Tribunal confirma decisão de juiz da Lava Jato e Cabral vai para presídio federal fora do Rio
O Tribunal Regional da 2ª Região (Rio e Espírito Santo) negou nesta terça-feira (24) o pedido de manutenção do ex-governador Sérgio Cabral (PMDB) em um presídio do Rio de Janeiro. A decisão liminar foi proferida pelo desembargador federal Abel Gomes, da 1ª Turma Especializada do Tribunal. O habeas corpus foi impetrado pela defesa de Cabral, após o juiz federal Marcelo Bretas, da 1ª instância da Lava Jato no Rio, ter atendido a um pedido de transferência para presídio federal feito ontem pelo MPF (Ministério Público Federal).
A reportagem do UOL apurou que o presídio do Mato Grosso do Sul foi escolhido porque tem uma ala separada da que reúne chefes do crime organizado. A unidade é uma das quatro penitenciárias federais do país. A decisão foi tomada pelo diretor-geral do Depen, Jefferson de Almeida. O órgão informou ter recebido a solicitação de transferência de Cabral às 19h40 de hoje. A definição da penitenciária será encaminhada ao juiz corregedor para que ele decida sobre a procedência do pedido.
A defesa de Sérgio Cabral disse que deve ir ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) se o julgamento do mérito do habeas corpus for desfavorável a Cabral no Tribunal Regional da 2ª Região.
Na decisão, o desembargador Abel Gomes escreveu que houve constrangimento ao juiz Bretas. O magistrado avaliou que não há "inequívoca ilegalidade na decisão proferida" pelo juiz federal.
“O que se verifica é que o paciente, acusado e preso preventivamente por integrar e comandar organização criminosa atuante em ‘criminalidade de gabinete’, em grande parte se valendo do poder político enquanto governador deste Estado, não só vem no decorrer do tempo protagonizando episódios que indiciam com suficiência a sua livre atuação mesmo dentro do cárcere na obtenção de informação sobre as autoridades que o processam e sabe-se mais o que, como ainda parece de fato se sentir em condições de constranger o juiz na audiência por mais de uma vez, não parecendo, pela forma clara como falou ao juiz, que tenha conseguido os dados a respeito da família do magistrado de uma entrevista de jornal.”
“Assim, o que se observa da audiência, é que de fato o paciente não só referiu dados da vida pessoal do Magistrado, como expressamente e em bom som, disse que foram 'informações que lhe chegaram', sendo claramente notável da postura e tom adotados na audiência que vi e revi na mídia requisitada ao Juiz Federal impetrado, o cunho de constranger a autoridade Judiciária Federal.”
Abel Gomes criticou a postura do ex-governador durante o interrogatório de ontem.
“Mas não foi só isso o que se viu. O paciente claramente enfrentou o juiz intimoratamente por diversas vezes, num primeiro momento insinuando que todo o processo e o ato realizado seriam um grande 'teatro', culminando por dizer, claramente, que a atuação do Magistrado se dava pelo sentimento pessoal de se autoprojetar publicamente, como a prevaricar no exercício de sua função, isso perante diversas pessoas presentes ao ato judicial.”
Cabral citou negócios da família de Bretas
Na audiência da ação penal referente a acusação de lavagem de dinheiro por meio de compra de joias, Cabral afirmou que a família do juiz Bretas teria entrosamento com joias porque "vendia bijuterias". O magistrado repreendeu a defesa de Cabral, dizendo que se sentia ameaçado pela afirmação.
Perfil sobre Bretas publicado pelo jornal "Folha de S.Paulo" em fevereiro traz a informação de que os pais do juiz criaram os filhos na igreja evangélica e "trabalhando em uma loja de bijuterias no Saara, mercado popular do centro do Rio".
À reportagem, Rodrigo Roca, advogado do ex-governador disse hoje que Cabral não tem acesso aos jornais dentro do presídio. “Não, ele não tem acesso. Mas o problema não é este, uma vez que, estando nos jornais, qualquer pessoa alfabetizada teria acesso à informação e pode passar para ele: familiares, pessoas que estão acompanhando”, declarou. “Mas, se você quer saber, não, ele não tem acesso aos jornais”, prosseguiu.
Em entrevista ao UOL na noite desta quinta, o procurador Sergio Pinel esclareceu que Cabral forneceu informações que vão além do que está registrado pelo jornal.
“Ao tratar da questão da lavagem de dinheiro por intermédio de joias, Cabral afirmou que a família do magistrado seria proprietária de uma das maiores lojas de bijuterias do Estado. Certa ou errada, se a família tem a maior loja ou não, é uma informação que o próprio réu levou à audiência, e uma informação que não tinha sido publicada”, declarou.
“Mais do que o tom intimidatório, o que levou o Ministério Público a solicitar a transferência foi o fato de ele afirmar que lhe estavam chegando informações na cadeia, e que esse tipo de informação não é levada por advogados”, completou.
Logo após o interrogatório, o procurador evitou categorizar as falas de Cabral como ameaças. "O que ficou claro é que ele vinha recebendo informações de fora do presídio", reforçou. "Absolutamente normal ele receber informações dos processos a que responde. O que não é normal é ele saber da vida dos familiares do magistrado", completou Dias.
Foi a primeira vez que o ex-governador se encontrou com Bretas após suas duas primeiras condenações da Lava Jato no Rio. Em agosto, o juiz federal negou pedido dos advogados de Cabral para conceder entrevista a dois veículos de comunicação --a defesa do ex-governador alega que ele queria apresentar sua versão dos fatos.
Durante o interrogatório, Cabral discutiu com Bretas, fazendo críticas aos processos do qual é réu. Para Cabral, que também teceu críticas ao magistrado ao longo do depoimento, o juiz Bretas faz uma "projeção pessoal para o meu calvário".
"Vossa Excelência já me condenou em duas ocasiões, uma em 45 anos e outra em 13 anos. Percebe-se, a partir dessas condenações, que vossa excelência não acredita em mim", declarou Cabral. "Comprei joias para minha mulher em datas comemorativas", argumentou.
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