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Com medo de morrer, filho de Flordelis que a incriminou usa carro blindado

11.set.2020 - Wagner de Andrade Pimenta, o Pastor Misael, e Luana Rangel Pimenta, sua esposa, exibem camisa com foto do pastor Anderson do Carmo, morto a tiros em junho de 2019 - Herculano Barreto Filho/UOL
11.set.2020 - Wagner de Andrade Pimenta, o Pastor Misael, e Luana Rangel Pimenta, sua esposa, exibem camisa com foto do pastor Anderson do Carmo, morto a tiros em junho de 2019 Imagem: Herculano Barreto Filho/UOL

Herculano Barreto Filho

Do UOL, no Rio

13/09/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Pastor e esposa revelam ameaças sofridas em conversas pelo WhatsApp após o crime
  • "Querem continuar fugindo? Só se viajarem para fora do Brasil", escreveu Flordelis
  • O vereador é a segunda testemunha a vir a público dizendo ter sido intimidada em meio às investigações
  • "Se fosse ameaça, teriam registrado em delegacia", diz defesa de parlamentar

Com medo de morrer, filho adotivo da deputada federal Flordelis (PSD-RJ) que a incriminou em depoimento passou a usar um carro blindado para se proteger. O vereador Wagner de Andrade Pimenta, também conhecido como pastor Misael, começou a usar o veículo nos seus deslocamentos nos últimos dias.

Misael rompeu relações com a mãe em junho do ano passado, quando deu depoimento à polícia apontando-a como mandante do assassinato do marido, o pastor Anderson do Carmo. A parlamentar só não foi presa porque tem imunidade parlamentar. Na quarta-feira (9), ela recebeu uma notificação em seu apartamento funcional em Brasília sobre processo na Câmara dos Deputados que pode resultar na cassação do seu mandato.

O vereador é a segunda testemunha a vir a público dizendo ter sido intimidada em meio às investigações. Na madrugada de 4 de setembro, uma mulher ouvida pela Polícia Civil denunciou um ataque a bomba jogada na porta da sua casa.

O UOL teve acesso às trocas de mensagens que Flordelis, Misael e Luana Rangel Pimenta, esposa do pastor, trocaram por Whatsapp após o crime. Segundo o casal, os diálogos geraram apreensão agravada nos últimos meses após os depoimentos colhidos pela Polícia Civil. "Tenho medo de sair na rua e ser assassinado por ter prestado depoimento contando o que sei", disse o vereador.

O primeiro momento em que nos sentimos ameaçados foi quando ela [Flordelis] mandou as mensagens falando que iria nos encontrar. E que isso só não aconteceria se saíssemos do país."
Luana Rangel Pimenta, nora de Flordelis

O começo do diálogo ocorreu às 11h20 de 27 de junho de 2019, apenas nove dias após a morte do pastor Anderson. Flordelis usou o celular de Simone dos Santos Rodrigues, filha biológica presa desde 24 de agosto deste ano por suspeita de envolvimento no crime. "Luana. Aqui é a Flordelis. Tem como você me responder?", escreveu.

Mas quem respondeu a mensagem foi Misael, que a informou sobre a sua saída do Ministério Flordelis.

Não vou mais continuar no ministério, sem o pastor não vou conseguir. Quero te agradecer por tudo, tudo mesmo, sou muito grato. Estou orando por você! Vou sair dos grupos. Bjus, Misael"

Flordelis, então, enviou 11 mensagens seguidas num intervalo de 30 minutos, respondidas por Luana ao meio-dia. "Só não temos mais condições psicológicas para continuar. Ele vai conversar com a senhora (...). Não exija agora. Vai doer mais". Foi após essa resposta que surgiram as mensagens vistas como uma ameaça pelo casal.

