Coronavírus impede realização de último desejo de palhaço vítima da covid
A pandemia do novo coronavírus impediu amigos e familiares de atender ao desejo do palhaço Doutor Batata de ser enterrado como palhaço. Leandro Maduro Costa, 44, morto em decorrência da doença no mês de maio, pediu que fosse vestido com as suas roupas e que os amigos palhaços fossem caracterizados à despedida. No entanto, o desejo não pôde ser atendido devido às restrições nos cemitérios que impedem aglomeração.
Doutor Batata, como era conhecido, divertia crianças internadas em hospitais da zona oeste do Rio. No Hospital Albert Schweitzer, em Realengo, ele trabalhava como capelão e era companhia certa de pacientes que podiam contar sempre com a sua alegria. De acordo com amigos, o palhaço tinha presença assídua na unidade. A sua preocupação era não deixar ninguém se sentindo sozinho.
No entanto, os últimos dias de vida do palhaço não foram generosos com ele. Batata deu entrada no hospital, em 9 de maio, com sintomas da doença e morreu no dia seguinte.
Sozinho na maca do hospital, ele morreu sem direito a despedidas. Amiga de Batata, Hellen Condal, conhecida como palhaça Pipinha, 31, diz que apenas um amigo foi ao sepultamento vestido de palhaço representando os demais, devido às restrições impostas pelo governo para evitar a propagação do coronavírus.
Parece que ele estava pressentindo. Comentou que no dia que morresse, gostaria de ser enterrado como palhaço e que os amigos fossem [ao velório] também vestidos de palhaço. Não foi possível e isso ainda nos deixa muito triste. Apenas um amigo palhaço foi representando todos nós. Ele morreu sozinho no local onde ele nunca deixava as pessoas se sentirem sozinhas. Foi muito triste
Hellen Condal, amiga do Dr. Batata
Em entrevista ao jornal inglês The Guardian, a viúva de Batata, Monique Santos, lembrou que provocar sorrisos era a vocação do marido. "Ele nasceu com algo especial. Trazer um sorriso para a vida das pessoas acalmava sua mente", explicou.
Ao jornal, Monique explicou que o marido tinha um carinho especial por uma paciente que tinha doença degenerativa. "Ele sempre falava dela. Eles se tornaram amigos", disse a viúva, que também virou palhaça e era a Rouxinol. Procurada pelo UOL, Monique não atendeu as ligações até a publicação desta matéria.
Apesar de o desejo do Doutor Batata não ter sido atendido, por conta dos riscos da covid-19, dezenas de amigos fizeram homenagens ao querido palhaço. Vários vídeos e cartazes foram postados nas redes sociais com mensagens de carinho. Um memorial foi feito em frente à sede do projeto de Leandro, Companhia do Amor, em Realengo, como homenagem.
Segundo Hellen, o amigo palhaço trabalhava também em igrejas e nas ruas levando amor, alegria e solidariedade para as pessoas.
"No início do ano teve uma enchente muito forte aqui em Realengo, muita gente ficou desabrigada, tiveram casas que ficaram com água até o telhado e o Leandro ajudou muitas famílias. Na época, ele estava até desempregado, e mesmo assim arrecadava alimentos e roupas para essas pessoas. O projeto dele ficou como ponto de arrecadação de alimentos e água para serem distribuídos", recorda.
Leandro foi definido como uma pessoa que nasceu para a profissão que abraçou e queria ver atendido no desejo final. "O palhaço para o Leandro era a vida dele, ele respirava o palhaço, era mais conhecido como Batata do que como Leandro. Ele fazia tudo como palhaço. Era uma coisa só, ele era muito natural. É difícil encontrar palhaços que não interpretam, mas ele nasceu para isso. O natural dele era ser palhaço, até o jeito de andar", conta Hellen que também é palhaça há dez anos.
Hellen definiu ainda o amigo como uma pessoa amorosa, atenciosa e engraçada. "Ele tirava dele mesmo para os outros".
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