Topo

Esse conteúdo é antigo

Djamila Ribeiro fala sobre ameaças à filha de 15 anos: 'Gota d'água'

"É a primeira vez que vou à delegacia para tomar uma atitude em relação a isso", diz a escritora - Reprodução/GloboNews
"É a primeira vez que vou à delegacia para tomar uma atitude em relação a isso", diz a escritora Imagem: Reprodução/GloboNews

Do UOL, em São Paulo

28/07/2020 18h51Atualizada em 28/07/2020 19h37

A escritora e filósofa Djamila Ribeiro falou hoje sobre as ameaças que ela e sua filha de 15 anos receberam após um vídeo que distorcia uma publicação sua viralizar. Em entrevista ao "Jornal das 16h", da GloboNews, Djamila disse estar acostumada com os ataques, mas a situação "passou dos limites" quando começou a atingir sua filha. (Veja na publicação abaixo)

"Comecei a receber uma série de mensagens nas minhas redes sociais. Como eu sou ativista, eu recebo muita coisa, já estou acostumada. Mas aí passaram de todos os limites. No domingo, mandaram [ameaças] para o meu celular e para o celular da minha filha, aí eu achei a gota d'água. É a primeira vez que vou à delegacia para tomar uma atitude em relação a isso", disse a escritora.

Ontem, ela registrou um boletim de ocorrência na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi) do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) de São Paulo. No Instagram, ela compartilhou um print das ameaças recebidas por sua filha e uma foto do B.O.

Já faz tempo falo sobre como o Twitter é uma rede tóxica para mulheres negras. Segundo pesquisa da Anistia Internacional, mulheres negras estão 84% mais propensas a receberem tweets problemáticos do que mulheres brancas. Segundo a tese de doutorado do PHD em Sociologia Luiz Valério Trindade, as mulheres pretas são as maiores vítimas de discurso de ódio nas redes sociais em geral e no Twitter, em particular. Ele explica que isso se dá pelo incômodo que a ascensão e protagonismo delas causa em uma sociedade racista e machista. Eu recebo muitas mensagens odiosas, as quais nunca me abalaram. Porém, ontem enviaram mensagens odiosas para a minha filha. Isso se deu por conta de fake news produzidas no Twitter desde a semana passada. Mais uma vez, essa rede social lucrando com o ódio, como afirma Adilson Moreira, trata-se da exploração econômica do racismo e misoginia. Eu fiz um B.O (foto 2), pois é inadmissível que esse tipo de perseguição aconteça, agora direcionada a uma adolescente. Críticas são no campo das ideias, quando fazem afirmações caluniosas de que tal pessoa é contra uma categoria, trata-se de ataque irresponsável que pode colocar essa pessoa em risco. Friso que respeito todas as identidades, mas ser negra é para além da cor da pele. É preciso tornar-se negro no sentido político ou como diz a professora afro francesa Maboula Soumahoro, "precisamos diferenciar negros que decidiram ser negros". Isto significa dizer que ser negra politicamente é jamais aceitar o jogo da branquitude colonial para atacar desonestamente uma mulher preta que faz um trabalho sério; é saber que há um histórico de linchamento contra pessoas negras; é não se deixar usar pelos verdadeiros ricos que nos querem tuteladas ou subalternas. Precisamos fazer essa diferenciação. Por mais execráveis essas pessoas sejam, friso que, como disse na live, nunca ameacei processar ninguém, o que se trata de mais uma fake news. Meu foco é representar o Twitter no MP, uma empresa bilionária, que lucra com ataques sem defesa a mulheres negras. Farei parte da Campanha Internacional "Stop hate for profit" e denunciarei de forma global. Gratidão pelo carinho que recebi. Ogun Pá wá

Uma publicação compartilhada por Djamila Ribeiro (@djamilaribeiro1) em

Segundo Djamila, tudo começou quando ela fez um post publicitário no Instagram para a 99 (aplicativo de transporte individual) falando sobre a desinfecção de táxis durante a pandemia. Depois disso, uma pessoa — que a filósofa diz não conhecer — fez um vídeo dizendo que Djamila era contra a greve dos motoboys e a classe trabalhadora, além de "inimiga das empregadas domésticas".

"De repente, quando eu vi, tinha milhares de pessoas compartilhando esse vídeo. As pessoas começaram a ir na minha página do Instagram me xingar, e isso foi se tornando uma bola de neve", contou. "Quem quiser criticar [a postagem] tem todo direito. Mas não pode dizer que eu sou contra os motoboys e inimiga das empregadas domésticas sendo eu filha, neta e bisneta de empregada doméstica."

Questionada por que não costuma denunciar os ataques que recebe, a escritora disse não querer dar visibilidade aos responsáveis pelos discursos de ódio, uma vez que "é isso que eles querem". "Prefiro me posicionar, desmentir, do que ficar gastando energia com pessoas que, muitas vezes, só querem surfar na nossa onda", argumentou.

Críticas ao Twitter

Djamila também fez críticas ao Twitter, que, segundo ela, precisa se posicionar e melhorar suas políticas nesta questão. A escritora, que se disse vítima das fake news "há muito tempo", acredita que as redes sociais precisam ser responsabilizadas porque acabam ganhando dinheiro com a viralização de mentiras.

"Quanto mais polêmica, mais anúncios, mais eles ganham dinheiro. A plataforma precisa se responsabilizar por explorar economicamente o racismo e a misoginia. Não é meu interesse ir para cima de indivíduos. O Twitter permite que essas pessoas construam essas narrativas, não há nenhum tipo de moderação e eles [seguem] lucrando em cima dessas histórias que ficam nos 'trending topics' [assuntos mais comentados do momento]."