Querem continuar fugindo? Só se viajarem para fora do Brasil. Caso contrário eu vou encontrar Misael junto com os irmãos dele. Não vamos aceitar e nem esperarmos [sic] mais. Chegaaaaa, vocês já foram longe demais.
Mensagem de Flordelis para Misael e Luana


A deputada federal Flordelis (PSD-RJ) durante sessão na Câmara, em maio de 2019 - Michel Jesus/Câmara dos Deputados - Michel Jesus/Câmara dos Deputados
A deputada federal Flordelis (PSD-RJ) durante sessão na Câmara, em maio de 2019
Imagem: Michel Jesus/Câmara dos Deputados

Houve trocas de mensagens em outros dois momentos. Às 14h54 de 12 de julho, Flordelis voltou a insistir em uma reaproximação. Desta vez, em um tom de apelo: "Luana. Me deixa ver e falar com Misael. Por favor. Não continuem agindo assim. Vamos conversar. Temos muitas coisas a falar. Estou te pedindo: me atenda por favor". Luana informou estar fora do Rio. "Assim que chegarmos, te procuro".

Elas só voltaram a se falar na noite de 11 de setembro de 2019. Desta vez, foi Luana quem a procurou para se explicar. "Não fizemos nada pessoal. Só falamos do que sabíamos. E somente para a polícia."

Em nota, a defesa de Flordelis contestou a versão de Misael e Luana, que dizem terem se sentido ameaçados: "Se houvesse ameaças reais, teriam registrado em delegacia, à época, ou teriam externado isso nas oportunidades em que prestaram depoimentos".

Envenenado, Anderson perdeu 20 quilos

Em depoimento à Polícia Civil, Misael e Luana contaram ter desconfiado de uma trama armada por Flordelis para matar o pastor Anderson meses antes do crime. Após os supostos envenenamentos investigados pela polícia, Anderson chegou a perder 20 quilos, revelaram.

Flordelis e o marido Anderson posaram para fotos em frente a Alerj, no centro do Rio de Janeiro. Três dias depois, Anderson foi morto - Reprodução/Extra - Reprodução/Extra
13.jun.2019 - Flordelis e o marido Anderson posaram para fotos em frente a Alerj, no centro do Rio de Janeiro. Três dias depois, Anderson foi morto
Imagem: Reprodução/Extra

Em abril de 2019, dois meses antes do assassinato, foram orientados por Carlos Ubiraci Francisco da Silva, filho adotivo de Flordelis, a evitar comer os alimentos fornecidos ao pastor Anderson.

Na noite do crime, Marzy Teixeira da Silva estava na casa de Misael e Luana quando trocou mensagens pelo celular com Flordelis, segundo informou o casal à polícia. "A Flor [Flordelis] mandou uma mensagem. A polícia entendeu que era um código. Ela então mandou outra mensagem para o Flávio", disse Luana ao UOL, citando Flávio dos Santos Rodrigues, filho de Flordelis preso por suspeita de ter sido o autor dos tiros que mataram Anderson.

Quando chegamos no hospital, o pastor já estava morto. Dez minutos depois, a Flor chegou. Parece que foi um carimbo. Ela falava: 'Fala que o meu marido tá vivo!'. Falei para o Misael: 'A sua mãe tá mentindo'. Ele concordou. O Misael sabe quando ela chora de verdade. Não era o caso. Ela não consegue chorar com dor pelo marido."
Luana Rangel Pimenta, nora de Flordelis

A deputada Flordelis e o marido Anderson, assassinado em junho de 2019 - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
A deputada Flordelis e o marido Anderson, assassinado em junho de 2019
Imagem: Reprodução/Instagram

Os depoimentos do casal auxiliaram nas investigações conduzidas pela Polícia Civil, que agora apura a possível participação de outras quatro pessoas no homicídio.

Ainda estamos reunindo dados técnicos que estão sendo organizados de forma lógica e cronológica. E, assim que terminarmos essa etapa, vamos ouvir testemunhas para esclarecer o que ocorreu."
Delegado Allan Duarte, da Delegacia de Homicídios de Niterói e São Gonçalo