e “representa uma vitória tripla da democracia”.

“É tripla porque, em primeiro lugar, garante condições mínimas de igualdade de justiça em um país tão profundamente desigual --e no qual nem sempre a lei é respeitada a todos. É também uma vitória da advocacia popular e uma vitória da militância em direitos humanos à medida que esses são trabalhos vocacionados que não se pautam pelos interesses econômicos, e sim, em prol das pessoas mais vulneráveis”, classificou.